62% dos jovens querem ir embora. Até por que o Brasil deseja matá-los

Quando 62% dos jovens entre 16 e 24 anos de um país desejam mudar-se para outro lugar, pode-se dizer que o futuro desistiu.

por Leonardo Sakamoto no Blog

Jovem de 17 anos, vítima de chacina, na Zona Leste de São Paulo em 2014. Foto: Avener Prado/Folhapress

Mas o futuro não desiste tão facilmente. Ainda mais por que estamos falando de jovens, o grupo social que alimenta a ideia de que o dia seguinte será melhor. Para chegar a essa situação, portanto, houve um esforço amplo e duradouro desse país.

O futuro desistiu do Brasil por que o Brasil desistiu do seu futuro muito antes.

E não se trata aqui apenas falhar na garantia de emprego decente e educação de qualidade. Mas no respeito à vida e na proteção nos níveis mais básicos da dignidade.

Pesquisa Datafolha, divulgada neste domingo (17), da qual esse número foi extraído, aponta também que quanto mais rica e escolarizada, mais a pessoa iria embora se pudesse.

Para os jovens, principalmente negros e pobres, migrar para fora do Brasil deveria ser uma garantia humanitária, uma vez que o seu próprio país não apenas deseja matá-lo, como efetivamente mata.

De acordo com o Atlas da Violência 2018, divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, sobre dados do Ministério da Saúde, de 2006 a 2016, 324.967 jovens entre 15 e 29 anos morreram de forma violenta.

A taxa de homicídios nesse grupo (65,5 por 100 mil habitantes) é mais que o dobro da média nacional e seis vezes a média global. Considerando apenas jovens homens, ela sobe para 122,6/100 mil.

Nesse período de tempo, o número de homicídios de negros aumentou 23,1% e, do restante da população, caiu 6,8%. Em 2016, a taxa de homicídios de negros foi de 40,2 mortes para cada 100 mil habitantes, enquanto os demais grupos registraram 16 mortes para cada 100 mil.

Muitas dessas mortes ocorrem na forma de pacotes, em chacinas, nas periferias das grandes cidades brasileiras, seja pelas mãos do tráfico, de milícias ou de integrantes da própria polícia. Não raro, elas permanecem sem solução. Não é que a nossa sociedade não consegue apontar e condenar culpados. Ela não faz questão. Pelo contrário, não raro apoiam formas de ”limpeza social” do que chamam de ”pessoal perigoso”, que ameaçam os ”cidadão de bem” pagadores de impostos.

Somos um povo que, para construir um futuro melhor, vai matando seu próprio futuro. O mais triste é que, quando percebermos essa contradição, já será tarde demais.

+ sobre o tema

Show de Ludmilla no Coachella tem anúncio de Beyoncé e beijo em Brunna Gonçalves; veja como foi

Os fãs de Ludmilla já estavam em polvorosa nas redes sociais...

Geledés faz em Santiago evento paralelo para discutir enfrentamento ao racismo nos ODS

Geledés - Instituto da Mulher Negra realiza, de forma...

Ela me largou

Dia de feira. Feita a pesquisa simbólica de preços,...

As mulheres que se rebelam contra venda de meninas para casamentos no México

Inicialmente, Claudia* não havia pedido dinheiro em troca da...

para lembrar

“A guerra às drogas é um mecanismo de manutenção da hierarquia racial”

Em visita ao Brasil, ativista norte-americana formada em Harvard...

Homicídios cometidos por policiais aumentaram 85% às vésperas da Rio 2016

Os homicídios cometidos por policiais militares na cidade do...

Vítima em operação da PM, filho de Tati Quebra Barraco é sepultado no Rio

Organizações de direitos humanos e antirracis Adicionar novotas divulgaram notas...
spot_imgspot_img

Negros são maioria entre presos por tráfico de drogas em rondas policiais, diz Ipea

Nota do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra que negros são mais alvos de prisões por tráfico de drogas em caso flagrantes feitos...

Número de resgatados da escravidão dispara em 2023 e é o maior em 14 anos

O Brasil encontrou 3.190 trabalhadores em condições análogas às de escravo em 2023. O número é o maior desde os 3.765 resgatados em 2009. Foram...

Caso Marielle: mandante da morte de vereadora teria foro privilegiado; entenda

O acordo de delação premiada do ex-policial militar Ronnie Lessa, acusado de ser o autor dos disparos contra a vereadora Marielle Franco (PSOL), não ocorreu do dia...
-+=