63% das mortes de civis durante ação do PCC são arquivadas

Folha de São Paulo – Cotidiano –

Entre 12 e 21 de maio de 2006, 170 pessoas foram mortas em ataques, das quais 89 são vítimas de atentado com “característica de execução”

Levantamento foi realizado pela Folha com base nos documentos da Ouvidoria, órgão com função de fiscalizar as polícias Militar e Civil

ANDRÉ CARAMANTE
LUIS KAWAGUTI

Três anos depois da maior onda de violência da história de São Paulo, quando a facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) atacou em maio de 2006 as forças de segurança, 63% dos assassinatos de civis em que a própria Ouvidoria da Polícia apontava fortes indícios de excessos cometidos por policiais foram arquivados.

Levantamento feito pela Folha com base nos documentos da Ouvidoria, órgão com função de fiscalizar as polícias Militar e Civil, revela que, entre 12 e 21 de maio de 2006, período mais crítico dos ataques do PCC, aconteceram 102 casos em que policiais foram suspeitos de matar 170 pessoas.
Como as investigações não são centralizadas, não é possível saber o motivo do arquivamento de cada caso. Nem se a decisão de encerrar a investigação partiu da Polícia Civil, da Promotoria ou da Justiça.

Do total de 170 mortos, 89 foram vítimas de 54 atentados com “características de execução” (sem chance de defesa para a vítima). Dos 54 casos, 33 já estão arquivados e 16 continuam em andamento.

Em dois deles, dois PMs foram pronunciados, ou seja, deverão ser levados a júri pelas mortes; em outros dois casos, os autores foram identificados e não são policiais. Em um caso, um PM identificado como autor do crime foi morto e o caso acabou sendo arquivado.

As outras 81 pessoas foram mortas por policiais em 48 supostos casos de “resistência à prisão seguida de morte”.

Entre essas 48 ações, 31 foram arquivadas (algumas porque a versão dos envolvidos foi confirmada) e 12 ainda estão sendo investigadas.

“É mais uma história de impunidade, bastante parecida com a que vivemos na ditadura. Naquele período, São Paulo enfrentou números de guerra e, até hoje, não temos respostas para aquelas mortes”, diz Rose Nogueira, do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana).

Direitos Humanos

Hoje, entidades de direitos humanos que acompanham as investigações sobre as mortes de maio de 2006 realizam um ato público no Cremesp (Conselho Regional de Medicina) para cobrar providências do governo em relação à apuração.

Um dos casos classificados como exemplo de impunidade será apresentado pela ONG Conectas: em 14 de maio, cinco jovens foram mortos no Parque Bristol (zona sul). O crime foi investigado como cometido por PMs, já que, segundo testemunhas, as vítimas vinham sendo ameaçadas por policiais. O caso acabou arquivado.

Uma das principais reivindicações será a unificação e a divulgação, pela Secretaria da Segurança, dos resultados das investigações dos 493 assassinatos (incluídos os 170 acompanhados pela Ouvidoria) no Estado durante os ataques naquele período. Nesse total estão casos como brigas de vizinhos.

“O fato de a Secretaria da Segurança Pública não divulgar um relatório único sobre as mortes ocorridas em maio de 2006 demonstra uma decisão política”, disse Antonio Funari Filho, ouvidor da polícia de SP.

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