A América de Obama ainda é de brancos de um lado e negros do outro

Fonte: Publico.pt –

“Uma América pós-racial”, prometeu Barack Obama, recém-eleito Presidente dos Estados Unidos, exactamente há um ano em Chicago.

 

Mas a esmagadora e histórica votação que pela primeira vez levou um afro-americano à Casa Branca parece ter tido pouca ou nenhuma influência na forma como os norte-americanos encaram as relações raciais e a igualdade entre as pessoas de diferentes cores.

“Se alguém ainda duvidava de que a América é o lugar onde tudo é possível, esta é a vossa resposta. É a resposta dada pelos novos e velhos, ricos e pobres, democratas e republicanos, negros, brancos, hispânicos, asiáticos, índios, homossexuais, heterossexuais, portadores de deficiência…”, enumerou Obama, em Grant Park, no fim da noite eleitoral.

A realidade, contudo, tomou conta dessa ilusão e revela-se bem diferente. A esperança da sua vitoriosa coligação eleitoral, progressista, diversa, multirracial e recheada de minorias, esfumou-se e o país continua dividido – por ideologias, por recursos, por religiões e pela cor da pele.

Como revela a última sondagem da Gallup, que desde 1963 tem vindo a perguntar aos americanos se consideram que “as relações entre brancos e negros serão sempre um problema para os EUA ou eventualmente será encontrada uma solução”, só 56 por cento dos inquiridos acreditam que melhores dias virão – apenas um ponto percentual acima das respostas do primeiro inquérito, realizado na sequência da marcha sobre Washington de Martin Luther King. A 5 de Novembro de 2008, um dia depois da eleição de Obama, as respostas optimistas alcançavam 67 por cento, o valor mais elevado de sempre.

“Os números das várias sondagens da Gallup permitem detectar duas tendências no que diz respeito à taxa de aprovação do Presidente Obama: que está em declínio e que é muito diferente entre os americanos brancos e negros”, assinala Melissa Harris-Lacewell, professora de Política no Centro de Estudos Afro-Americanos da Universidade de Princeton.

A investigadora deu-se ao trabalho de ir a um comício com Barack Obama em Newark, no último fim-de-semana, a fim de avaliar a composição da audiência. E constatou que, ao contrário do que verificara durante a corrida presidencial, era muito menos diversa e mais homogénea: “Era, não exclusivamente, mas predominantemente, composta por afro-americanos”, reparou.

Harris-Lacewell não estranha esse crescente intervalo racial – aliás, acredita que é inevitável que esse fosso ainda venha a escavar-se mais. “A história sugere que o apoio da população negra a Obama não reside unicamente na sua identidade como o primeiro Presidente afro-americano, antes tem raízes nessas diferenças raciais da política norte-americana”, acrescenta.

O que esta académica destaca como “mais interessante” na análise das sondagens é o facto de a população negra se manifestar, simultaneamente, optimista no seu apoio a Barack Obama e pessimista sobre a direcção do país. E na sua opinião, esse é um dado que “pode tornar-se problemático”.

Como sustenta, os eleitores negros têm de ser capazes de elogiar mas também de criticar o Presidente de forma a garantir que os seus interesses são tidos em conta na arena política. E a Administração não pode ficar refém do apoio isolado da população negra – o Presidente ficará muito mais vulnerável a ataques de que não representa o largo espectro dos eleitores americanos.

Em menos de um ano, a Administração de Obama já teve que lidar com vários casos que revelam algum “desconforto” racial com as suas palavras e acções, como por exemplo toda a controvérsia que se seguiu ao seu comentário sobre a detenção do professor afro-americano Henry Louis Gates, ou a sua escolha da juíza de ascendência hispânica Sonia Sotomayor para o Supremo Tribunal.

Nos comícios contra a proposta de reforma de saúde em debate no Congresso, durante o Verão, apareceram várias pessoas armadas e com cartazes reminiscentes do Ku Klux Klan, insultando o Presidente. Ao mesmo tempo, engrossavam as fileiras do disparatado movimento dos birthers, que rejeitam a legitimidade da eleição alegando que Obama é queniano.

Até agora, só o antigo Presidente Jimmy Carter se atreveu a considerar que na génese da oposição a Obama está o racismo latente na sociedade americana, que demonstra estar a lidar mal com o facto de ter um Presidente negro.

O Southern Poverty Law Center, que acompanha a actividade de grupos extremistas, detectou “o mais significativo crescimento dos últimos dez a doze anos” na adesão de novos membros, desde que Obama foi eleito. As autoridades já desmantelaram 50 “campos de treino” de operacionais dispostos a actuar militarmente.

“Depois de uma década em que estiveram ausentes do olhar público, as milícias de extrema-direita estão a ressurgir um pouco por todo o país”, nota um relatório da organização. “E a diferença é que agora o governo, que é o seu inimigo primário, é chefiado por um negro”, prossegue.

“A ideologia do ódio [racial] está em efervescência, e este é um caldeirão que, se entornar, pode resultar em terrorismo doméstico”, comentou à AFP Mark Potok, dirigente do Southern Poverty Law Center.

Potok vê nas movimentações de grupos supremacistas brancos uma “reacção desesperada” para tentar evitar a integração racial nos Estados Unidos. “A realidade é que esta gente perdeu nas últimas eleições”, diz Potok. “Não há nada que eles possam fazer para a História andar para trás.”

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