“Pensar o processo de comunicação no Brasil, entender como a informação atua na esfera política, olhar atentamente para os modelos desbravadores que equilibraram esse campo e fortalecer a frente de luta contra uma comunicação imperialista”. Essa foi a receita apresentada por Laurindo Leal Filho, professor da Universidade São Paulo (USP), ao falar sobre os desafios que ainda temos que enfrentar para democratizar os meios de comunicação.
Por Joanne Mota*
Segundo ele, o modelo de trocas de informação no Brasil, que foi edificado nos marcos do capitalismo, tornou-se uma frente estratégica na luta política, na qual os trabalhadores, por exemplo, não possuem vez nem voz. “A chamada velha mídia possui uma orientação muito firme e única, basta apenas zapear pelos meios para perceber que eles possuem os mesmo discursos, mudando apenas algumas alegorias. Todos defensores do sistema capitalista e da ausência de uma real democracia. E nesta investida o principal lesionado é o trabalhador”, externou Lalo, que é jornalista e apresenta o programa semanal Ver TV, na TV Brasil.
Esse ponto de vista também é compartilhado por Dênis de Moraes, escritor e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF). Segundo ele, foi edificado, não só no Brasil, mas em toda a América Latina uma espécie de patronato da mídia mercantil, que tem como clube privê a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP, sigla em Espanhol).
“Trata-se de uma organização maléfica, que tem tido uma participação deletéria no processo político e social latino-americano desde os anos 1940 e que se notabilizou por defender golpes de estado e ditaduras militares e apoiar governos liberais e antissociais. Tudo através de uma comunicação construída para sufocar qualquer voz que se opusesse aos seus objetivos. Do meu ponto de vista, a SIP reúne o que há de pior em termos de jornalismo e forma uma espécie de cadeia de interesses convergentes das corporações midiáticas, o que ataca qualquer movimento de resistência. Um exemplo clássico é a criminalização dos trabalhadores”, esclareceu.
No caso específico do Brasil, o pesquisador pontuou que “diariamente a chamada grande mídia brasileira sente-se estimulada a lutar contra os avanços democratizadores que estão ocorrendo no Brasil e em outros países. E isso ocorre por quê? Porque ela sabe que aqui no Brasil o governo que aqui está há 10 anos nada fez para atualizar, renovar, democratizar a legislação de comunicação que existe no Brasil, principalmente a legislação que diz respeito à radiodifusão pública. O que temos no Brasil são legislações arcaicas anacrônicas e elitistas. E para garantir o avanço da democracia, precisamos de ferramentas que ponham fim ao modelo conservador e preconceituoso alimentado por essa velha mídia.”, denuncia o pesquisador.
Os mais atingidos são os trabalhadores
“Se o povo tivesse descoberto antes a importância da comunicação nós já teríamos vencido muitas lutas, e uma delas é a da Reforma Agraria”, externou a deputada Federal Luiza Erundina (PSB/SP), durante curso promovido pelo Centro de Estados de Mídia Alternativa Barão de Itararé, entre os dias 8 e 12 de maio, em São Paulo. Ela convocou todos os trabalhadores trabalhadoras do Brasil a somar forças pela democratização da comunicação, pelo fim da propriedade cruzada e dos oligopólios de mídia no país.
Para justificar a convocação, a parlamentar lembrou que “as principais vítimas desta concentração são os trabalhadores e trabalhadoras do Brasil e para vencer essa luta é preciso mobilização, organização, politização”. Segundo ela, as ações políticas só terão sucesso com o comprometimento da coletividade.
“A questão da politica de comunicação social é uma questão estratégica para o desenvolvimento nacional. E lembrou o quão simbólico foi a realização a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom). Um momento, segundo Erundina, de amplo e diverso debate, colonizado pela sociedade e que deixou claro a complexidade do que é pensar a mídia no Brasil.
Paulo Henrique Amorim, do Blog Conversa Afiada, concordou com a parlamentar e explicou o por quê dos trabalhadores serem os mais prejudicados com a concentração dos meios de comunicação.
“Os trabalhadores são os mais prejudicados com a falta de democracia na mídia porque não tem acesso a este espaço e quando aparece, aparece da pior maneira possível. Por isso a importância de a luta estar no chão da fábrica, na base, não se restringindo apenas aos jornalistas, mas também sendo prioridade da classe trabalhadora no geral”, diz.
E acrescenta: “No dia em que as organizações sindicais se engajarem nessa luta ela dará um salto enorme e avançará em suas principais bandeiras. É preciso potencializar o movimento de cartase e mobilização política, tão fortemente utilizado na internet, nas ruas e no interior dos movimentos, e os trabalhadores são fundamentais para isso”.
Nesse sentido, para a deputada Federal Luciana Santos (PCdoB/PE) democratizar a mídia significa por fim a uma excrecência histórica do país. “Essa luta deve compor todas as frentes de batalha. Sociedade civil e movimento sindical devem unir forças para este combate. Não podemos mais tolerar que transformem a comunicação em uma mercadoria, que tem dono, endereço e valor de troca”, disparou.
“Para nós a democratização dos meios de comunicação, significa a garantia das liberdades, dos direitos e sobretudo da participação de todos no processo de construção do país. Um processo que tenha como norte a inclusão social e a valorização dos trabalhadores e das trabalhadoras. É chegada a hora de por um fim a prática da propriedade cruzada e da concentração dos meios nas mãos de poucas famílias. A comunicação alternativa, por exemplo, precisa ser valorizada”, ressaltou a parlamentar durante a entrevista.
Ela acrescentou que “é chegada a hora de se implementar um novo marco regulatório que garanta o espaço de atuação aos veículos alternativos. As rádios comunitárias, por exemplo, precisam ter o espaço e direito de expressar sua opinião sobre o que acontece no Brasil. As tevês comunitárias precisam ter o incentivo necessário para propor um modelo alternativo ao hegemônico. E digo mais, é preciso que os meios privados, que já estão em funcionamento, cumpram com o que está previsto na Constituição Federal”.
Guerrilha pela liberdade
Altamiro Borges, blogueiro e presidente do Centro de Estudos de Mídia Barão de Itararé, destaca que os setores progressistas e populares do país precisam ter em mente o que está em jogo neste enfrentamento.
“Nesta luta, organizar a comunicação é essencial no processo. Isso significa ampliar investimentos em comunicação, orientar os setores atingidos pelos oligopólios da mídia. Ou seja, a formação das lideranças, os investimentos em plataformas de comunicação e o
entendimento do que significa essa ferramenta de luta, tornam-se centrais nesta guerrilha pela liberdade”, explicou o blogueiro.
Segundo ele, “para travar o debate de ideias no interior da sociedade é preciso antes de tudo inserir as informações necessárias que fundamentarão este debate. O movimento sindical possui um potencialidade incrível, e alto grau de produção, mas mesmo este, precisa pensar com mais atenção o papel de sua comunicação frente ao que é colocado pela mídia burguesa”.
César Bolaño, pesquisador da Universidade Federal de Sergipe (UFS), compartilha da opinião e lembra que essa luta deverá ser travada em diversos níveis, pois não tratamos de qualquer comunicação, tratamos de uma comunicação elitizada e imperialista.
Ele alerta que “a TV, como os demais meios de comunicação de massa, não fazem outra coisa senão permitir a comunicação, uma comunicação especificamente capitalista. Longe de criar incomunicabilidade, esses meios sobre informam, sobre-comunicam, numa ânsia imperialista de dominar o conjunto dos processo comunicativos que se exercem no nível do mundo da vida”.
Quero falar também!
Com o objetivo de reforçar as fileiras dessa luta e garantir a voz e o direito de informar e de ser informado, em agosto de 2013, foi lançada a Campanha para Expressar a Liberdade, apoiada por cerca de 40 entidades da sociedade civil e que encabeçam a campanha para a construção de um Projeto de Lei de Iniciativa Popular para uma Comunicação Democrática no Brasil (PlipCom).
Rosane Bertotti, coordenadora geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), informa que o projeto dispõe sobre os serviços de comunicação social eletrônica, televisão e rádio. E que a proposta também observa a execução dos artigos nunca regulamentados do capítulo 5 da Constituição Federal Brasileira, que trata da Comunicação Social (Art. 220 a 224). Bertotti salienta que o projeto tem o objetivo de envolver a população brasileira na luta pela democratização da comunicação, pautando um tema que é bloqueado pela grande mídia e ainda distante de muitos brasileiros.
Altamiro Borges destaca que com a validação do PlipCom, que precisa obter 1,3 milhão de assinaturas, e seu envio ao Congresso Nacional, o próximo passo será pressionar o os parlamentares para a provação do texto.
“Infelizmente o Congresso nunca cumpriu seu papel, basta lembrar que os artigos que versam sobre a comunicação nunca foram regulamentado. Oura coisa é que o governo Dilma não sinaliza que irá comprar essa briga. A Constituição de 88 definiu as balizas do que deveria ser a comunicação no Brasil, porém o Congresso fechou os olhos sobre está questão. Nosso objetivo é cobrar isso, e com um projeto de lei nas mãos estaremos preparados para esta disputa”.
Rosane Bertotti acrescenta que é chegada a hora de “batalharmos pela regulamentação da mídia, pela sua democratização, e pela universalização das tecnologias digitais. Só assim faremos valer a democracia e brecaremos os desmandos dos que, historicamente, ditaram as regras no Brasil”.
*Joanne Mota é jornalista.
Fonte: Revista Visão Classista