Ação flagra 17 em condição análoga à escravidão em restaurantes de sushi

FONTEPor Leonardo Sakamoto e Daniel Camargos, do UOL
Alojamento em condições degradantes em que trabalhadores de restaurantes japoneses foram encontrados (Foto: AFT)

O grupo especial de fiscalização móvel resgatou 17 pessoas de condições análogas às de escravo que trabalhavam para dois restaurantes de comida japonesa na zona norte da capital paulista. A maioria das vítimas era oriunda da Paraíba e do Piauí.

Chamada de “Operação Sushi Paulistano”, a ação contou com a participação de auditores fiscais da Superintendência Regional do Trabalho em São Paulo, da procuradora do Ministério Público do Trabalho, Alline Pedrosa Oishi, e por agentes da Polícia Federal.

De acordo com a fiscalização, as condições nas duas casas que serviram de moradia aos trabalhadores eram extremamente degradantes, com colchões imundos e pedaços de espuma sujos usados como travesseiros, além de paredes tomadas por mofo e a presença de fogão e botijão de gás ao lado das camas.

No único banheiro de uma das casas, o chuveiro elétrico estava inoperante. Segundo a fiscalização, “um dos trabalhadores confessou que não tomava banho há cinco dias, o que, além de atingir sua dignidade, era incompatível com a higiene exigida pela vigilância sanitária em restaurantes”.

“Era uma imundice, uma situação inaceitável”, avaliou o auditor fiscal do trabalho Paulo Warlet, que coordenou a ação. De acordo com ele, a atmosfera do alojamento era um odor misto de suor e urina e havia lixo e sujeira em abundância.

A fiscalização considerou que as empresas Sushi Tucuruvi Delivery, a Hajime Sushi Bar Tucuruvi e a Sushi Vila Gustavo constituíam um grupo econômico que compartilhava a mão de obra dos trabalhadores.

O gerente de um dos restaurantes, Anderson Oliveira, disse que a empresa solucionou os problemas relacionados ao alojamento precário, comprou colchões, pagou os direitos trabalhistas e multas e depois recontratou os que quiseram voltar. “Já está tudo resolvido”, afirma. A reportagem tentou contato com proprietários, mas não atenderam as ligações.

Rescisões trabalhistas foram pagas após a fiscalização

Também foram flagrados empregados sem registro, apropriação de valores pagos pelos clientes como gorjetas e sobrejornada. Um dos trabalhadores chegava a fazer mais de 60 horas semanais.

Diante da configuração de condições degradantes, um dos elementos que caracteriza o trabalho escravo contemporâneo, a fiscalização autuou o empregador e obrigou o pagamento dos direitos trabalhistas e verbas rescisórias, o que foi feito nesta segunda (29).

Parte dos trabalhadores voltou aos seus estados de origem e receberá três parcelas do seguro-desemprego voltado aos resgatados do trabalho escravo. E parte resolveu ficar após o empregador prometer que operaria dentro da lei, contratá-los legalmente e transferir todos para um hotel.

Para proteger os trabalhadores, a ação de fiscalização permanecerá aberta para monitorar as condições em que eles estão pelos próximos quatro meses.

Trabalho escravo contemporâneo no Brasil

A Lei Áurea aboliu a escravidão formal em maio de 1888, o que significou que o Estado brasileiro não mais reconhece que alguém seja dono de outra pessoa. Persistiram, contudo, situações que transformam pessoas em instrumentos descartáveis de trabalho, negando a elas sua liberdade e dignidade.

Desde a década de 1940, a legislação brasileira prevê a punição a esse crime. A essas formas dá-se o nome de trabalho escravo contemporâneo, escravidão contemporânea, condições análogas às de escravo.

De acordo com o artigo 149 do Código Penal, quatro elementos podem definir escravidão contemporânea por aqui: trabalho forçado (que envolve cerceamento do direito de ir e vir), servidão por dívida (um cativeiro atrelado a dívidas, muitas vezes fraudulentas), condições degradantes (trabalho que nega a dignidade humana, colocando em risco a saúde e a vida) ou jornada exaustiva (levar ao trabalhador ao completo esgotamento dado à intensidade da exploração, também colocando em risco sua saúde e vida).

O grupo especial móvel de fiscalização, que completou 27 anos em maio, e é composto pelos órgãos que participam da operação em São Paulo, mas também pela Defensoria Pública da União, pela Polícia Rodoviária Federal e pelo Ministério Público Federal, é a base no combate a esse crime no país.

Os mais de 58 mil trabalhadores resgatados estavam em fazendas de gado, soja, algodão, café, frutas, erva-mate, batatas, cebola, sisal, na derrubada de mata nativa, na produção de carvão para a siderurgia, na extração de caulim e de minérios, na construção civil, em oficinas de costura, em bordéis, entre outras atividades, como o trabalho doméstico.

A pecuária bovina é a principal atividade econômica flagrada desde 1995. Números detalhados sobre as ações de combate ao trabalho escravo podem ser encontrados no Painel de Informações e Estatísticas da Inspeção do Trabalho no Brasil.

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