Adolescente negro é absolvido de acusação de assassinato nos EUA 91 anos após sua execução

Alexander McClay Williams, então com 16 anos, foi condenado à pena de morte em 1931

Um adolescente americano negro que foi condenado à pena de morte em 1931 pelo suposto assassinato de uma mulher foi inocentado pelo tribunal da Pensilvânia nesta semana, após décadas de alegações feitas pela sua única irmã ainda viva. Alexander McClay Williams, então com 16 anos, foi condenado por um júri formado somente por brancos em apenas quatro horas de julgamento, no caso da pessoa mais jovem já condenada à morte no estado, que fica no leste dos EUA.

Contudo, 91 anos depois do julgamento, um juiz do condado rejeitou o caso e declarou que Williams era inocente da acusação, segundo a AFP.

“Estou feliz que finalmente acabou como deveria no começo”, disse a irmã de Williams, Susie Williams-Carter, que tem 92 anos. “Nós só queríamos que fosse derrubada [a acusação], porque sabíamos que ele era inocente, e agora queremos que todos saibam disso também.”

O procurador distrital do condado de Delaware, Jack Stollsteimer, disse em comunicado que o caso foi arquivado na segunda-feira, após anos de litígio. A decisão “é um reconhecimento de que as acusações contra ele nunca deveriam ter sido feitas”, segundo o comunicado.

O caso é o mais recente reconhecimento de injustiças raciais históricas no sistema legal dos Estados Unidos, que condenou, e em alguns casos executou, americanos inocentes, muitos deles negros, no século seguinte à Guerra Civil, entre 1861 e 1865.

Em 3 de outubro de 1930, Fred Robare, ex-marido de Vida Robare, funcionária da Glen Mills School for Boys, um centro de detenção para jovens infratores, encontrou a esposa já sem vida. Segundo relatos da época, ela havia sido “brutalmente assassinada” em sua casa, que ficava no terreno da escola, segundo um promotor público.

Williams, que cumpria um “mandato indefinido” em Glenn Mills, foi acusado do crime. Interrogado cinco vezes sem a presença de um advogado ou do pai, ele assinou três confissões, “apesar da falta de testemunhas oculares ou evidências diretas que o impliquem”, segundo o comunicado.

Algum tempo depois, William H. Ridley, o primeiro membro afro-americano da Ordem dos Advogados do condado, foi nomeado para realizar a defesa do jovem.

“Ridley recebeu US$ 10 (cerca de R$ 50) do Tribunal para despesas (aproximadamente US$ 173 atualmente, ou R$ 874) e teve apenas 74 dias para estabelecer uma defesa, sem a assistência de investigadores, especialistas ou recursos”, disse o comunicado desta semana. “A Commonwealth reuniu uma equipe de quinze membros para lidar com o julgamento, que durou menos de dois dias. O réu enfrentou um júri todo branco, que o considerou culpado em menos de quatro horas. Nenhum recurso foi apresentado.”

Junto de familiares, Susie Williams-Carter (à direita), irmã da vítima, celebrou a decisão — Foto: Reprodução/O Globo

Após a decisão, o procurador Stollsteimer prestou uma homenagem à irmã de Williams e ao bisneto de Ridley, que “trabalhou incansavelmente durante anos para demonstrar as inconsistências nas evidências, bem como a maneira inescrupulosa como o caso foi tratado”. Segundo ele, havia evidências “substanciais” que foram ignoradas ou não examinadas.

Isso incluiu a impressão da mão ensanguentada de um homem adulto encontrado perto da porta da cena do crime, fotografado pela polícia, mas nunca mencionado no julgamento e o fato de Vida Robare ter se divorciado do marido por “crueldade extrema”, sendo que o ex-marido nunca foi apontado como suspeito do crime.

“Acreditamos que as proteções constitucionais deste jovem foram violadas de forma irreparável”, concluiu Stollsteimer.

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