‘Tire o pé do chão e mantenha a Amazônia de pé”. Esse é o mote de uma campanha que celebra o Dia da Amazônia, comemorado no próximo dia 5, e que promoverá ao longo da semana oito festivais e mais de 500 ações espalhadas pelo país. Mais do que um slogan restrito a ambientalistas, esta deveria ser uma meta de todos, afinal, o modo como o Brasil lida com este bioma tem significativos impactos sociais, econômicos e geopolíticos em diversos setores.
Internacionalmente, a Amazônia já nos deu protagonismo na agenda ambiental — como na Eco-92 e no Acordo de Paris de 2015. Mas hoje, diante do desmonte promovido pelo atual governo, somos vistos como “pária global”. É necessário resgatar a condição de liderança, mas precisamos ir além. A agenda a ser trabalhada vai da valorização da biodiversidade a compromissos com o enfrentamento da emergência climática, o fim do desmatamento ilegal, o combate à exploração criminosa de minérios.
E todas as ações devem priorizar povos locais originários, ribeirinhos, quilombolas, urbanos e rurais, que enfrentam situações de múltiplas vulnerabilidades, em regra mais graves e intensas que no resto do país. O olhar para a população amazônida, considerando sua heterogeneidade e suas vozes, é condição central para os caminhos de desenvolvimento local e sustentável.
Dentro desse pacote, a educação é também fundamental. A Amazônia Legal (composta por Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e alguns municípios do Maranhão) enfrenta dificuldades maiores do que outras regiões, sobretudo na educação infantil e no ensino médio.
Dados do relatório “Educação na Amazônia Legal” — conduzido pelo projeto Amazônia 2030 e produzido em 2021 pelas economistas Tássia Cruz e Juliana Portella — apontam que o acesso a creches é menor na região comparativamente aos demais estados brasileiros (26% e 45%, respectivamente). Padrão similar é observado no ensino médio, cuja taxa de escolarização bruta corresponde a 73% na Região Amazônica contra 82%, em média, dos demais estados brasileiros.
Parte da alta evasão verificada é explicada também pela dificuldade de acesso às escolas, posto que mais de 23% da população da Amazônia Legal vive na zona rural, mas apenas 14% das vagas do ensino médio encontram-se nessas regiões. Além disso, longas distâncias e o tempo necessário nos deslocamentos — que são, em sua maioria, realizados via transporte fluvial na área rural — exigem investimentos maiores do que em outras regiões.
Dados do relatório “Radar educacional amazônico”, de 2022, produzido pela Fundação Amazônia Sustentável em parceria com o Instituto Unibanco, mostram, no entanto, que o valor médio do investimento-aluno na região é apenas 84% do restante do país.
Felizmente, apesar da magnitude do desafio, há um cardápio de experiências exitosas locais que merecem ser reconhecidas. O Programa Família Que Acolhe, criado em 2013 pela prefeitura de Boa Vista (RR), é exemplo de política integrada para a primeira infância mundo afora. Significativos avanços de aprendizagem ocorreram na rede municipal de Manaus (AM) entre 2015 e 2019, que saiu do 20º lugar para o 9º lugar entre as capitais no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).
O ineditismo do Centro de Mídias no Amazonas — responsável por fornecer, desde 2007, acesso a tecnologias informacionais a mais de 300 mil estudantes do ensino médio em regiões distantes e isoladas — é também referência nacional e internacional.
Bons exemplos não faltam, mas ainda são insuficientes. Para avançar em escala, é necessário produzir políticas públicas multissetoriais e multinível, mais integradas, capazes de serem moduladas às múltiplas configurações de vulnerabilidade e potencialidade no território.
É também fundamental que haja desenvolvimento in loco de estratégias específicas, que lidem com os desafios logísticos e incorporem ativamente as demandas das comunidades, com iniciativas que apontem caminhos para a universalização da educação básica, definindo o tipo de financiamento necessário para assegurar o acesso e permanência dos estudantes.
Infelizmente o Brasil segue de costas para a Amazônia. Por fim, às vezes é preciso enfatizar o óbvio: não existe saída para a Amazônia que não passe rigorosamente pelos amazônidas.
PS: A programação dos festivais pode ser acessada em festivaisdiadaamazonia.com.br