Ao barrar anúncios, LinkedIn se compromete com sociedade desigual e injusta

O posicionamento do LinkedIn contra anúncios de vagas por instituições empregadoras que promovem a equidade racial por meio de ações afirmativas revela um comprometimento da rede social com uma sociedade desigual e injusta.

A sociedade brasileira tem no racismo sua primeira matriz de desigualdades. Foi a partir das hierarquizações entre europeus, negros e indígenas que se constituíram de forma sistemática as injustiças socioeconômicas que até hoje caracterizam o Brasil.

A Constituição Federal impõe às empresas e outras instituições empregadoras um papel ativo na redução das desigualdades. Em capítulo específico sobre os princípios gerais da atividade econômica, está expressamente previsto que:

“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (…) 7º – redução das desigualdades regionais e sociais”.

Portanto, cabe às empresas, principais agentes econômicos empregadores em nossa sociedade, o papel de promover equidade.

São fartos os relatórios de estudos e pesquisas sobre as desigualdades raciais na sociedade brasileira. Neles, se percebe uma invariável: a população negra possui os piores indicadores sociais no exercício de todos os direitos sociais. No caso do direito ao trabalho, os dados revelam desigualdades ainda mais agudas. Não é por menos, afinal, o projeto econômico brasileiro escravizou a população negra e, em seguida, a excluiu de participação digna e igual, desde o período pós-abolição até hoje.

Desta forma, cabe às empresas promover a equidade racial, também por meio de programas que direcionam vagas exclusivas para negros. Trata-se de um instrumento de eficácia já comprovada para redução de desigualdades.

Além da Constituição Federal, há diversas normas no mesmo sentido, como a Convenção 111 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), a Convenção pela Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (Cerd), a Declaração de Durban, o Estatuto da Igualdade Racial, a Convenção Interamericana contra o Racismo, entre outras. Portanto, é necessário que o LinkedIn reveja sua posição, que contraria as normas jurídicas, sob pena de ser responsabilizado por danos coletivos à população negra.

Mas a questão vai muito além das implicações jurídicas. O que emerge em algumas instituições é, sobretudo, resistência aos avanços para a equidade que vêm sendo obtidos pelas ações afirmativas.

É a reação às negras e aos negros que lhes batem às portas, com diplomas nas mãos, dizendo que ali também é seu lugar. Importante notar que essa reação é a mais inconteste avaliação positiva da chamada Lei de Cotas nas universidades e institutos federais, bem como de outras modalidades de ações afirmativas no ensino superior. É a afirmação peremptória do seu sucesso, mas também da necessidade de sua ampliação, para que o alunado universitário reflita a proporcionalidade de pessoas negras em nossa sociedade. Apenas dez anos de implementação da lei jamais seriam suficientes para dar conta de séculos de opressão.

Ainda assim, mesmo sem medidas de apoio governamental, a lei persiste. É carregada nas costas pela própria população negra, cujas famílias demandam não apenas seus filhos nas universidades que são suas por direito. Exigem também que as empresas cumpram seu papel na sociedade, promovendo o direito ao trabalho digno para todas as pessoas, destacadamente aquelas que vêm sendo excluídas há séculos.

E é exatamente por isso que cobramos publicamente do LinkedIn revisão de sua política atual, tornando-a consentânea com a promoção da equidade racial e com seu próprio discurso institucional. Em tempos de retomada das rodas de samba que já estavam fazendo muita falta, é sempre importante lembrar Candeia: “Cante samba na universidade e verá que seu filho será príncipe de verdade”. E é preciso cada vez mais ecoar a voz cristalina de Dona Ivone Lara: “Negro sem emprego fica sem sossego… negro é a raiz da liberdade”.

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