‘Justiça para todo um país’

Enviado por / FonteO Globo, por Anielle Franco

Anielle Franco, ministra da Igualdade Racial e irmã de Marielle, lembra a dor causada pelo assassinato da vereadora e tantos outros que tiveram a vida roubada pela violência no Rio

Diante de mais de vinte horas de duração de julgamento, memórias e lembranças dolorosas vieram à tona daquela fatídica noite do 14 de março em que nossas vidas mudaram. Eu lembro muito nitidamente da sensação naquele momento em que soubemos o que tinha acontecido contra a minha irmã. Com tanto desespero, achei que iria perder meus pais e minha sobrinha. Lembro de em seguida ter ido ao local do crime. De no dia seguinte ver minha irmã desfigurada e ter que reconhecer o seu corpo – irreconhecível – no IML. De proteger a sua imagem e a sua memória mesmo depois da sua morte, de me perguntar: por que tanta crueldade e covardia? Quem matou? Quem mandou matar Marielle? E por quê?

Foram seis anos, sete meses e dezessete dias em uma busca profunda por respostas e, especialmente, por responsabilização. Eu nunca entendi realmente o sentimento que tomou conta de mim. Eu nunca soube nomear ou definir o tamanho do vazio que ficou em mim após tirarem minha irmã do meu convívio e todas as consequências que vieram disso.

Minha irmã, a quem eu carinhosamente sempre me referi como minha parceira, mudou o cenário da política carioca. Naquele dia, além da minha irmã, tiraram o Anderson do Arthur e da Ágatha. Tiraram a vereadora de 46.502 eleitores com uma trajetória ascendente na política.

As pessoas que assassinaram Marielle e Anderson e os mandantes do crime não esperavam que ela sairia maior do que eles. Afinal, quem admitiria uma mulher negra, favelada, cheia de vida e de atitude, chegar na Câmara como chegou? não queriam que ela permanecesse ali. Era muita presunção, pensaram. Quem essa mulher acha que é para chegar aqui e achar que pode ficar? Eles estavam errados. Tentaram interromper Marielle, mas minha irmã ecoa e ecoará sempre.

Nós nunca desistimos. Sabe por quê? Porque a Marielle, minha irmã, minha líder, nunca desistiria. A justiça que começou a ser desenhada ontem não foi somente para a minha família. Mas sim para todo o país, para o estado do Rio, para o mundo e para todos aqueles e aquelas que já tiveram alguma pessoa amada arrancada de suas vidas.

A justiça que chegou ontem não leva somente o nome de Marielle Franco e Anderson Gomes, leva também o de João Pedro, Agatha, Jonathan, Emily, Eloah, Thiago, Juan, Rafaelly, Ketleen, Yan, Gabriel e tantos outros que se foram. Se foram, não, foram assassinados. Até quando nós iremos normalizar corpos de pessoas negras, pobres, trabalhadoras, honestas, de crianças, de pais, de mães, de seres humanos? Ninguém, eu repito, ninguém merece ter a vida ceifada como essas pessoas tiveram.

Um futuro de paz justiça e democracia, é isso o precisamos para o Brasil. Nossas favelas e periferias, nossos trabalhadores e nossas trabalhadoras, nossas crianças, todos, sem exceção, só querem andar tranquilamente e ter o direito de sonhar. Sempre lutarei para que justiça seja regra e não exceção nesse país. Por Marielle, pelo Anderson, e por todos aqueles que aguardam justiça é que eu me levanto, ergo minhas forças e defendo um país com empatia, segurança e respeito.


Anielle Franco – Ministra da Igualdade Racial do Brasil @igualracial_gov. Fundadora do @inst_marielle, educadora e irmã de @mariellefranco.

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