As desculpas do humorista do “Pânico” e as bananas de Gentili. Por Kiko Nogueira

O “Pânico” e o comediante Eduardo Sterblitch tomaram a decisão ajuizada de tirar do ar o quadro do “Africano” depois que a palhaçada foi alvo de uma denúncia encaminhada à Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) da Presidência da República.

Por Kiko Nogueira Do DCM

Além dos protestos de brasileiros, o personagem já havia sido destrinchado num site do Senegal, Seneweb. A autora da postagem pergunta: “Brésil un Pays Raciste?” (a resposta óbvia é “mais oui!”)

Sterblitch escreveu em sua defesa: “Não sou racista! E também estou chorando… A quem deixei triste ou pior, peço desculpas por minha IGNORÂNCIA! Que, pelo menos, eu sirva de exemplo! Para que isso não aconteça mais.”

Assisti a coisa. Pintado de preto, o tipo “recebe entidades”, faz grunhidos — enfim, é difícil imaginar que alguém consiga rir daquilo, não apenas por ser absurdamente ofensivo.

Não há razão para crer que Sterblitch esteja sendo cínico. Aparentemente, não é um idiota. Já declarou que admira a peça “Esperando Godot”, de Beckett, e autores como Nietzsche e James Joyce — o que, mais uma vez está comprovado, não quer dizer nada.

Mas merece crédito por ter assumido que cometeu uma enorme estupidez.

Poderia ter se saído com o velho blábláblá sobre a liberdade de expressão, os limites do humor etc. Poderia ter culpado “a ditadura do politicamente correto”, apelar para o coitadismo e lembrado dos bons tempos dos chatos Trapalhões, como faz seu colega Danilo Gentili.

Gentili é o símbolo maior de um humor brasileiro covarde e de baixo nível. Poder-se-ia dizer o pai do “Africano”. Curiosamente, ficou em silêncio, até agora, no caso Sterblitch.

No ano passado, o juiz Marcelo Matias Pereira o absolveu do crime de injúria racial numa ação movida por um jovem negro de nome Thiago Ribeiro.

Ribeiro publicou no Twitter diversas mensagens se queixando de manifestações racistas de Gentili. A certa altura, o humorista lhe propôs: “Quantas bananas você quer para deixar esta história para lá?”

Alguns anos antes, ele já havia feito uma “brincadeira”: “King Kong, um macaco que, depois que vai para a cidade e fica famoso, pega uma loira. Quem ele acha que é? Jogador de futebol?”

Ribeiro o processou. O juiz conseguiu jogar a conta nas costas da vítima, no que virou uma sentença clássica pelas razões erradas. “A pessoa que não tem condições de participar de brincadeiras e piadas não deve evidentemente interagir com um [perfil de] Twitter com essa finalidade”.

Gentili jamais pediu perdão. Ao contrário, transformou o episódio em uma luta do indivíduo contra a “patrulha do pensamento”, ou algo que o valha, dando um alento a milhares de boçais que hoje criam páginas celebrando o racismo.

Leia também: A certeza da impunidade: Danilo Gentili oferece ‘bananas’ a internauta negro pelo Twitter

Essa valentia, claro, serve para os negros. Gentili ofendeu também os judeus numa blague inacreditável: “Entendo os velhos de Higienópolis temerem o metrô. A última vez que eles chegaram perto de um vagão foram parar em Auschwitz”.

Naquela ocasião, no entanto, fez um mea culpa: “Minha intenção como comediante nunca foi trazer nenhum outro sentimento ao público q não fosse alegria. Peço perdão se falhei nesse meu objetivo com a piada q fiz essa tarde. Me coloco a disposição da comunidade Judaica para me redimir” (sic).

Não se sabe de seus serviços para a comunidade judaica, mas ele foi trabalhar com Silvio Santos.

Recentemente, Amy Schumer, sensação da comédia americana, se desculpou por um número com latinos. “Quando percebi que tinha mais olhos e ouvidos sobre mim e que exercia uma influência maior, parei de contar piadas como essa no palco”, afirmou. “Estou evoluindo como artista”.

Eduardo Sterblitch tomou para si a responsabilidade. Eventualmente, isso resultará num artista melhor (já o “Pânico não tem salvação). A outra opção é culpar os ofendidos, se fingir de quixote, denunciar o estado opressor — e permanecer um imbecil sem graça, falando eternamente para uma plateia de imbecis.

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