A banalização do mal na sociedade brasileira

Não podemos admitir de maneira nenhuma a violência contra os animais. É de fato uma das coisas mais asquerosas, sejam eles cãezinhos domésticos ou animais selvagens, caçados com requintes de crueldade.

Por Mônica Francisco   Do Jornal do Brasil 

Mas, ao ver os noticiários que foram unânimes em mostrar o mau trato aos dois cachorrinhos, me chamou a atenção o fato de também terem noticiado a tragédia que alcançou o jovem Diego Algarve, sua família e parte da sociedade, mais precisamente aquela que é alvo direto da violência cotidiana e invisibilizada pelo consentimento de uma outra boa parte da sociedade.

Um tiro na nuca, à luz do dia, em seu horário de trabalho como mototaxista em uma favela do Complexo da Penha. O que me causa espécie é o fato de prontamente haver uma mobilização com mais de mil pessoas já confirmadas, uma grande quantidade de vozes, inclusive a minha, contrárias à atitude do rapaz que maltratou os bichos, e a total letargia ao fato de um jovem de 22 anos ter sua vida interrompida de forma tão dramática.

A  filósofa Hannah Arendt  definiu que o mal pode ser banalizado, ou seja a execução da maldade contra outro ser humano seja naturalizada, realizada de forma mecânica e sem nenhum constrangimento. Isso, ao analisar a atuação de oficiais nazistas, tomando como referência o julgamento de Adolf Eichmann.

Neste momento é a situação que melhor  nos define como sociedade. Há um descolamento total da ética, da humanidade ou da humanização em se tratando de determinados sujeitos, e determinados é a melhor expressão a se utilizar aqui.

Há uma banalização da morte de jovens, negros e moradores de periferias. Sejam adultos ou crianças. Deve ser doloroso para as mães de crianças mortas de forma violenta, sejam por balas ou nos hospitais públicos, por exemplo, verem tamanha comoção em se tratando de animais, e poucas manifestações, em se tratando de humanos.

Sinal dos tempos, falta de amor, falta de fé, individualização cada vez crescente das relações, muitas desculpas, mas sempre o mesmo e anômalo comportamento de desumanização, decorrente do racismo incrustado na sociedade brasileira e em suas instituições.

Só nos resta esperar que  tornemos à rota. Que não apoiemos a punição contínua daqueles que estão em situação mais vulnerável, e assim o é porque parte da sociedade brasileira apoia incondicionalmente todas estas violações, apoia e cerra os olhos para tudo isso.

Há que se rever nossas práticas em relação aos negros neste país, que não difere muito das da época da escravidão, só que com técnicas mais refinadas de tortura e morte. Acredito que a instauração da Comissão da Verdade da Escravidão Negra no Brasil seja um passo mais adiante neste sentido.

“A nossa luta é todo dia. Favela é cidade. Não aos Autos de Resistência, à GENTRIFICAÇÃO e ao RACISMO, ao RACISMO INSTITUCIONAL, ao VOTO OBRIGATÓRIO e à REMOÇÃO!”

*Membro da Rede de Instituições do Borel, Coordenadora do Grupo Arteiras e Consultora na ONG ASPLANDE.(Twitter/@ MncaSFrancisc

+ sobre o tema

para lembrar

Diversidade do povo brasileiro não está representada no cotidiano

Por: Mônica Francisco* A negação de um fato pode ter...

Rede de Mulheres

A Rede de Mulheres Empreendedoras , que é tocada...

A todas as mulheres

Neste domingo (8) comemoramos o Dia Internacional da Mulher....

Combater o racismo é lei no Rio de Janeiro

Enfrentar toda forma de discriminação e preconceito é responsabilidade...

Combater o racismo é lei no Rio de Janeiro

Enfrentar toda forma de discriminação e preconceito é responsabilidade de toda sociedade dita civilizada. Trago em minha trajetória o combate veemente às chagas que...

Mônica Francisco, eleita no Rio: ‘Minha eleição é consequência de uma trajetória’

Ativista, pastora e feminista, ex-assessora de Marielle Franco foi eleita deputada estadual no Rio de Janeiro com mais de 40 mil votos. Por Leda Antunes, no...

A dororidade e a dor que só as mulheres negras reconhecem

"Boa noite, Vilma. Seu livro mostrou meu não lugar... não tenho a branquidade de Schuma Schumacher (escritora e feminista), nem a vivência das Pretas....
-+=