Bolsistas do ProUni dizem ser vítimas de preconceito

Luísa Ferreira

Estudante da PUC-SP diz ter sido chamada de vagabunda por ser bolsista

Ofensas, humilhação, portas fechadas para estágios na universidade. São essas as condições que atingem uma parte dos beneficiados pelo ProUni (Programa Universidade para Todos), que já atendeu quase 750 mil estudantes em todo o país desde o ano de sua criação, em 2004.

Ex-aluna do curso de direito da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), Meire Rose Morais, de 46 anos, soube que havia sido chamada de “vagabunda” junto com outros bolsistas enquanto ainda estudava na instituição, em novembro de 2010.

Uma colega da universidade a ofendeu sistematicamente em 33 mensagens de e-mail, que tratavam tanto de sua situação como bolsista no ProUni quanto de sua cor – a estudante é negra.

– A turma [da classe] possuía um grupo de e-mails e os ataques vieram depois que encaminhei uma mensagem que tratava de política, pois alguns colegas haviam me pedido. Nos e-mails ofensivos, ela [a agressora] dizia que eu era feia, falava da minha cor e que o “povo” do ProUni era um bando de vagabundos.

Diante da situação, Meire procurou a diretoria da PUC-SP. A instituição abriu uma sindicância interna para apurar o caso. A jovem diz ainda não ter sido ouvida, mesmo tendo se graduado no fim do ano passado, e teme que a investigação esteja para vencer. Procurada pelo R7, a PUC-SP não deu informações sobre a sindicância.

A ex-estudante diz que o preconceito começou no primeiro ano de sua graduação, em 2005, quando estava matriculada em outra turma do curso de direito – ela teve que deixar a faculdade durante um ano por questões pessoais.

Em uma comunidade do Orkut da antiga turma, foram colocadas mensagens criticando Meire por ser bolsista e por sua aparência. Na época, a ex-universitária conversou com os colegas, que acabaram se desculpando.

A bacharel em direito pretende processar a agressora da nova turma da PUC-SP, em nível criminal e cível, por preconceito e racismo.

Troca de universidade

Às vezes a discriminação, mesmo que aparentemente mais leve, incomoda tanto que a única saída do aluno é trocar de universidade. Foi o que aconteceu com a jornalista Daniela Kopsch, 24. A jovem estudava na PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná), em Curitiba.

Em nenhum momento ela teve vergonha de dizer que era bolsista em sala de aula, como outros colegas beneficiados pelo ProUni. Mas logo percebeu que alguns alunos tinham um tratamento diferente com ela. Segundo a jornalista, os pagantes cobravam que os bolsistas “provassem a todo momento que não tinham condições de pagar a faculdade”.

– Uma vez ouvi comentários quando um menino do ProUni chegou com tênis novo. Não acho que seja por mal, mas as pessoas passam a exigir que o bolsista passe os quatro anos da faculdade provando que é miserável. Depois de um ano, eu não aguentava mais isso e me transferi de faculdade.

Na Univali (Universidade do Vale do Itajaí), em Santa Catarina, Daniela preferiu manter o fato de ser bolsista escondido – ela revelou apenas para os amigos próximos. Mas a estudante não aconselha os outros bolsistas a fazerem o mesmo, pois acha “um absurdo” as pessoas terem que omitir algo normal em suas vidas, como obter uma bolsa do ProUni.

A PUC-PR foi procurada por telefone pelo R7, mas até a publicação da reportagem ninguém havia sido encontrado.

Inclusão tem que partir da universidade

Sabrina Moehlecke, professora de educação da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), afirma que o ensino superior antigamente estava restrito a uma elite intelectual e econômica. A partir da democratização causada pelo crescimento de bolsas, cotas, financiamentos e outros benefícios, as tensões começaram a aparecer.

Para a professora, a instituição universitária tem que se preocupar com a inclusão social de todos os alunos.

– Muitas instituições não estão interessadas nisso. Elas têm programas de acesso [para vários tipos de alunos], mas não gerenciam de uma forma que de fato inclua os alunos.

Twitter

Os bolsistas do ProUni são discriminados até no Twitter. Allan Simon, 19, estudante de jornalismo na Universidade Metodista, reclamou na rede social de alguns problemas de organização da instituição depois de uma palestra. Uma colega da universidade respondeu o jovem também pela internet.

– Ela disse que havia muita gente reclamando de barriga cheia, [pessoas] que [por terem bolsa] estariam tirando vagas de outras, que mereciam estudar mais do que elas. Respondi genericamente, para não criar caso. O preconceito não faz o menor sentido, porque fiz uma prova como todo mundo para entrar na faculdade.

Em nota oficial, a Metodista afirmou que repudia qualquer ato vexatório ou de discriminação. A universidade disse também que, caso haja alguma ocorrência nesse sentido, a postura da instituição é, nas esferas de cada curso, mediar e promover a conciliação entre os envolvidos, uma vez que todos os alunos têm direitos iguais.

A Metodista não registrou casos de discriminação, segundo a pró-reitoria de graduação.

 

Fonte: R7

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