Carta aberta aos organizadores da Marcha da Família 2, por Marcos Sacramento

 

Caros organizadores da Marcha da Família 2, embora falte pouco para o evento, vou cometer a ousadia, um tanto romântica, de sugerir uma mudança na pauta. Por que não marcham pela Cláudia da Silva Ferreira, a auxiliar de serviços gerais morta em um tiroteio no Rio de Janeiro e arrastada enquanto era socorrida pela viatura da PM?

A morte de Cláudia foi emblemática. Combinou pobreza, truculência policial, racismo e violência contra a mulher. O mais horrível é que se não fosse filmado o caso seria mais um a engrossar estatísticas da criminalidade.

Cláudia é mártir e merece que marchem por ela. Como vocês já estarão nas ruas, nada mais justo que homenageá-la. Você poderiam, também, marchar em homenagem às 16,9 mil mulheres assassinadas no país entre os anos de 2009 e 2011.

Marchem para denunciar o racismo endêmico que garante dois pretos ou pardos em cada três vítimas de homicídio, marchem contra a posição do país no topo do ranking de desigualdade social, marchem pelos aposentados que depois de trabalhar a vida inteira ainda precisam puxar um carro de picolé ou de pipoca para complementar a renda.

Mas por favor, não ponham as mazelas na conta do PT ou da Dilma. Isso é coisa de conversa de botequim, de gente mal informada. Você sabem muito bem que os problemas dos nosso país não foram causados só pelas duas letrinhas ou pelos dois últimos presidentes da república. Não sou petista, sequer voto no partido, só não tolero falatório sem fundamento.

Os problemas vêm de séculos, dos tempos da colonização, de uma formação econômica baseada na escravidão e de um sistema político feito por e para favorecer a elite. Tem causas múltiplas, não se restringe ao PT ou ao PSDB, ao DEM ou ao PSOL. Nosso empresariado tem uma boa parcela de responsabilidade ao financiar políticos em benefício próprio ou empreender visando apenas o lucro, sem responsabilidades sociais.

Por que não protestam contra o dono da Rede TV, que inaugurou uma mansão de 17 800 metros quadrados enquanto funcionários da emissora estavam com salários atrasados?

Ou então pelo caso de sonegação de impostos da Rede Globo, conhecem essa história? O “cidadâo de bem” que vocês tanto defendem vai se horrorizar com ela.

Marchem pelas vítimas dos “justiceiros”. Ano passado, um caminhoneiro atropelou e matou uma criança de dois anos, aqui no Espírito Santo. Foi linchado e morto. João Querino de Paula era o nome dele. Marchem por ele, que não teve direito a ampla defesa e contraditório. Marchem pela menina atropelada, vítima da falta de infraestrutura das periferias, onde a combinação de vias sem sinalização de trânsito com a ausência de áreas de lazer contribui para ceifar vidas.

Marchem pelo tenente Leidson Acácio Alves Silva, morto com um tiro na cabeça durante patrulha no Rio.

Mas deixem os militares de fora do protesto. Vocês sabem que eles ficaram no poder entre 1964 e 1985, sentem até saudade dessa fase, mas talvez tenham se esquecido que esse regime ditatorial catalisou as desigualdades sociais e deixou a economia brasileira em frangalhos.

Enfim, há muitos motivos para marchar. Daria para encher parágrafos e mais parágrafos de motivos nobres para vocês irem às ruas. Deixem essa paranoia de que estamos a beira de uma ditadura comunista para os hang outs de Lobão e Olavo de Carvalho. Quem acredita nisso crê até no Walter Mercado, aquele do “ligue djá”, lembram?

Abandonem a logorreia beligerante à Reinaldo Azevedo (toc, toc, toc) e Rodrigo Constantino (vade retro) e combatam o bom combate, a busca por um país mais justo, sem desigualdades.

O filme “Gran Torino” pode ser uma boa lição para vocês. Ele conta a história de um veterano da Guerra da Coréia coberto de preconceitos e ressentimentos com orientais. Até que as circunstâncias o levam a salvar um vizinho asiático. Walt, personagem de Clint Eastwood, escolheu seguir o caminho do bem e combateu o bom combate.

Vocês também são capazes disso, acreditem.

 

 

 

Fonte: Diário do Centro do Mundo

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