Clamando por Justiça, mãe de DG afirma: ‘Vou buscar força no mar’

Maratonista e nadadora, Maria de Fátima Silva afirma que fará de tudo para que a morte do dançarino não caia no esquecimento

Catharina Wrede
Gustavo Goulart

RIO — Da trágica morte do dançarino Douglas Rafael da Silva Pereira, de 26 anos, que revoltou a comunidade Pavão-Pavãozinho e chocou o país nos últimos dias, emergiu uma mulher que não se deixa calar. Da boca de Maria de Fátima Silva, a mãe de DG, o Brasil não ouviu apenas o grito de dor: foi bombardeado por palavras fortes, eloquentes e esclarecidas. Com nome de santa e garra de mãe coragem, ela diz que seu único objetivo é lutar por Justiça.

Mãe da médica Isabel Cristina, de 37 anos, que mora na Espanha — e, por isso, não conseguiu estar presente no enterro do irmão —, e de Jaqueline, de 34, que está grávida, Maria de Fátima perdeu, aos 56 anos, seu único filho homem. Auxiliar de enfermagem, profissão que exerceu também em Portugal, durante 15 anos, entre idas e vindas, ela consegue manter, em meio a tanta revolta, um discurso marcado pela clareza. Diante das câmeras, chegou a descrever os ferimentos no corpo do filho com objetividade (“afundamento do crânio e muita marca de espancamento no tórax”). Tomada pela cólera, ela voltou a afirmar, nesta quinta-feira, durante o sepultamento de Douglas no Cemitério São João Batista, em Botafogo, estar convencida de que ele foi torturado até a morte por PMs da UPP, o que a polícia nega. Além da lucidez, outra marca de Maria de Fátima é uma determinação que parece imune até ao sofrimento que agora a devasta. Flamenguista doente e apaixonada por samba, maratonista e nadadora de águas abertas — em março, ficou em sexto lugar numa prova entre as praias do Leblon e do Arpoador —, ela falou nesta quinta-feira para o GLOBO, na sala de de seu apartamento onde tem mais de 50 medalhas penduradas na parede:

— A depressão não vai me derrubar. O esporte e o samba vão me salvar — disse, com a voz segura, ela que, logo depois do crime, fez a denúncia que promete levar à Anistia Internacional. — Meu filho foi torturado com requintes de crueldade. Eles (policiais) pretendiam ensacar e sumir com o corpo dele.

Em 75, Maria de Fátima, que nasceu em Itororó, na Bahia, conheceu o jornalista português Paulo César Calazans, em Salvador, pai de seus três filhos. Ele viera para o Brasil, curiosamente, cobrir assassinatos de jovens do Pelourinho, que tiveram grande repercussão à época. A paixão fulminante acabou em 88, quando ela veio para o Rio (ontem, ele esteve no enterro do filho). Moradora da Rua Barata Ribeiro, em Copacabana, Maria de Fátima toca percussão e faz parte do projeto Natação no Mar. No site do projeto, há uma declaração dela, de seis anos atrás, quando contou ter superado o medo do mar: “Eu só tomava banho no estilo cachorrinho, na beirinha, com baldinho. Hoje, eu já fiz uma travessia, em Rio das Ostras. Fui muito bem. Entrei na água meio receosa, mas depois tomei coragem e fui embora.”

Quando perguntada sobre como enfrentará a morte do filho daqui para a frente, Maria de Fátima responde como uma nadadora que venceu o medo da água:

— Vou buscar força no mar. Eu nado. E se não tiver mais força, eu vou arrumar garra de qualquer jeito para que a morte do meu filho não caia no esquecimento.

Fonte: O Globo

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