- Negociadores da América Latina enfrentam resistência de países africanos para adesão do termo devido a diferenças culturais e financiamento
- Observadores e movimentos sociais defendem que termo permaneça no acordo final
O termo afrodescendente apareceu no primeiro pacote de definições da COP30 dentro da negociação paralela que envolve os temas de financiamento, metas climáticas mais ambiciosas, medidas comerciais unilaterais e relatórios de transparência.
Caso permaneça nos textos, será a primeira vez que os afrodescendentes, como brasileiros negros e quilombolas, serão reconhecidos na conferência da ONU sobre clima.
Observadores e representantes de movimentos sociais têm a perspectiva de que o termo seja mencionado nos textos de adaptação, transição justa e no plano de ação de gênero. Até o momento, a expressão permanece nos rascunhos dos três, além do pacote de mutirão.
Os ativistas esperam que a decisão saia na quarta-feira (19) e mantenha a menção aos afrodescendentes, mas ela ainda pode ficar de fora do texto final —que precisa ser aprovada por todos os países de maneira unânime.
Segundo negociadores, há dificuldades para entrar em um consenso global do que seriam os “afrodescendentes” e alguns países do continente africano temem por problemas na divisão do financiamento.
A Colômbia tem liderado a pressão pela menção inédita e outros países da América Latina, como México e Uruguai também têm vocalizado apoio nas salas de negociação. O governo colombiano conseguiu incluir o termo no texto da conferência mundial da ONU sobre biodiversidade, que aconteceu no ano passado em Cali.
A vice-presidente colombiana, Francia Márquez, anunciou nesta terça-feira (18) iniciativas para criar uma coalizão de países que apresente uma declaração perante a ONU, reconhecendo a contribuição dos povos afrodescendentes para a conservação do meio ambiente, com determinação de instrumentos financeiros e jurídicos específicos para o grupo.
Pesquisas apontam que as taxas de desmatamento em terras de afrodescendentes do Brasil, Colômbia, Equador e Suriname podem ser até 55% menores que em outros territórios de conservação.
A citação faria a COP30 ser para os afrodescendentes o mesmo que a COP21, em Paris, foi para os povos indígenas, dizem representantes da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas).
A primeira menção aos indígenas, afirmam, ampliou seu reconhecimento como liderança no combate à crise climática e facilitou o financiamento.
“Não adianta a gente lutar por financiamento direto, se a gente não tiver reconhecimento como povo”, diz Kátia Penha, coordenadora nacional da Conaq.
“Muito importante mais um documento, ainda que em rascunho, mencionar afrodescendentes. Vemos como positiva esta prática da Presidência da COP30, que vem avançando a cada manifestação. E deve continuar ao longo das próximas COPs”, afirma Mariana Belmont, assessora de clima e racismo ambiental de Geledés (Instituto da Mulher Negra).