Denúncia de racismo na UFBa

Carta enviada à redação da revista Carta Capital, relatando caso de racismo recente na UFBa.


Gostaria de parabenizar a revista Carta Capital pela matéria “A inclusão desmistificada”, publicada na edição 614, sobre a pesquisa da Uerj que comprova o sucesso da instituição das cotas raciais nas universidades públicas brasileiras. As declarações da magnífica reitora da Universidade Federal da Bahia, Dora Leal, me chamaram especial atenção, mas eu não pensei em enviar carta à redação até a manhã desta terça-feira, dia 30 de setembro.

Em sala de aula, o professor Luiz Filgueiras me interpelou por não prestar atenção à aula – lia matéria de Carta Capital. Afirmou que não entendia porque eu ia à aula e, ainda, que o mercado de trabalho para economia estava difícil. Como não dei atenção, o professor afirmou em tom categórico que “no mercado de trabalho não tem cotas”. Respondi indignado à sua afirmação, e seguiu um bate-boca que eu sequer lembro, apenas dele ter reafirmado sua frase infeliz.

A cena, que será alvo de mobilização do movimento estudantil e negro a partir ainda desta semana de reta final de eleições, me remeteu tempos depois à matéria da revista lida horas antes, no trajeto do ônibus até a universidade. A exemplo do caso do professor aposentado Antônio Natalino Manta Dantas, ex-coordenador do curso de Medicina desta mesma universidade, o professor Filgueiras expõe uma convivência conflituosa entre professores e alunos negros, pelo menos na Universidade Federal da Bahia. Não fui o primeiro a ser agredido por ele, e suas frases infelizes são conhecidas em todo o curso. Uma aluna evangélica, outra acima do peso e ainda um praticante da religião de matriz africana estão entre as vítimas de suas opiniões “heterodoxas”.

Como o professor é estudioso das relações raciais, costuma fugir do tema das suas aulas para atacar o sistema de cotas ou a luta pela reparação racial. O movimento negro, para ele, quer benesses e facilidades. Quando vê um aluno negro e – ainda mais – militante do movimento negro em sala, costuma provocar discussões sobre a pauta racial (discussões onde nós mal podemos falar, a não ser no grito como fiz na terça).

Acho que é grave um professor afirmar, para o seu aluno negro e cotista, que o mercado de trabalho para o qual ele está se preparando não tem cotas. Pretende afirmar, e ele confirmará isso se perguntado, que o sistema de cotas na universidade abre espaço para pessoas sem qualificação para ocupar aquela cadeira. E apontou para alguém que, segundo ele, está inserido nesse contexto.

A frase da reitora para a revista, que nega a existência de conflitos entre alunos brancos, esconde denúncias jamais apuradas pela UFBa de perseguição a alunos negros por instituições da universidade (como colegiados e departamentos) e agressões morais torpes como a que eu sofri na semana passada.

Sou militante do movimento negro e, quando diretor de combate ao racismo do DCE, ajudei a organizar o 1º Encontro de Negras e Negros da UFBa. Já o professor Filgueiras foi candidato a reitor desta universidade e um dos maiores quadros da esquerda universitária, tendo fechando seu ciclo defendendo a não-aprovação das cotas raciais na UFBa no Conselho Universitário em 2004. Sem sucesso, para sua eterna inconformidade.

Nilton Luz

Estudante negro e cotista do curso de Ciências Econômicas da UFBa

 

 

Fobnte: Lista Racial

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