Dia 08/08. Data que ficará marcada como uma das mais (se não a mais) triste do ano de 2020.
Oito de agosto. A gosto. Agora, desgosto. Uma tristeza infinda toma conta do coração de milhares de brasileiros.
08/08/2020. Data que morre Chica Xavier, mulher, atriz expoente da cultura negra, portanto, representante de um povo marginalizado desde o descobrimento do país. Artista que soube abraçar as poucas oportunidades que lhe couberam, relegando-se a papeis de menor visibilidade ou da base da pirâmide social. Personagens que, quando não era de empregada doméstica, era de escrava, na maioria das vezes.
08/08/2020. Data em que morre dom Pedro Casaldáliga. Homem simples e de estatura franzina, porém forte e corajoso para lutar contra as mazelas sociais e políticas consequentes do embate entre os poderosos latifundiários de São Felix do Araguaia que tinham representantes do Estado a seu favor, e o pobre povo ribeirinho, camponeses e indígenas, que só queriam o direito, já legalizado, de permanecer e viver de suas terras. Bispo que não se importou com a imagem que teria na hierarquia conservadora da Igreja, mas sempre se importou com o povo sem voz nem vez, falando por eles, sendo um deles. Aos 92 anos, ainda era resistência.
08/08/2020. Data em que se bate, oficialmente, 100.000 mortos pela COVID-19. Oficialmente porque pode ter outros milhares de mortos escondidos nas subnotificações. Num momento em que o país sequer tem um ministro da saúde, e mesmo que tivesse, pouco faria para minimizar este estado de caos, pois da forma que está é coerente com a necropolítica estabelecida pelo representante maior e seus asseclas.
08/08/2020. Data em que a Cinemateca Brasileira amanhece sem dono. Ontem, suas chaves foram devolvidas ao governo federal que, em sintonia com os discursos da cúpula, quer calar, para dizer o mínimo, quaisquer sinais de inteligência e cultura no país.
Chica Xavier choraria pela Cinemateca e pela forma como ela está abandonada há meses. Choraria também por seu povo negro e os números absurdos nas desigualdades e opressões que eles representam nos indicadores sociais, por exemplo, que 75,5% das pessoas mortas pela polícia brasileira são negras.
Pedro choraria pelos 100.000 mortos, como chorou pelos 23.000 indígenas contaminados e 645 mortos, além dos subnotificados. Chica e Pedro devem ter morrido em paz, convictos de que fizeram sua parte e deixaram um legado para seus povos. Chica e Pedro não devem ter se conhecido, e tinham quase nada em comum, mas sem dúvida, deixaram um país melhor do que eles encontraram, por pior que ele esteja.