Discutir branquitude: o calor que me dói

Na última segunda-feira participei de uma conversa que tinha como tema Feminismo Negro e Identidade: para além da transversalidade de gênero e raça. Com uma provocadora incrível (Profª Liana Lewis) e um filósofo mediando a mesa (Prº Sandro Soyão) a Ciranda Filosófica causou também um estranhamento à minha pessoa: depois de reconhecer seu privilégio e relatar seu cotidiano embaraçoso com os alunos da cadeira Relações Raciais da Universidade de Pernambuco, fiquei querendo saber porque a incrível professora doutora [sem ironia] não preferiu discutir feminismo branco ou branquitude. Quando indagada, ela categoricamente respondeu afirmando ser necessário um estudo relacional: não existe negro sem branco nem branco sem negro.

Mas a profusão de estudos e de debates sobre negritude e a escassez de debates sobre branquitude (embora isso tenha mudado com os estudos sobre whiteness nos EUA) nos faz pensar que os problemas e resquícios do colonialismo só são possíveis de ser enxergados quando todos olhamos para o negro, o “desvio”. Onde fica a discussão da norma?

“Quando pessoas brancas se voltam para o racismo, tendem a vê-lo como um problema de negros e não como um problema que envolve a todos. Assim, brancos podem ver o trabalho antirracista como um ato de compaixão pelo outro, um projeto esporádico, externo, opcional, pouco ligado às suas próprias vidas, e não como um sistema que modela suas experiências diárias e seu sentido de identidade.” (BENTO, 2002a: 49).

Recordado os acontecimentos na Marcha das Vadias de Brasília, uma das questões que foi debatida em grupos específicos foi a discussão da identidade racial branca, seus privilégios e da posição “involuntária” de opressor. Me pareceu muito clara a dificuldade em tratar esses assuntos quando tudo o que se sabe é que há um oprimido e todos precisamos defendê-lo e, sinto dizer que a Ciranda Filosófica me passou a mesma impressão [que não foi a única]. Não quero dizer com isso que pessoas brancas não possam falar de negritude, mas no meu mundo ideal a intensidade no debate sobre whiteness se daria só pelo fato de termos maioria branca nas academias e noutros lugares que nem preciso listar aqui.

De todos os pontos que identifiquei na discussão iniciada depois do episódio MdV Brasília e que foram intensificados depois da Ciranda, quero trazer para discussão aqui com vocês esses três pontos acima citados: a identidade racial branca (ou o branco racializado), o privilégio branco e o que eu chamei de “opressão involuntária”. Esses pontos serão tópicos para próximos posts que pretendem humildemente provocar discussões e elucidações.

Esperando contribuir para um mundo melhor [brinks], esta autora pergunta: você já tinha ouvido falar em branquitude?

Por:Larissa Santiago

Larissa é baiana e escreve no Mundovão e no Afrodelia.

Fonte: Blogueiras Negras

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