Diversidade cultural de Toulouse pode estar ameaçada após ataques

Cidade francesa com cultura moldada por diferentes ondas de imigração era conhecida por tolerância e aconchego antes de ações de atirador

Próxima tanto da fronteira espanhola quanto do Mediterrâneo, a cidade de Toulouse sempre foi conhecida como um lugar aconchegante e etnicamente diverso, longe das políticas divisórias de Paris. Em contraste com grande parte do sul da França, a extrema direita, com sua voraz postura anti-imigração, assim como os extremistas islâmicos, têm pouca presença nessa cidade.

Toulouse está longe de ser uma cidade onde não existe racismo, crimes antisemitas ou a profunda segregação social que marca muitas cidades francesas, mas com uma cultura moldada por sucessivas ondas de imigração, ela é descrita por seus habitantes como um local particularmente tolerante.

Centenas de milhares de espanhóis fugiram da ditadura de Franco para a França após a Guerra Civil Espanhola e muitos se estabeleceram em Toulouse. Esse também foi o caso dos franceses expulsos da Argélia em 1962, bem como dos harkis, argelinos que apoiaram os colonialistas franceses, e de milhares de judeus.

 

Além de uma série de universidades e centros de pesquisa, a gigante empresa de aeronaves Airbus tem sede em Toulouse, atraindo engenheiros e cientistas de todos os cantos do mundo.

Assim, enquanto muçulmanos de toda a França falam sobre sua possível vitimização no país, essa cidade tem sido poupada das tensões que cercam o islã. “É verdade que de vez em quando somos submetidos a discursos políticos de ódio”, disse Mohamed Tatai, o imã da mesquita El Nour, localizada em Empalot, um bairro pobre da cidade.

Normalmente esse tipo de pensamento vem de fora da cidade, embora muitas vezes seja algo que acontece em época de eleição. “Depois das eleições, nós voltamos a levar uma vida tranquila e sem problemas”, disse.

Luto

Muitos temem, no entanto, que Mohammed Merah possa ter mudado isso.

Os sete assassinatos brutais cometidos por ele – um morador da cidade de 23 anos e jihadista profissional – ocorreram durante uma disputada eleição presidencial que já havia voltado a questões da imigração e do islã.

Mesmo que os investigadores afirmem que Merah não passava de um solitário extremista, sua ideologia violenta se encaixa com alguns estereótipos que os franceses têm sobre o islã, e os muçulmanos da região temem que as tensões provocadas pelos assassinatos possam ser ainda mais duradouras.

“Tudo isso não corresponde em nada com o que Toulouse é”, disse o prefeito Pierre Cohen. “Mas nós acabamos de sair de um período muito tenso. Infelizmente, esse risco existe.”

Um falso rumor já se espalhou pela cidade, disse Cohen, sugerindo que os muçulmanos estavam organizando uma manifestação em defesa de Merah.

“Haverá um ‘antes’ e um ‘depois'”, disse Yassin Elmu’min, 23 anos, um jovem de olhos azuis e cabelo curto bem penteado. Normalmente, disse Elmu’min, existe um “diálogo saudável” entre as culturas em Toulouse e os muçulmanos são bem tratados.

Mas ele e outros muçulmanos, muitos dos quais vivem nos subúrbios pobres e longe do centro da cidade, disseram já ter começado a detectar olhares estranhos, algo que não é característicos do local.

“Alguém teve a coragem de me perguntar: ‘Você concorda com o que ele fez?'”, contou Elmu’min exasperado.

O presidente francês, Nicolas Sarkozy, apelou para a rejeição das “falsas impressões” sobre os muçulmanos na semana passada, depois que Merah foi morto por policiais. “As ‘falsas impressões’ já estão acontecendo”, lamentou Elmu’min.

Apesar dos apelos recentes de Sarkozy para a tolerância, muitos muçulmanos disseram que ele tem contribuído muito para estigmatizá-los, muitas vezes chamando a atenção para uma lei aprovada em 2010 que baniu o véu islâmico de ser utilizado e levou a um debate sobre “a identidade nacional.”

Eleição

Marine Le Pen, a candidata presidencial de extrema direita da Frente Nacional, foi feroz em sua resposta aos assassinatos. “O que aconteceu não é questão da loucura de um homem, o que aconteceu é o início da marcha do fascismo em nosso país”, afirmou Le Pen no domingo, referindo-se ao islamismo radical. “Quantos Merahs existem nos barcos, nos aviões que chegam na França diariamente, cheio de imigrantes?”

rrracismo

Os líderes muçulmanos denunciaram tais tentativas de explorar os assassinatos de uma maneira política. Em um comunicado logo após a morte de Merah, na semana de dia 12 de março, Mohammed Moussaoui, presidente do Conselho Francês para a Fé Muçulmana, pediu que o termo “islamismo” seja abandonado pois “alimenta a confusão entre o islã e o terrorismo e traz sofrimento para milhões de muçulmanos que consideram importante defender a dignidade de sua fé e sua religião.”

Tatai, liderou um projeto para construir uma grande mesquita em Toulouse. Há uma década as autoridades locais se opuseram, lembrou Tatai, mas gradualmente elas acabaram aceitando a ideia. A mesquita, que fica na fronteira do bairro Empalot, ao lado da rodovia, está praticamente concluída. (Estranhamente, ela será aberta ao público não-muçulmano, fora das horas de oração.)

“Claro que temos medo de que haja uma reação negativa devido à semana que acabamos de enfrentar “, disse Tatai. “Esse é um teste da boa vontade e sabedoria dos sábios.”

Ele continua otimista.

*Por Scott Sayare

 

 

 

 

 

Fonte: iG

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