por Reinaldo Bulgarelli
Empresa sustentável é aquela que trabalha para o desenvolvimento sustentável, ou seja, uma agenda ampla que visa melhorar o mundo ou até salvar a espécie humana da extinção. É uma nova utopia, como dizem alguns, impondo-se para além da tradicional polaridade entre esquerda e direita.
O diálogo, contudo, entre os sujeitos da sustentabilidade nem sempre é tranquilo. Nesta divisão grosso modo, superficial e até caricata dos que entendem sustentabilidade como meio ambiente e os que entendem sustentabilidade como direitos humanos, há visões de mundo, valores, prioridades e maneiras de agir sobre a realidade nem sempre coincidentes.
Desta forma, pessoas mais ligadas à questão ambiental toleram a defesa que Marina Silva fez do deputado pastor Marco Feliciano, dizendo ser ele um equivocado e vítima de perseguição religiosa. Seus partidários mais raivosos chamam de intriga da oposição, de perseguição política a crítica à sua fala de que Marco Feliciano é um equivocado ao invés de reconhecê-lo como homofóbico e racista. Não diz nada ao coração de alguns defensores de Marina sua postura meramente religiosa e nada estadista em relação aos direitos LGBT. Para estes, mais importante é garantir que a natureza seja preservada e ela é tida como a encarnação do desenvolvimento sustentável, como se esta agenda tão rica coubesse numa pessoa ou num partido político.
Por meio das polêmicas em torno do pastor político e da política religiosa, candidata à Presidência da República, é possível perceber com clareza a divisão dentro da comunidade dos que se dizem trabalhar pelo desenvolvimento sustentável. Se há essa insensibilidade para um tema ou outro, a hierarquia infundada que sobrepõe uma causa à outra, não há compromisso com o desenvolvimento sustentável. Ele exige uma visão mais integrada e ambos os grupos perdem a razão quando toleram o intolerável, seja a destruição de uma floresta ou o assassinato de homossexuais incentivado também por discursos religiosos fundamentalistas.
Será que Marina irá nos dividir? Eu entendo que está nos dividindo, mas já estávamos divididos antes dela e agora estamos vivenciando um retrocesso neste processo difícil de reunir visões e soluções para os desafios do mundo atual. Dentro de uma empresa, no movimento de sustentabilidade e responsabilidade social empresarial, na produção teórica e nas salas de aula que tratam de desenvolvimento sustentável, esta divisão entre os que pesam mais aspectos ambientais do que humanos tende a se aprofundar. As paixões na defesa de Marina ou no ataque a ela levam junto muito do que construímos até aqui de uma agenda integrada e ampla para o século XXI.
Tarefa de todos, no meu entender, é aproveitar esse momento de conflito para explicitar suas posições e partir urgentemente para o diálogo. A questão transcende candidaturas à Presidência da República, mesmo passando por elas. O que não se pode tolerar é a “sustentabilidade meio-boca”, gente que tolera o intolerável, tem estratégias incompatíveis com os princípios de construção de um mundo sustentável e diz ser o que não é. Pode-se dizer tudo de quem tolera a destruição do meio ambiente, o racismo e a homofobia, menos que seja um profissional da sustentabilidade. Vamos aproveitar esse momento de explicitação do conflito para construir um novo patamar nesta jornada ou vamos sucumbir nesta vala moralista e de visão estreita que nos leva para o passado?