por Renato Rovai
Inicio com este post uma série acerca de decisões do pleno ou de juízes do Supremo Tribunal Federal. Neste momento em que o julgamento da Ação Penal 470 está chegando ao final e o STF ganhou uma aura de novo bastião da moralidade e da ética entre os opinadores dos veículos tradicionais, vale a pena fazer um pequeno balanço histórico. Afinal, os ministros do Supremo meio que se tornaram super-heróis de toga, prontos para agir a favor da sociedade e do interesse público.
Porém, assim como Batman recebia seu chamado através de um feixe de luz nos céus de Gothan City, o STF parece seguir o feixe de luz da mídia tradicional e dos seus interesses. Quando este sinal não surge, os heróis de toga não são assim tão “justiceiros” quanto no atual episódio da Ação Penal 470.
Daniel Dantas
Daniel Dantas, ex-dono do banco Opportunity, era acusado de fraudes financeiras, envolvimento no próprio “mensalão”, tentativa de suborno de um delegado federal e participação em um esquema de espionagem de políticos, com o objetivo de realizar chantagens contra os mesmos.
No dia 8 de julho de 2008, o banqueiro foi preso juntamente com a sua irmã, Verônica Dantas, e outras 22 pessoas investigadas pela operação Satiagraha, da Polícia Federal.
No dia seguinte, o então presidente do STF, Gilmar Mendes (o mesmo que acusou Lula de fazer pressão pelo adiamento do julgamento do “mensalão”), decidiu pela soltura do banqueiro e da sua irmã, além de outros 9 presos na operação. Mendes considerou as prisões “desnecessárias”.
Mas o episódio não terminou assim. Um dia após ser liberado pelo presidente do STF, Dantas foi preso novamente. De acordo com investigações da Polícia Federal, teria tentado subornar um delegado para que seu nome fosse retirado das investigações. Um novo Habeas Corpus foi concedido pelo mesmo Gilmar Mendes e o banqueiro foi colocado em novamente em liberdade.
A prisão preventiva existe para que um réu não fuja ou atrapalhe as investigações. Segundo Gilmar Mendes, então presidente do STF, isso era desnecessário. Prender preventivamente um banqueiro, acusado de movimentar US$ 2 bilhões em um paraíso fiscal, envolvido em uma esquema de espionagem de políticos e que tentou subornar um delegado é desnecessário. Prender preventivamente um personagem acusado de tentativa de suborno e envolvimento com espionagem é desncessário. Ao mesmo tempo cassar os passaportes de todos os condenados na Ação Penal 470, mesmo quando o julgamento ainda permite recurso, foi fundamental.
Algo talvez explique a presunção de inocência de Dantas. Sua irmã, Verônica Dantas não tem só o nome em comum com a filha do tucano José Serra. De acordo com o livro Privataria Tucana, de Amaury Ribeiro Jr., as duas eram sócias em uma empresa localizada em Miami. E quem aplicava dinheiro nessa empresa eram os consórcios que lucraram com o processo de privatizações: o Banco Opportunity, de Daniel Dantas, e o Citibank.
Guarani-Kaiowá
O Mato Grosso do Sul é o estado com o maior número de assassinatos de indígenas, muitos deles ordenados por fazendeiros e executados por seus pistoleiros. É lá que a população indígena tenta há décadas a devolução das suas terras sagradas e tradicionais.
O nó fundiário e jurídico que envolve o território Arroio Koral, uma das terras tracionais dos índios no estado, parecia ter sido desatado pelo ex-presidente Lula, em 2009, quando ele assinou um decreto que homologou a demarcação das terras.
Porém, o STF, presidido à época pelo ministro Gilmar Mendes, suspendeu a validade do decreto para as fazendas Polegar, São Judas Tadeu, Porto Domingos e Potreiro-Corá. A decisão do Supremo motivou a Justiça Federal de Naviraí a decretar a expulsão definitiva da comunidade Guarani-Kaiowá das suas terras tradicionais.
O processo continua em andamento, porém a passos de tartaruga. Cansados de esperar, os Guarani-Kaiowa decidiram retomar parte das suas terras tradicionais. E por isso, hoje esses indígenas vivem sob constante ameaça de pistoleiros.
O assunto ganhou repercussão na mídia após uma carta dos Guarani-Kaiowa, direcionada ao governo e à justiça brasileira, ser divulgada. Na carta, eles reafirmam sua intenção de permanecer na sua terra tradicional e pedem a retirada de todos os fazendeiros que ocupam terras já demarcadas e a devolução de todas as terras tradicionais para os seus donos de fato, os índios. A carta ainda denúncia 4 mortes no território retomado pela tribo, duas por suicídio e dois assassinatos cometidos por pistoleiros.
Entre 2003 e 2010, foram registrados 555 suicídios entre os Guarani-Kaiowá, motivados pelo confinamento, falta de perspectiva, violência, expulsão das suas terras tradicionais e pela vida em acampamentos nas margens de estradas.
Nesses casos, a grande mídia e a pressão da “opinião pública” não foram tão eficientes para pressionar o STF na questão das terras indígenas, quanto foi no julgamento do chamado “mensalão”.
PS: Se você tiver sugestão de episódios para sugerir, eles serão bem-vindos.
Fonte: Revista Forum