Em 2025, beba água e não crie expectativa com a COP30

Foto: Montagem com foto de Marilia Ferrari

Há alguns dias do início de um novo ano, e o que posso te dizer é: não consigo descansar. Li, dormi, nadei, andei, mas olhei o e-mail quase todos os dias. É oficial, não sei descansar. Como faz? Senta na piscina e finge que lê sem pensar em nada? Mas poxa, há tanta coisa para fazer. Enfim, não sei descansar. Será que as notícias não deixam a gente descansar? Eu pensei. Talvez, afinal, morar no Brasil seja uma adrenalina diária de notícias inúteis e úteis do cenário político. Mas ainda assim, me sinto exausta. Mas ainda estou de férias, juro.

Ao mesmo tempo, me lembrei de um poema do meu mestre Sérgio Vaz, que diz: ‘Ser feliz não quer dizer que não devemos estar revoltados com as coisas injustas que estão ao nosso redor. Muito pelo contrário, ter uma causa verdadeira é uma alegria que poucos podem ter. Por isso, sorrir enquanto luta é uma forma de confundir os inimigos.’ Calma, isso não tem absolutamente nada a ver com o ‘como eu vou ser triste…’. Vaz é nosso poeta, mestre, referência de literatura periférica e nosso norte constante de lucidez e poesia. Vaz não é coach, que cria frases para agradar algoritmos da internet.

Prometi que o primeiro texto do ano  da coluna na Gênero e Número de 2025 seria um balanço. Comecei a escrever e pensar no balanço, e isso foi me dando uma ansiedade misturada com agonia ao ver a quantidade de trabalho feito e a quantidade de retrocessos na área ambiental. Então, vamos olhar para frente.

Se eu pudesse fazer uma lista de desejos, eu faria:

Tome água, galera. Acho que estou com pedra nos rins depois de duas conferências sobre biodiversidade e clima, sem tomar muita água. Andando quilômetros como um camelo, sem encher as duas garrafas de água da mochila. Bebam água.

Não trabalhem no limite de vocês. Não apertem a mente e o corpo; eles cobram caro ao longo dos anos e é uma tristeza se sentir doente constantemente e, mesmo assim, seguir apertando seu corpo para caber mais horas de trabalho. Seja generosa com você.

Não criem tantas expectativas com a COP30. Saímos de 2024 com quatro negociações multilaterais frustradas. Primeiro foi a COP16 de Biodiversidade, em Cali, na Colômbia, que terminou sem um documento por falta de quórum; os diplomatas não perderam seus voos para voltar para casa e esvaziaram a plenária final. Só lavamos roupa suja e seguimos com a mesma mala para a COP29 do Clima, em Baku, no Azerbaijão, que foi encerrada à força, com um acordo desrespeitoso sobre financiamento, deixando os países em desenvolvimento irados. No fim, a batata quente foi jogada no colo do Brasil para a COP30, ano que vem em Belém do Pará. Alguns pegaram o avião de Baku mesmo para a 5ª sessão do Comitê Intergovernamental de Negociação (INC-5), em Busan, na Coreia do Sul, que também fracassou em apresentar o tão esperado tratado global contra a poluição por plásticos. Fuen!

Já quase apagando as luzes, os menos cansados seguiram para a COP16 sobre o combate à desertificação, em Riad, na Arábia Saudita, a última esperança do ano. Mas a conferência terminou no sábado (14/12/24), um dia após o fim oficial, sem um acordo entre os negociadores.

Então, amigo, segura a expectativa da COP30. Eu faria uma lista aqui sobre participação social, pressão, o que devemos fazer, o que faremos; a lista de tarefas que temos a partir de 2 de janeiro é imensa, e já me gera ansiedade.

A COP30 vai ser importante? Ou será mais um espaço para o governo brasileiro reafirmar para fora algo que não está cumprindo dentro? A COP30 vai ser importante, sim, gente. Com um Congresso Nacional mais difícil a cada dia, querendo vender terreno nas praias, prejudicar comunidades pesqueiras, aprovando projetos de lei que retiram direitos e promovem retrocessos. Talvez, e talvez só talvez, a chegada de uma grande conferência internacional, com tantos países, seja um caminho para que dentro do país – na política doméstica, nos Estados e municípios – a coisa seja levada a sério. Isso tudo, supostamente. Que os gestores não usem a COP30 para marketing, mas para encarar de frente a crise climática, nossos desafios nos territórios e avançar com políticas de adaptação às mudanças climáticas, segurança climática, titulação de territórios quilombolas, demarcação de terras indígenas e proteção das pessoas. Que seja um impulso para pensarmos em mudanças climáticas e direitos humanos.

Bebam água. E dias melhores em 2025. 


Mariana Belmont – Jornalista e assessora de Clima e Racismo Ambiental de Geledés – Instituto da Mulher Negra, faz parte do conselho da Nuestra América Verde e da Rede por Adaptação Antirracista. E organizadora do livro “Racismo Ambiental e Emergências Climáticas no Brasil” (Oralituras, 2023).

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