Falta respeito e dignidade, por Siro Darlan

Visitamos os “educandários” do Estado situados na Ilha do Governador na última sexta feira. A comitiva organizada pela dedicada juíza Cristiana Cordeiro em mais uma visita institucional, como determina o CNJ, começou pela entrada do Sistema, o Centro Sócio Educativo Gerson Carvalho Amaral. Pena não poder exibir as fotografias do local por proibição legal em razão das imagens dos adolescentes recolhidos. Só aqueles que estiveram nos campos de concentração podem ter uma ideia daquele espaço, porta de entrada do Inferno para onde são jogados os adolescentes fluminenses.

Por Siro Darlan Do Racismo Ambiental

Estavam em situação de tortura permanente 193 jovens onde a capacidade é para 64. Muitos estão apreendidos ilegalmente, porque segundo os funcionários dedicados e coagidos pela situação degradante, não chegam com as necessárias guias de execução de internação provisória, exigência da lei, que nem os policiais, nem os juízes estão cumprindo. Esclareça-se que é crime tipificado no artigo 230 do ECA a apreensão de forma irregular. Diante da superlotação alguns ficam aguardando as necessárias Guias por mais de 40 dias, ou seja, permanecem todo esse tempo apreendidos ilegalmente. Quem responde por esse abuso de autoridade? Ninguém.

Encontramos um jovem com um tiro de fuzil deitado na cela fétida e suja, por onde grassam baratas e ratos, além da falta d água e de sabonete. Escova e pasta dentária é artigo de luxo. Os educadores sociais, contra a vontade, viram carcereiros e torturadores impunemente, uma vez que a responsabilidade é do Secretário de Educação, que nunca visitou seus “educandários”, e muito menos o Governador do Estado, que por ser o mais longevo dirigente de um estado da federação, está no Governo desde Garotinho, Rosinha, Sergio Cabral, há mais de 16 anos, e também ignora esse campo de tortura da Ilha do Governador.

Passamos para o antigo Padre Severino, agora rebatizado e promovido a Dom Bosco, mas com a mesma vestimenta de lobo com pele de cordeiro, apenas no nome. A superlotação em nada difere da anterior 375 para uma capacidade de 216. Tem alguns itens positivos: uma piscina destinada exclusivamente aos mosquitos da dengue que são parceiros dos “educadores” nos maus tratos aos jovens em conflito consigo mesmo e com a lei; um campo de futebol que logo que chegamos foi ocupado por alegres meninos que descobriram na bola a alegria de serem crianças.

No mais, são celas muito piores que a dos adultos, embora a lei imponha que cabe ao Estado “oferecer instalações físicas em condições adequadas de habitabilidade, higiene, salubridade e segurança e os objetos necessários à higiene pessoal;” e a Constituição da República proíba que: “Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes.  Toda pessoa privada da liberdade deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano”.

Finalmente, visitamos 50 meninas no Educandário Antônio Carlos Gomes da Costa, que parece honrar o nome desse ilustre educador mineiro que nos deixou um grande legado e mostra que é possível cumprir a lei investindo na recuperação dessas jovens. Em outro ambiente alegre e divertido, vivem 50 jovens onde a capacidade é para 44, mas todas em atividades culturais e educativas. Uma delas, cumprindo medida há quase dois anos, está apta para fazer o vestibular. Outra, grávida de sete meses, será a grande homenageada pelas colegas no próximo Dia das Mães. Aqui está o caminho da ressocialização: com respeito e dignidade apostando na cidadania plena para recuperar a Paz Social.

*Siro Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e Coordenador Rio da Associação Juízes para democracia.

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