Filha de pastor é primeira transexual a usar nome social em escola do Vale

Aluna de 17 anos trocou o nome de Israel para Thifany em Jacareí (SP).
Resolução permite a transexuais e travestis a ‘mudança’ de nome.

Por Nicole Melhado Do G1

Ele nasceu Israel, mas escolheu ser Thifany. O novo nome é pronunciado na chamada da escola e também consta na carteirinha estudantil. Filha de pastor evangélico, a transexual de 17 anos mora em Jacareí, e é a primeira aluna a usar o nome social em uma escola da rede estadual no Vale do Paraíba. Em todo Estado, são apenas 44 casos como o dela.

O direito de transexuais e travestis de ser chamado pelo nome social no âmbito escolar foi conquistado por meio de uma resolução estadual de 2014. No caso de adolescentes, como Thifany, é necessária autorização dos pais.

Para ela, mais que um direito, a possibilidade de ‘trocar de nome’ é uma forma de vencer as barreiras do preconceito. “Tive que vencer muitos preconceitos durante a minha vida escolar, passei por muitas coisas, inclusive já fui ameaçada. Nessa escola fui bem recebida, me sinto aceita pelo que eu sou e tenho já muitos amigos”, afirmou a jovem que usa cabelos longos e não descuida do visual.

O primeiro desafio de Thifany para adotar o nome social foi convencer o pai a autorizar a mudança. Apesar de ter convicções pessoais diferentes, o pastor acatou o pedido do filho. Ele confessa que enfrentou críticas por sua postura, mas acredita que agiu corretamente. “Meu filho estava irredutível. Não queria mais estudar. Só sorriu quando fomos fazer a matrícula e eu autorizei a mudança de nome”, recordou o pastor Rubem Borges

fernanda

Por conta do trabalho de evangelização do pai, a jovem, que é baiana, já mudou de cidade e também de escola muitas vezes. Para a transexual, cada mudança era um novo desafio para ser aceita entre os novos colegas.

Antes do início das aulas de Thifany, em Jacareí, a diretoria de ensino promoveu uma ação pontual de dois dias sobre a diversidade de gêneros na escola onde ela foi matriculada. “Além dos alunos, a orientação foi feita com professores, gestores e funcionários. O preconceito é justamente a falta de conhecimento. Não pode haver qualquer discriminação no âmbito escolar”, explicou a orientadora pedagógica Fernanda Rezende.

Em todas atividades escolares, a resolução estadual garante que o transgênero seja chamada pelo nome social. A medida só não abrage documentos como diploma, declarações e histórico escolar – neste caso, o nome de registro é mantido.

Abrangente
Uma resolução da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, publicada neste mês de março, é ainda mais abrangente e permite que estudantes transgêneros possam escolher se querem usar o banheiro masculino ou feminino e o tipo de uniforme escolar de acordo com a sua identidade de gênero.

O aluno pode ainda ter o nome social com o qual se identifica inserido em todos os processos administrativos da vida escolar, como matrícula, boletins, registro de frequência, provas e até em concursos públicos.

A resolução não tem força de lei, mas é uma recomendação para que as instituições de educação adotem práticas para respeitar os direitos de estudantes transgêneros.

No meu trabalho, tiro pessoas da rua. Como poderia colocar meu filho para fora de casa?”

A pedagoga que fez o trabalho de integração de Thifany na escola em Jacareí disse que o tratamento adequado dado ao grupo na escola é importante para reduzir a evasão escolar, já que muitos travestis e transexuais deixam de estudar por contada discriminação. Além disso, segundo ela, o abandono da família leva muitos às ruas, ao consumo de drogas e à prostituição. “Sozinhas nas ruas, sem estudos, para algumas a prostituição é a única forma de sobrevivência”, disse.

Thifany conhece pessoas que vivem essa realidade e disse ser uma pessoa feliz pelos preconceitos vencidos, pela a amizade dos colegas e amor da família. “Meu pai nunca ameaçou me mandar embora de casa, eu sei que ele não gosta [da minha opção sexual], mas me aceita”, afirmou.

Para o pastor Rubens, o amor pelo filho sempre falou mais alto. “No meu trabalho tiro pessoas da rua, como poderia colocar meu meu filho para fora de casa? Ele é uma pessoa boa, carinhosa e estudiosa, agora ele quer fazer um estágio e vamos conseguir isso também”, disse o pai.

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