Na última sexta-feira, os pequenos foram recebidos com suco de maracujá, lápis e borrachas estilizados, e mensagens de incentivo antes de realizarem o teste de Ciências
No início do ano letivo, a professora Gabriella Freire, de 22 anos, já chegou à Escola Municipal Vereador Paulo Barenco, em Magé, na Baixada Fluminense, com notícias pouco animadoras: a turma do 1º ano do Ensino Fundamental para a qual lecionaria era conhecida por não apresentar bons resultados. Dos 19 alunos, dez haviam repetido a série — e alguns até mais de uma vez.
Logo depois das primeiras provas, no fim de março, os alertas se provaram verdadeiros. Na prova de ciências, a nota mais alta da turma foi três — de um total de cinco — e, logo no início do ano, ela precisou aplicar um teste de recuperação. Mas, conforme foi conhecendo seus alunos, Gabriella percebeu que o motivo para o mau desempenho não era pela incapacidade de aprender e, sim, pelo nervosismo antes das provas, desencadeado pelas cobranças rígidas dos pais:
— Um aluno já ficou tão nervoso antes de uma avaliação que chegou a vomitar, argumentando que o pai bateria nele se não melhorasse as notas. O problema é que os responsáveis não aceitam mais um resultado negativo, então assustam os filhos prometendo punições.
E este não foi o único desabafo duro que a estudante de Pedagogia ouviu das crianças, com idades de sete aos nove anos.
— Enquanto eu explicava a matéria para um estudante, ele disse: “não precisa ficar comigo aqui. A tia do ano passado me explicou e eu não entendi, então eu sei que sou burro” — conta com pesar.
A partir daquele momento, Gabriella buscou inspirações na internet e mudou a abordagem antes das provas. Na última sexta-feira (28), os pequenos foram recebidos com suco de maracujá, lápis e borrachas estilizados, uma sala decorada com balões coloridos e mensagens de incentivo coladas nas mesas e paredes antes de realizarem o teste de Ciências.
— Eles acharam que não teria mais prova e, sim, uma festa (risos). Depois, expliquei que a prova aconteceria, sim, mas antes teríamos uma longa conversa para eles se acalmarem. Eles pularam, riram e me abraçaram. São muito carinhosos. Eles saíram de lá pulando de alegria por terem ido bem na prova e contando aos pais os benefícios do maracujá (risos).
Ao todo, a docente gastou quase R$ 20 nas bolas, no enfeite dos lápis, nos copos descartáveis e no suco. Inicialmente, o plano era oferecer balas de gelatina ou chocolate aos estudantes, porém o preço a obrigou a seguir outro caminho.
— Meu salário é de R$ 1.232, e eu ainda banco minha própria passagem, que sai por R$ 160 mensalmente. Eu queria dar algo melhor para eles, mas ficou apertado no fim do mês — lamenta.
Os pequenos, entretanto, não pareceram incomodados com a simplicidade. Ela conta que, na sexta-feira, quando entraram na salade aula, eles ficaram chocados com a decoração e as palavras de apoio da professora.
— Eles acharam que teríamos uma festa ao invés da prova. Mas li as mensagens e mostrei o suco, explicando como o maracujá os deixaria calmos — conta a professora, que também trabalhou a confiança da turma com lápis decorados com estrelas douradas: — A história do lápis foi para eles acreditarem em mágica e se sentirem mais confiantes. Houve um aluno, até, que me confessou não estar acreditando muito na história, mas no fim da prova ele saiu tão satisfeito que passou a acreditar (risos).
O resultado positivo da ação de Gabriella foi imediato: seis alunos gabaritaram o teste, também de Ciências, enquanto os outros obtiveram notas acima da média. Na próxima segunda-feira, quando haverá a prova de Matemática, a educadora garante que já preparou outra surpresa:
— Acho que se eu aparecer de mãos vazias eles vão reclamar (risos).
Desde que compartilhou a história das redes sociais, Gabriella vem recebendo elogios de várias partes do Brasil. Na página da Secretaria de Educação de Magé, a ação da educadora virou destaque.
A ação da professora, que viralizou nas redes sociais, inspirou outros profissionais. Desde sexta-feira, outros profissionais pediram os textos para usarem com seus próprios alunos:
— Eu ajudo, é claro. Só nós sabemos da luta diária que é educar. Se eu acordo todos os dias às 5h40 da madrugada, não é pelo salário e, sim, pelos meus alunos. Um professor engole salários baixos, escolas em condições precárias e outros problemas por amor — reforça a estudante, que faz ainda uma reflexão sobre o método de avaliação nas escolas: — Apesar de achar a prova um método válido, não acredito que ela seja o mais importante. Eu falo para meus alunos: “é só um papel.”