O termo “geledé” (pronuncia-se “gueledé”) pode soar estranho aos ouvidos, mas está por aí desde os primeiros momentos da humanidade. A Geledé foi um tipo de sociedade exclusivamente feminina das comunidades iorubá, responsável pelos rituais com máscaras guerreiras para celebrar as grandes mães e as forças femininas poderosas da fé iorubana.
No Brasil, Geledés foi o nome escolhido para o Instituto da Mulher Negra, fundado em 30 de abril de 1988, e hoje a maior e mais importante entidade dedicada às mulheres negras no país.
“O foco primordial da atuação do Geledés é dar visibilidade às mulheres negras como um grupo social que merece prioridade no âmbito do compromisso com a democracia e a equidade”, diz presidenta da instituição, Maria Sylvia Oliveira. O instituto mantém projetos nas áreas da educação, saúde e direito, além de manter um portal de notícias voltado aos assuntos da população negra.
Às vésperas de completar 30 anos de existência, a entidade se prepara para um mês de atividades em São Paulo no SESC Vila Mariana. A programação, que pode ser acessada aqui, homenageia a luta de três décadas das mulheres negras que ousaram e ousam desafiar o racismo estrutural em um dos países mais racistas do mundo.
Leia, a seguir, a entrevista completa com Maria Sylvia Oliveira, presidenta da Geledés:
Brasil de Fato: Conte-nos um pouco sobre o que é o Geledés e qual foi o acúmulo politico obtido nesses 30 anos?
Maria Sylvia: O Instituto da Mulher Negra surgiu durante o processo da constituinte e nessas três décadas participamos das principais ações contra o racismo e sexismo no país. A nossa missão institucional mais importante é a valorização e promoção das mulheres negras porque todos os dados oficiais informam que as mulheres negras são as que sofrem de forma desproporcional a todos os tipos de violência e violações dos direitos humanos.
Quais foram os principais projetos que o Geledés desenvolveu ao longo desses 30 anos e em quais projetos a entidade está envolvida neste momento?
Durante esses 30 anos, desenvolvemos uma série de projetos. Um deles foi o S.O.S Racismo, que foi criado em 1992. O S.O.S Racismo foi pensado para que pudéssemos levar para o judiciário e verificar a eficácia da lei que criminaliza as práticas de discriminação na sociedade brasileira [Lei 7.716/1989]. Naquele momento queríamos denunciar que não vivíamos numa democracia racial. Nós tivemos também o Projeto Rappers que trabalha com os jovens da periferia incentivando e apoiando as manifestações culturais dos jovens negros nas décadas de 80 e 90. O Geledés também desenvolve o curso de Promotoras Legais Populares que é uma capacitação que damos em direito humanos e direito das mulheres, focando na violência contra a mulher e no enfrentamento à violência doméstica. Nós temos também um projeto voltado para a educação que visa para além da aplicação da Lei 10639/2003 [que versa sobre o ensino da história e cultura africanas e afrobrasileiras na educação] é pensar a educação como um direito humano. Nós também temos atuação forte na Corte Interamericana de Direitos Humanos.
O que significa essa comemoração de 30 anos?
Eu tenho muito orgulho de hoje estar na presidência do Geledés. Assim como outras pessoas, recebi o impacto do Geledés na minha formação. Se eu sou a mulher negra que sou hoje devo ao Geledés. Eu vou falar em vários lugares e as pessoas vem me procurar para falar que a primeira coisa que fazem de manhã é abrir o portal do Geledés para se formar e se informar sobre o que é o racismo sistêmico, estrutural que a gente vive no país.