Geledés repudia oposição da União Europeia, Reino Unido e Austrália ao reconhecimento de Afrodescendentes nas negociações do Plano de Ação de Gênero na COP30

18/11/25

Se nos discursos os países europeus — e seus aliados históricos, como Reino Unido e Austrália — são sempre os primeiros a defender igualdade de gênero, direitos humanos e justiça climática, a realidade das negociações na UNFCCC revela outra face profundamente contraditória. Na COP30, União Europeia, Reino Unido e Austrália estão se opondo explicitamente à inclusão de menções à população afrodescendente no Plano de Ação de Gênero, atuando para silenciar e deslegitimar demandas legítimas e historicamente fundamentadas.

A população afrodescendente representa aproximadamente 200 milhões de pessoas no mundo, segundo o Grupo de Trabalho de Especialistas em Afrodescendentes da ONU. Descendentes das vítimas do tráfico transatlântico de escravizados — e também do tráfico pelo Mediterrâneo, que inclui o comércio de povos africanos subsaarianos — essas populações foram forçadas à diáspora nas Américas e no Caribe. O Brasil abriga a maior população afrodescendente fora do continente africano: mais de 56% da população se identifica como negra, segundo o IBGE (2022), totalizando mais de 120 milhões de pessoas.

Não é a primeira vez que o bloco europeu adota tal postura. Na COP16 de Biodiversidade, em Cali, a União Europeia — acompanhada silenciosamente por esses mesmos aliados — tentou impedir a inclusão de afrodescendentes no texto final. Recuou apenas após denúncia pública de governos e sociedade civil, que classificaram a manobra como colonialista e regressiva. Agora, na agenda de gênero da UNFCCC, o padrão se repete: bloqueio, apagamento e recusa em reconhecer populações afrodescendentes, sob a alegação de que não se trata de uma demanda coletiva.

Para Geledés – Instituto da Mulher Negra, “mais uma vez a população afrodescendente está sendo rifada como moeda de troca em negociações internacionais”. A organização denuncia que o trecho que garantiria reconhecimento e participação plena dessa população — já acordado e em estágio avançado — foi travado pela recusa da União Europeia, do Reino Unido e da Austrália em permitir sua inclusão.

“Em mais um capítulo colonizador, esses países estão barrando a possibilidade de garantir direitos e reconhecimento a uma população historicamente inviabilizada”, afirma a entidade.

Fica a pergunta inevitável: por que União Europeia, Reino Unido e Austrália — tão vocais sobre direitos humanos e justiça climática — se recusam justamente a reconhecer aqueles que mais sofrem com o racismo ambiental, a desigualdade de gênero e os impactos diretos da crise climática?

A resistência desses países revela muito mais que uma posição técnica: expõe a permanência de uma lógica colonial que ainda estrutura as relações internacionais. E mostra, mais uma vez, que justiça de gênero sem justiça racial é apenas retórica — retórica que continua beneficiando os mesmos países que lucram com a crise climática enquanto negam reconhecimento às populações afrodescendentes.

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