Hotel de Copacabana é condenado a indenizar hóspede vítima de racismo

Mulher foi a única num grupo de quatro pessoas a ser abordada pelo recepcionista na portaria para se identificar

Luiz Orlando Carneiro no Jota 

Imagem Geledés

O Novotel Rio Copacabana, no Rio de Janeiro, foi condenado a pagar indenização de R$ 19.080,00, por danos morais, a uma hóspede vítima de “tratamento discriminatório” em função da cor da pele. A sentença foi proferida, nesta terça-feira (11/12), pela juíza substituta do 4º Juizado Especial Cível de Brasília, Simone Garcia Pena.

De acordo com os autos da ação, a autora hospedou-se no Novotel Rio fevereiro último, juntamente com o marido – um espanhol que reside no Brasil há mais de seis anos. Ao retornarem ao hotel, ao fim de um passeio pela cidade, depois da meia-noite, ela foi a única num grupo de quatro pessoas a ser abordada pelo recepcionista na portaria.

A condição de identificação a ela imposta para subir ao quarto foi mantida, mesmo depois de o marido ter informado que estavam juntos e que já haviam feito check in. Depois do ocorrido e da liberação do acesso, a autora subiu ao quarto e, muito abalada, ligou para familiares dando conta da situação racista pela qual passou.

Na defesa, o Novotel argumentou que a autora não apresentou prova de que teria sido constrangida; que estava apenas exercendo seu direito de consultar o cadastro da hóspede – medida de segurança adotada pelo hotel, até por se tratar de semana pré-carnaval; e que não restou caracterizado dano moral, não havendo, portanto, motivo para retratação.

Decisão

Ao decidir, a juíza Simone Garcia Pena consignou: “Analisando o mais que dos autos consta, tenho que o pedido autoral merece prosperar eis que a dignidade humana (artigo 1º, III da Constituição Federal), o objetivo constitucional da República Federativa do Brasil de promover o bem comum, sem preconceito de raça e quaisquer outras formas de discriminação (artigo 3º, IV da Constituição Federal), o postulado da igualdade (artigo 5º, caput da Constituição Federal), a proibição de tratamento degradante (artigo 5º, inciso III da Constituição Federal), a inviolabilidade da honra e da imagem (artigo 5º, inciso X da Constituição Federal), direitos estes fundamentais de envergadura Constitucional, bem como o postulado da reparação objetiva ao consumidor lesado, previsto no sistema protetivo do Código de Defesa do Consumidor (artigo 14), albergam o direito da autora de ser moralmente compensada pela degradante situação a que foi exposta no estabelecimento hoteleiro ré.

Incontroverso que a autora foi a única do grupo chamada a se identificar na recepção, sendo que, se o motivo realmente fosse a segurança alegada, “o mais lógico e respeitoso seria a abordagem das quatro pessoas que adentraram juntas no local, afinal, qualquer uma delas poderia representar perigo”.

A juíza concluiu: “Caracterizada a diminuição de pessoa humana em razão da cor da pele, em evidente menoscabo ao postulado da dignidade humana e da igualdade. É preciso que essa prática institucional abjeta e repugnante seja extirpada das medidas de governança corporativa, sendo dever do prestador de serviços implementar treinamento sério e contínuo de seus colaboradores, bem como de condutas ativas, com vistas a rechaçar qualquer tipo de preconceito em seu ambiente institucional”.

+ sobre o tema

O pardo e o mal-estar do racismo brasileiro

Toda e qualquer tentativa de simplificar o racismo é um tiro...

Quem ganha ao separar pessoas pretas e pardas?

Na África do Sul, o regime do apartheid criou a...

Justiça manda soltar PM que matou marceneiro negro com tiro na cabeça na Zona Sul de SP

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) concedeu nesta quarta-feira...

Promotor é investigado por falar em júri que réu negro merecia “chibatadas”

Um promotor de Justiça do Rio Grande do Sul é...

para lembrar

O pardo e o mal-estar do racismo brasileiro

Toda e qualquer tentativa de simplificar o racismo é um tiro...

Quem ganha ao separar pessoas pretas e pardas?

Na África do Sul, o regime do apartheid criou a...

Justiça manda soltar PM que matou marceneiro negro com tiro na cabeça na Zona Sul de SP

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) concedeu nesta quarta-feira...

Promotor é investigado por falar em júri que réu negro merecia “chibatadas”

Um promotor de Justiça do Rio Grande do Sul é...
spot_imgspot_img

O pardo e o mal-estar do racismo brasileiro

Toda e qualquer tentativa de simplificar o racismo é um tiro no pé. Ou melhor: é uma carga redobrada de combustível para fazer a máquina do racismo funcionar....

Quem ganha ao separar pessoas pretas e pardas?

Na África do Sul, o regime do apartheid criou a categoria racial coloured, mestiços que não eram nem brancos nem negros. Na prática, não tinham...

Justiça manda soltar PM que matou marceneiro negro com tiro na cabeça na Zona Sul de SP

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) concedeu nesta quarta-feira (27) habeas corpus ao policial militar Fábio Anderson Pereira de Almeida, réu por assassinato de Guilherme Dias...