No Itaquerão, a “elite branca” xingou. Mas quem a treinou tão bem? Por Leonardo Sakamoto

Não ia tocar no assunto dos xingamentos recebidos por Dilma, pois já me sentia contemplado por outros colegas que fizeram a reflexão. Como disse Juca Kfouri, uma coisa é vaiar, o que pode ser democrático, outra é a intolerância, a ignorância e a falta de educação de parte da “elite branca” presente no Itaquerão para a abertura da Copa. Isso sem contar o machismo.

Mas uma coisa passou um pouco batida.

Aquele ato bizarro, que seria bizarro seja quem estivesse na Presidência, Dilma, Serra ou Marina, não brota do nada. Pelo contrário, foi construído ao longo do tempo.

Todo colega jornalista (ou aquele que não se vê como tal, mas assume um papel de interpretar a sociedade), que ajudou a inflar monstros ao longo dos anos ou se omitiu diante disso tem uma parcela de culpa no show de horrores e de vergonha alheia. Agora, muitos tratam de tirar o seu da reta, mas o estrago já foi feito e os trolls, devidamente alimentados por eles, correm livres por aí.

A crítica contundente e firme, que questione a competência, a gestão e o cumprimento de promessas, é fundamental para a sociedade. Contudo, aquela que usa de formas virulentas para promover ataques pessoais e, ao mesmo tempo, coloque em dúvida a legitimidade do processo democrático vai armando uma bomba de efeito retardado. O drama é que muita gente não consegue diferenciar uma da outra.

Não somos nós, jornalistas, que vamos a público cometer agressões. Da mesma forma que não é a mão de pastores ou deputados fundamentalistas que seguram a faca, o revólver ou a lâmpada fluorescente que atacam gays e lésbicas. Mas somos nós que, muitas vezes, na busca por audiência ou para encaixar um fato em nossa visão de mundo, tornamos a agressão banal. Mandamos a polícia para cima de manifestantes. Justificamos linchamentos. Exigimos “invasões preventivas” em países vizinhos.

Nesse momento, a agressão passa a ser um ato lógico, quase uma necessidade para restabelecer a ordem das coisas. Na cabeça da “elite branca” (para usar a famosa expressão do ex-governador de São Paulo Claudio Lembo), presente no estádio, o xingamento era uma ação cívica.

Não tenho esperança que conseguiremos em 2014 fomentar um debate crítico sobre a nossa sociedade. Aliás, estou torcendo para que o ano passe logo. Pois o Brasil virou arquibancada em momento de briga de torcida organizada, sustentada por gente que não se importa se o futebol é bonito ou feio. Quer mesmo é ver o circo pegar fogo.

 

 

 

Fonte: Blog do Sakamoto

+ sobre o tema

Deputados vão à Cracolândia, mas não descem do ônibus

Vinte e um deputados federais desembarcaram...

Multilateralismo e ações afirmativas

 - EDSON SANTOS - Folha de São Paulo -Tendências...

Risco Lula trava proposta de antecipação de eleições presidenciais

"PEC das eleições não passa pelo simples fato de...

Caso Palocci não afetou imagem positiva do governo, diz pesquisa

A queda do ministro Antonio Palocci em pouco ou...

para lembrar

“Minha empregada é muito abusada”

O recalque da perda da posse por parte da...

Inclusão do negro para uma elite com a cara do Brasil

Fonte: Blog Mírian Leitão - Quem acompanha o meu trabalho...

A elite brasileira é burra

Massacre de professores no Paraná é apenas mais um...

Caso Miguel: Sari Corte-Real é condenada a 8 anos e seis meses de prisão

Sari Corte-Real foi condenada a oito anos e seis meses de prisão por abandono de incapaz com resultado morte pelo óbito de Miguel Otávio de...

Abolição da escravidão em 1888 foi votada pela elite evitando a reforma agrária, diz historiador

Em 13 de maio de 1888, há 130 anos, o Senado do Império do Brasil aprovava uma das leis mais importantes da história brasileira,...

“Estamos assistindo a uma espécie de revanche das elites”

O dominicano Xavier Plassat, um dos líderes da luta contra o trabalho escravo na Comissão Pastoral da Terra, fala sobre o governo Temer Por Leneide Duarte-Plon...
-+=