“Já quis ser mais clara”, diz jovem negra da Brasilândia vencedora do Miss Odara CCJ

Quando pensamos em concurso de miss, automaticamente nos vem à cabeça imagens dos padrões exigidos pela indústria da moda: mulheres magras, altas, brancas e heterossexuais. Negra, lésbica e periférica, Camila da Cruz Carvalho, 19, nascida na Brasilândia, na zona norte, é prova do quanto esses padrões estão ultrapassados. No fim de julho, a jovem foi coroada como a primeira Miss Odara CCJ, concurso promovido pelo Centro Cultural da Juventude, na Vila Nova Cachoeirinha.

Por Leticia Marques e Paloma Vasconcelos, do Blog Folha 

“Depois desse concurso renasceu uma nova Camila. Ele me ajudou a levantar minha autoestima, que estava baixa. Antes eu queria ser mais clara por causa desses padrões, mas agora não quero mais, pois eu sou ganhadora e é isso que importa”, conta a jovem, que sofre com problemas de depressão e transtorno de ansiedade.

“Por conta dos meus problemas, eu não tinha metas nem planos. Agora com a bolsa de estudos, valeu muito a pena participar. Quero fazer algo ligado às artes, e tenho certeza que esse é o meu lugar”, afirma Camila, que ganhou como prêmio uma bolsa de estudos de parcial em qualquer curso da Faculdade Campos Sales (uma parceria com a ONG Mensageiros do Amanhã com o CCJ), um ano de agenciamento numa agência de modelos, formação em passarela e teatro e um book impresso e um digital.

Camila com a mãe e a namorada, após vencer o concurso Miss Odara CCJ (Paloma Vasconcelos/Folhapress)

“Fiquei sem palavras e muito feliz. O modo de ela interagir com as pessoas vai mudar. Ela é muito fechada e isso vai ajudá-la bastante”, afirma Jessica Alves, 19, namorada de Camila, que apoiou e acompanhou a jovem, acompanhada da sogra Gicélia da Cruz, 47. “Estou muito feliz que ela ganhou”, sintetiza a matriarca.

Para Natasha Moura, uma das avaliadoras do concurso, a presença de negras nas passarelas ainda é restrita, uma das razões pelo seu afastamento. “Eu fui modelo e dificilmente via negras no mundo da moda, por isso me afastei das passarelas. Acho incrível essa oportunidade do negro poder crescer, principalmente no universo da moda. Esse é um ótimo projeto”, diz a jurada, também youtuber.

Outra participante da banca de jurados, Larissa França, moradora da Brasilândia que já realizou desfiles internacionais, festeja o empoderamento das jovens no concurso. “Eu tô achando essas meninas maravilhosas, tão empoderadas, batendo no peito e dizendo: ‘Eu sou negra, sou de quebrada e eu posso’. É lindo demais”, afirma a modelo. “Meu recado para elas é que nunca desistam. Mesmo que uma porta se feche, outras irão se abrir”, completa.

“A gente já passou por coisas muito difíceis e desde lá de trás tentamos mudar essa cena. Essas meninas são os nossos frutos. Tô muito feliz de estar cantando para elas”, comenta a cantora Céllia Nascimento, que lançou o EP “Que Nega Soul” durante o concurso. O evento ocorreu no dia 30 de julho e fez parte da programação do CCJ em homenagem ao Dia Internacional da Mulher Negra Latina Americana e Caribenha, comemorado no dia 25 de julho.

 

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