Joel Zito de Araújo

Joelzito Almeida de Araújo (Nanuque, Minas Gerais, 1954). Diretor, roteirista, escritor e pesquisador. É tido como um dos responsáveis pela implantação do chamado cinema negro, tanto na ficção quanto no documentário, com filmes que debatem o racismo e a desigualdade entre negros e brancos. O tema também se encontra em suas pesquisas universitárias, particularmente, na presença dos afrodescendentes no audiovisual.

Forma-se em psicologia na Fundação Mineira de Educação e Cultura (Fumec) e faz mestrado em Sociologia da Educação na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Entretanto, é como bancário, nos anos 1980, que Araújo se aproxima da militância. Exibe filmes em bairros populares e trabalha nos setores de educação e TV de entidades sindicais, antes de se dedicar à sua produção.

Em 1988, vira sócio da produtora Tapiri Cinema e Vídeo. Temáticas referentes às desigualdades raciais ocupam sua carreira cinematográfica, desde o primeiro curta, Memórias de Classe (1989), sobre negros no movimento operário paulista. A obra ganha o prêmio de “Melhor Roteiro” no Festival Ford/Anpocs.
Curtas e médias do início de sua cinematografia, como Alma Negra da Cidade (1990), São Paulo Abraça Mandela (1991) e Retrato em Preto e Branco (1992), discutem o negro como agente ativo da cultura brasileira. Também questionam aspectos do senso comum, como a pretensa “democracia racial”.

Uma de suas produções mais conhecidas, o documentário A Negação do Brasil (2000), é fruto da tese de doutorado na Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), defendida em 1999, assim como um livro de mesmo nome lançado no ano seguinte. No documentário, o diretor analisa a representação da população negra nas telenovelas entre 1963 e 1997. Mostra que, quase sempre, personagens afrodescendentes contam com papéis subalternos e secundários. Para comentar, são convidadas as atrizes Ruth de Souza (1921), Léa Garcia (1933), Zezé Motta (1944) e Maria Ceiça (1965), assim como o ator Milton Gonçalves (1934). Os artistas narram experiências profissionais, em primeira pessoa, sobre a violência do racismo. O filme ganha o prêmio de “Melhor Documentário” no Festival É Tudo Verdade. Ainda na produção acadêmica, entre 2001 e 2002, realiza pós-doutorado na Universidade do Texas, em Austin, Estados Unidos, e escreve artigos em publicações especializadas, com ênfase na representatividade dos negros.

Em 2004, estreia o seu primeiro longa ficcional, o drama Filhas do Vento, retratando a relação entre irmãs negras no interior de Minas Gerais. No filme, duas irmãs se reencontram depois de 45 anos separadas por um mal-entendido. O enredo se passa ao redor das mágoas de uma família e de seus reencontros e permite reflexão e denúncia do racismo e do preconceito de gênero existente na formação da identidade negra no país. O filme ganha prêmios no Festival de Gramado como os de “Melhor Diretor”, “Melhor Atriz” e “Melhor Atriz Coadjuvante” para Léa Garcia e Ruth de Souza. Além da temática racial, este e outros títulos revelam o comprometimento do diretor com a causa das mulheres, grupo social que, ao lado dos negros, é menosprezado numa sociedade racista e machista. Não à toa, suas obras costumam exibir o protagonismo de mulheres negras: o autor se compromete com o resgate de sua origem e autoestima racial, inspirado na trajetória da própria mãe, Dona Rozita. O média-metragem Almerinda, uma Mulher de Trinta (1989), focado em Almerinda Farias Gama (1899-1992), uma das primeiras negras na política do país, ganha o prêmio de “Melhor Documentário” no Festival Guarnicê de Cinema.

Obras posteriores indicam uma ampliação do foco de Joel para além do Brasil. Em Cinderelas, Lobos e um Príncipe Encantado (2008), o diretor conta o sonho de mulheres pobres de ir viver na Europa, que acabam vítimas da exploração sexual. Em 2010, organiza o livro O Negro na TV Pública, lançado pela Fundação Cultural Palmares. Durante pesquisas na América do Norte, ainda no doutorado, cria rede de contatos com fundações como Ford, McArthur e Kellogg, que financiam parte de seus filmes. O cineasta norte-americano Spike Lee (1957), professor na Universidade de Nova York, costuma ter a trajetória comparada à sua, dadas as afinidades temáticas das obras e o relevo nos circuitos das instituições de ensino superior.

Em 2012, lança Raça, codirigido com a cineasta norte-americana Megan Mylan (1969), que expõe a luta por políticas afirmativas. Já o longa Meu Amigo Fela (2019) retraça aspectos da vida do músico nigeriano Fela Kuti (1938-1997). Para a produção, Joel Zito viaja à Nigéria e conversa com o biógrafo e amigo pessoal do músico. Ainda em aproximação com o continente africano, o diretor ajuda a criar curso de pós-graduação em cinema no Mindelo, Cabo Verde. No Canal Brasil, dirige o programa Espelho, apresentado pelo ator Lázaro Ramos (1978). Ainda na TV, é curador da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC).

Empenhado intelectual e artisticamente na compreensão e denúncia do racismo na sociedade brasileira, Joel Zito se destaca por  meio de uma produção cinematográfica e universitária, paralela a atuação militante que, há décadas, põe em pauta a desigualdade racial no país e dá voz para quem vive o racismo.

Outras informaçõesde Joel Zito de Araújo:

  • Habilidades
    • diretor de cinema

Midias (1)

 

Joel Zito de Araújo – Série Encontra – Arte 1 (2019)
Joel Zito de Araújo, é entrevistado em sua casa, afastada da região metropolitana do Rio de Janeiro. Ele fala sobre a experiência no cinema, as dificuldades de financiamento e as reflexões sobre colonialismo, racismo e a questão de classe, implícita em sua trajetória pessoal e profissional. Gisele Kato também o convida a refletir sobre as filhas e a família, a paixão pela culinária indiana, as parcerias e os amigos.

A Enciclopédia Itaú Cultural apresenta a série Encontra, produzida pelo canal Arte 1. Em um bate-papo com Gisele Kato, o público é convidado a entrar nas casas e ateliês dos artistas, conhecendo um pouco mais sobre os bastidores de suas produções.

Créditos
Presidente: Milú Villela
Diretor-superintendente: Eduardo Saron
Superintendente administrativo: Sérgio Miyazaki
Núcleo de Enciclopédia
Gerente: Tânia Rodrigues
Coordenação: Glaucy Tudda
Núcleo de Audiovisual e Literatura
Gerente: Claudiney Ferreira
Coordenação: Kety Nassar
Arte 1
Direção: Gisele Kato/ Ricardo Sêco
Produção: Yuri Teixeira
Edição: Patrícia Sato

Foto em destaque: Reprodução/ EBC

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