Lavagem marca um ano do Cais do Valongo como Patrimônio da Humanidade

Para celebrar o primeiro aniversário do título de Patrimônio Cultural da Humanidade concedido ao Cais do Valongo pelo Comitê do Patrimônio Mundial, ligado à Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco), uma lavagem simbólica com água de cheiro foi feita hoje (9) no local por ativistas do movimento negro e seguidores de religiões de matriz africana, ao som dos atabaques e xequerês do Afoxé Filhos de Gandhi.

Da IstoÉ

O Brasil recebeu cerca de 4 milhões de escravos nos mais de três séculos de duração do regime escravagista, o que equivale a 40% de todos os africanos que chegaram vivos nas Américas, entre os séculos 16 e 19. Desses, aproximadamente 60% entraram pelo Rio de Janeiro, sendo que cerca de 1 milhão deles pelo cais.

A ialorixá Edelzuita de Oxalá, representante do Instituto Nacional e Órgão Supremo Sacerdotal da Tradição e Cultura Afrobrasileira, destaca que o ritual da água simboliza a purificação das, como chamou, primeiras religiões do mundo. “Orixá é natureza, a natureza já estava aí antes de qualquer coisa. Representam os quatro elementos básicos: a terra, a água, o ar e o fogo. A lavagem é uma purificação dos afrodescendentes que ainda estão nesse país. É importante para o cais não cair no anonimato e preservar a memória do povo negro”.

A secretária municipal de Cultura do Rio de Janeiro, Nilcemar Nogueira, destaca que a prefeitura tem trabalhado para valorizar todas as tradições culturais da cidade, independentemente da matriz de origem. “A cidade deve celebrar todos os seus marcos históricos, toda a sua história, principalmente as histórias desconhecidas da população. A ancestralidade do povo negro, a formação da cultura brasileira tem que ser conhecida. A matriz africana é a que precisa ser fortemente trabalhada, uma vez que ela é desconhecida, principalmente por estar fora da historiografia oficial”.

Lavagem do Cais do Valongo, por religiosos de matriz africana, marca um ano da concessão do título de Patrimônio Mundial Cultural da Unesco ao sítio arqueológico – Tomaz Silva/Agência Brasil

Troca do dia

O antropólogo Milton Guran, que coordenou o grupo de trabalho que elaborou o dossiê de candidatura do Valongo como patrimônio mundial, explica que a lei municipal que instituiu a lavagem determina que a cerimônia seja feita no primeiro sábado de julho, mas que a transferência para um dia de semana esvaziou o ato, que costuma reunir centenas de pessoas em uma festa popular que dura cerca de 5 horas.

“A lavagem do cais é esse momento ecumênico em que todos se reúnem para reverenciar a memória dos que aqui pereceram e se unir em uma prece para que todos possam se integrar e que daqui para frente a vida seja melhor para todos. Foi esse o espírito da lei. Mas estamos assistindo nessa administração municipal o esvaziamento persistente de tudo o que diz respeito à matriz africana na cidade. Assim, a cerimônia foi transferida para uma segunda-feira de manhã, quando todo mundo está trabalhando”.

Segundo a secretária de Cultura, a transferência do dia este ano foi feita a pedido da ialorixá Edelzuita de Oxalá, responsável pela cerimônia, para coincidir com a data do registro como Patrimônio Cultural da Humanidade. Mãe Edelzuita confirma que pediu para transferir o dia e informa que no sábado (14) haverá uma missa campal no Cais do Valongo em homenagem aos ancestrais.

Museu

Após a lavagem, os ativistas fizeram um ato no Centro Cultural da Organização Não Governamental Ação da Cidadania, que fica em frente ao Cais do Valongo, para reforçar o pedido de que o local abrigue um museu de memória do povo negro.

E organizações da sociedade civil argumentam que o complexo está abandonado e corre risco de perder o título concedido pela Unesco.

 

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