Lei de cotas garante o ingresso de 638 negros no serviço público em um ano

Legislação que garante 20% das vagas nos concursos públicos para negros completa um ano neste 9 de junho

Enviado para o Portal Geledés da Seppir

O monitoramento feito em editais de concursos públicos desde o início da vigência da Lei n° 12.990/2014 mostrou que 638 pretos e pardos tiveram o ingresso no serviço público garantido através das cotas.

A legislação, em vigor desde 9 de junho de 2014, prevê a reserva de 20% das vagas em concursos públicos federais para pessoas que se autodeclarem pretas ou pardas, utilizando a mesma metodologia do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

A Secretaria de Promoção de Políticas da Igualdade Racial (Seppir), responsável pelo monitoramento da aplicabilidade da lei, analisou 26 editais entre o período de setembro de 2014 a abril de 2015. Ao todo, o governo federal ofertou 4.177 vagas. Destas, 638 foram para pretos e pardos. O número corresponde a 15,3% do total de vagas, abaixo, portanto, do que a legislação prevê.

Segundo o secretário de políticas afirmativas da Seppir, Ronaldo Barros, o número é mais baixo devido ao quantitativo de vagas disponível nas diversas profissões. A lei se aplica somente em casos onde o número de vagas para cada formação é superior a três.

Por exemplo, em um concurso onde são ofertadas duas vagas para administrador, duas vagas para advogado e três vagas para contador, a lei se aplica somente no caso das oportunidades para contador, já que nos outros casos o número de vagas é insuficiente para garantir a reserva de cotas.

Como consequência dessas situações, o percentual global é inferior aos 20% estabelecidos pela lei, já que em muitos editais são ofertadas uma ou duas vagas para a maioria das profissões.

Um recorte feito com as universidades e institutos federais aponta que é preciso encontrar meios para melhor aplicar o espírito da lei nestes processos seletivos, já que das 1.143 vagas oferecidas por universidades federais e institutos, somente 88 dizem respeito as vagas reservadas para as cotas, ou 7,7%.

Segundo Ronaldo, a secretaria trabalha para que a divisão das áreas ocorra em sub-áreas de conhecimento, de acordo com os critérios da plataforma Lattes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

“Muitos editais de concursos para universidades especificam demais os cargos, e acabam tendo vários cargos com apenas uma vaga, impossibilitando a aplicabilidade da lei. Trabalhamos no sentido de dividir as vagas em sub-áreas de conhecimento, mais amplas, desta forma atingindo o objetivo da reserva de 20% das vagas totais”, explica o gestor.

Para se ter uma ideia do impacto das instituições de ensino nessa realidade, se considerarmos apenas os demais editais, o percentual de vagas efetivamente reservadas é de 18,1% do total (550 vagas para as cotas de um universo de 3.034).

Histórico de desigualdades

A lei de cotas no serviço público surgiu após inúmeros estudos feitos dentro do serviço público comprovando que há uma discrepância entre o percentual de negros e pardos no serviço público federal comparado a população geral do país.

Hoje, segundo dados do IBGE, 53% da população brasileira (106,7 milhões) se autodeclara negra. Dentro do serviço público, de acordo com dados do Sistema Integrado de Administração de Recursos humanos (Siape), apenas 32,3% dos servidores pesquisados são pretos ou pardos.

Em algumas carreiras, como diplomacia (5,9%) ou auditor fiscal (12,3%), a presença de negros é ainda menor. As distorções são evidentes em cargos que exigem curso superior, e também no preenchimento de cargos de confiança.

A quantidade de brancos ocupando cargos com nível superior é três vezes maior a de pretos e pardos. Nos cargos comissionados, apenas 27% são pretos ou pardos.

A intenção das cotas é corrigir estas desigualdades para que o serviço público reflita de maneira fiel a distribuição da população brasileira.

Ajustes na política

Com o objetivo de acompanhar o cumprimento da lei, o governo federal trabalha na construção de uma portaria interministerial que criará a comissão de acompanhamento, monitoramento e avaliação da Lei nº 12.990. Além do acompanhamento, a comissão irá emitir orientações que julgar pertinentes para aprimoramento da mesma.

O documento será assinado ainda neste mês pela Seppir, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Casa Civil, Secretaria Geral da Presidência da República e Advocacia Geral da União. A comissão será composta por representantes do governo e da sociedade civil organizada.

+ sobre o tema

Bahia terá rede de combate ao racismo

  A Secretaria de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi) lança...

O amigo de Nova York

Ele não conhecia a situação do Brasil e, claro,...

Racismo sem querer

Tirinhas ácidas sobre o racismo do Quadrinhos Ácidos! por Pedro Leite   Pedro Leite é...

para lembrar

Movimentos denunciam Brasil na ONU por “racismo estrutural”

O Brasil é denunciado ao Comitê pela Eliminação da...

Harvard cancelou a aprovação de pelo menos 10 alunos após postagens obscenas e racistas

Uma das mais prestigiadas universidades do mundo, Harvard cancelou...

Moradores acusam PM de executar adolescente de 16 anos no Panorama em Taboão da Serra

Por Sandra Pereira    Um adolescente de 16 anos foi assassinado...

‘Sabia que existia a violência policial, mas nunca tinha sentido na pele’

Dois estudantes, que foram presos e agredidos por policiais...
spot_imgspot_img

Shopping Higienópolis registrou ao menos 5 casos de racismo em 7 anos

O shopping denunciado por uma família após uma abordagem racista contra adolescentes já registrou ao menos outros quatro casos semelhantes nos últimos sete anos. O...

Pretos e pardos têm menos acesso à infraestrutura urbana que brancos

Pessoas pretas e pardas residem menos em endereços com características adequadas de infraestrutura urbana, quando comparadas à população branca. Esse retrato da desigualdade étnico-racial no...

E mulheres trans não são pessoas?

No mesmo dia, os EUA e o Reino Unido —dois países ocidentais que se colocam como bastiões da liberdade, muito embora até ontem metade...
-+=