Leonardo Sakamoto: Massacre no Carandiru e seus cúmplices

Gostaria de lamentar que a alma do coronel Ubiratan Guimarães, que comandou (no chão) o massacre de 111 presos na Casa de Detenção do Carandiru, em 2 de outubro de 1992, tenha sido ceifada cedo demais.

Por Leonardo Sakamoto

Morreu em 2006, segundo a polícia, pelo gatilho de sua própria namorada, cujo julgamento está marcado para novembro deste ano. Estava a caminho de ser facilmente reeleito como deputado estadual, ironizando o país ao candidatar-se com o número 14.111.

Ele chegou a ser condenado, em 2001, a 632 anos de prisão pela responsabilidade direta em 102 mortes. Cinco anos depois, o Tribunal de Justiça de São Paulo aceitou um recurso e o absolveu, gerando protestos dentro e fora do Brasil.

Creio que todos os que lutam para que os direitos humanos não sejam um monte de palavras bonitas emolduradas em uma declaração sexagenária, filha de outras cartas centenárias, não se sentiram contemplados com o passamento de Ubiratan, da mesma forma que não sentiram que a Justiça se fez com a morte de pessoas como Erasmo Dias ou de Augusto Pinochet. Lamento porque tinha a esperança de que ele fosse julgado e punido.

Do meu ponto de vista, Justiça divina não existe. O universo não conspira a favor ou contra nada. Por isso, desejo tanto que nossa Justiça funcione. E que, no mínimo, a sociedade consiga saldar as contas com seu passado, revelando-o, discutindo-o, entendendo-o. Para evitar que ele aconteça de novo.

Em janeiro do ano que vem, mais de 70 policiais militares acusados pelo massacre começam a ir a júri popular após uma série de recursos serem negados. Seus advogados dizem que cumpriam ordens.

A defesa de Ubiratan também afirmou que ele estaria agindo no “estrito cumprimento do dever” quando ordenou a invasão do Pavilhão 9 da Casa de Detenção.

Seus chefes, Pedro Franco de Campos e Luiz Antônio Fleury Filho, então secretário de Segurança Pública e governador do Estado de São Paulo, não são réus no caso. Mas se fossem, poderiam alegar o mesmo: “estrito cumprimento do dever”.

Pois, afinal de contas, o que ocorreu naquele 2 de outubro de 1992 foi um servicinho sujo que parte de nós, paulistas, desejava (e ainda deseja) em seus sonhos mais íntimos: que bandido bom seja bandido morto.

Muita gente tem orgasmos múltiplos ao ler sobre execuções, sejam feitas pelas mãos da população, sejam pelas do próprio poder público, ao caçar traficantes na periferia da capital, enfiar uma bala na nuca de quem não respeitou o direito à propriedade ou entrar atirando em presídios. Para contrapor os bandidos e garantir uma inalcançável “pax paulistana”, optamos pelo terrorismo de Estado.

Vamos ser sinceros. Não é que a nossa sociedade não conseguiu apontar e condenar os culpados. Ela simplesmente não quis. Porque não suportaria um espelho no banco dos réus.

 

 

Fonte: Vermelho 

+ sobre o tema

Obama afirma que reanimar a economia é sua tarefa mais urgente

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, considera que...

Tribunais são enviesados contra mulheres e negros e não fazem justiça, diz advogada da OAB

Os Tribunais de Justiça são enviesados e, por isso,...

O tal “panelaço” tem cara, grife, cor e endereço, nobre, diga-se de passagem

O tal "panelaço", importado da Argentina, de que  grande...

O silêncio da mídia diante da denúncia de golpe do fotógrafo brasileiro ganhador do Pulitzer

Dez dias atrás, o fotógrafo Mauricio Lima foi festejado pelos grandes meios...

para lembrar

Escravidão e discriminação

Por Margareth Menezes     Neste momento, em...

Presidente Lula anuncia investimento em catadores de materiais recicláveis

Fonte: G1- Trabalhadores terão carros elétricos para coleta de...

Geração Z: antes mentíamos aos pais para sair, agora mentem aos amigos para ficar em casa

Saídas para bares, festas e encontros mudam de acordo...

Lula para Gaviões: ‘esta é uma das maiores homenagens que recebo em toda minha vida’

Presidente Lula, internado no Hospital Sírio Libanês, grava uma...

Fim da saída temporária apenas favorece facções

Relatado por Flávio Bolsonaro (PL-RJ), o Senado Federal aprovou projeto de lei que põe fim à saída temporária de presos em datas comemorativas. O líder do governo na Casa, Jaques Wagner (PT-BA),...

Morre o político Luiz Alberto, sem ver o PT priorizar o combate ao racismo

Morreu na manhã desta quarta (13) o ex-deputado federal Luiz Alberto (PT-BA), 70. Ele teve um infarto. Passou mal na madrugada e chegou a ser...

Equidade só na rampa

Quando o secretário-executivo do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Cappelli, perguntou "quem indica o procurador-geral da República? (...) O povo, através do seu...
-+=