Mãe Carmen, ialorixá do Terreiro do Gantois, morre aos 98 anos em Salvador

26/12/25
Filha mais nova de Mãe Menininha, ialorixá estava internada há duas semanas no Hospital Português, em Salvador, por causa de uma forte gripe. Ela completaria 99 anos na segunda-feira (29).

Morreu na madrugada desta sexta-feira (26), Mãe Carmen, ialorixá à frente há mais de 20 anos do Ilé Ìyá Omi Àṣẹ Ìyámase, conhecido popularmente como Terreiro do Gantois, e fundado em 1849.

Filha mais nova de Mãe Menininha, a ialorixá estava internada há duas semanas no Hospital Português, em Salvador, por causa de uma forte gripe. Ela nasceu em 1926, mas só foi registrada dois anos depois. Na segunda-feira (29), completaria 99 anos.

Mãe Carmen é a quinta religiosa à frente do Terreiro. Ela foi iniciada no candomblé aos 7 anos de idade e comanda o Gantois desde 2002.

A ialorixá foi homenageada com a música “A Força do Gantois”, composta pelo sambista Nelson Rufino, lançada em agosto de 2011.

O velório de Mãe Carmen acontecerá nesta sexta-feira (26), às 11h30, no Terreiro de Gountois. Já o sepultamento dela está marcado para 11h30 de sábado (27), no Cemitério Jardim da Saudade, na capital baiana.

Espiritualidade, cultura e ancestralidade

Nascida em 1926, Carmen Oliveira da Silva, conhecida como Mãe Carmen de Oxaguian é a filha mais nova de maria escolástica de Conceição Nazaré, mais conhecida como a Mãe Menininha, que também foi ialorixá do Terreiro do Gantois, um dos mais antigos e importantes para a religião.

Há 23 anos, Mãe Carmen tinha a responsabilidade de ser a guardiã de um dos pilares da espiritualidade, cultura e ancestralidade negra do Brasil e no mundo.

Ela foi iniciada no candomblé aos 7 anos de idade e comanda o Gantois desde 2002.

Mãe Carmen, ao centro, após receber a Comenda Maria Quitéria, em Salvador Terreiro Gantois — Foto: Valdemiro Lopes/Câmara de Vereadores de Salvador

Em maio de 2023, a iaolorixá recebeu a comenda Maria Quitéria, uma honraria concedida a mulheres que se destacam em atividades em benefício de Salvador ou da Bahia.

Além da parte religiosa, a Mãe Carmen promovia ações sócio-educativas junto à comunidade do Gantois.

Na parte cultural, ela empreendeu ações voltadas para acessibilidade às referências da memória da religiosidade de matriz africana na Bahia, com cursos de ritmos e toques, dança, bordados tradicionais, entre outros.

Por causa do trabalho para preservação das tradições do diálogo inter-religioso, Mãe Carmen também recebeu a “Medalha dos 5 continentes ou da diversidade cultural”, comenda entregue pela Unesco, em maio de 2010.

Veja abaixo a nota do Terreiro de Gountois

“É com profundo pesar, respeito e reverência que a Associação de São Jorge Ebé Oxóssi comunica a passagem da Ìyáloriṣa do Ìlé Ìyá Omi Àṣe Ìyámaṣé, Mãe Carmen de Òṣàgyían.

Ìyáloriṣa, mulher de axé, guardiã da ancestralidade e herdeira de uma linhagem que pavimentou a história do Candomblé na Bahia e no Brasil.

Filha direta de Mãe Menininha do Gantois, Mãe Carmen nasceu para o sagrado. Desde muito cedo, foi formada nos fundamentos, nos ritos e nos saberes que sustenta uma nação. Sua infância foi preparação espiritual; sua vida, missão. Nada em seu caminho foi acaso, foi legado, destino, desígnio dos Orixás.

Há 23 anos à frente do Gantois, Mãe Carmen assumiu com amor, coragem e responsabilidade a condução de uma Casa que é fé, memória e identidade. Ser Ìyáloriṣa em sua presença, sempre significou cuidar, proteger, orientar e sustentar o axé com dignidade, firmeza e sabedoria, zelando pela comunidade e pela continuidade de uma tradição ancestral.

Mãe Carmen foi farol, colo, caminho e fortaleza. Sua palavra ensinava, seu silêncio acolhia, e seu fazer cotidiano era atravessado pela entrega, pelo respeito aos Orixás e pelo compromisso com a vida coletiva. Em seu corpo e em sua condução, a herança de Mãe Menininha permaneceu viva, pulsante e afirmada dia após dia.

Como Ìyáloriṣa desempenhou com dedicação e firmeza o cuidado cotidiano do axé, contando com o apoio de suas duas filhas, que estiveram ao seu lado na condução da roça, compartilhando responsabilidades, saberes e a sustentação da Casa. Mãe Carmen deixa ainda três netos e quatro bisnetos, expressão viva da continuidade, da memória e do futuro que segue sendo tecido a partir de sua presença e de seu legado.

Seu retorno ao Orun acontece em uma sexta-feira, dia consagrado a Oxalá, Orixá da criação e da serenidade, um símbolo que traduz uma trajetória marcada pela retidão, cuidado e fé. Em Oxalá, o descanso, na ancestralidade, a permanência.

Hoje, nos despedimos de sua presença física, mas afirmamos com convicção: seu axé permanece. Seus ensinamentos seguem vivos, sua missão continua inscrita na história e sua memória permanece como fonte de força, amor e sabedoria para as gerações que virão.

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