A Marcha das Mulheres contra Trump se tornou ‘indispensável’ nos EUA

Norte-americanas vão marchar novamente em oposição ao governo de Donald Trump em 2018.

BRYAN WOOLSTON / REUTERS

21 de janeiro, um ano depois.

Nesta mesma data, em 2017, milhares de mulheres tomaram as mesmas avenidas de Washington D.C que Donald Trump não conseguiu preencher no dia de sua posse como o 45º presidente dos Estados Unidos. Segundo os organizadores, à época, mais de três milhões de pessoas marcharam por todo o país para mostrar a insatisfação com a agenda ultraconservadora do novo presidente e como uma nasty woman (mulher desagradável, em tradução livre) realmente se parece.

E o ano que passou não foi fácil para as mulheres norte-americanas.

Trump, que professou aos quatro ventos “grab them by the Pussy” (“Agarre-as pela buceta”) e foi alvo de denúncias de assédio durante as eleições, indicou apenas três mulheres para cargos oficiais e logo no terceiro dia de governo limitou auxílio financeiro a ONGs estrangeiras que realizam abortos. E 2018 não começa diferente: “Como vocês sabem, Roe versus Wade resultou em uma das legislações mais permissivas sobre aborto em qualquer lugar do mundo”, disse o presidente em discurso na “March of Life”, marcha de grupos antiaborto, nesta semana.

Ao mesmo tempo, 2017 trouxe a primeira marcha das mulheres contra Trump que contagiou o movimento feminista ao redor do mundo e o início do movimento #MeToo em Hollywood que, a partir da mobilização contra o produtor Harvey Weinstein gerou uma onda de denúncias de assédio sexual não só no mundo do entretenimento. Desde então, segundo a Vox, as organizadoras da marcha original adotaram uma abordagem ampla, produzindo eventos em parceria foco em justiça racial, deficiência e direitos LGBTQ.

Em outubro do ano passado, as organizadoras Tamika Mallory, Linda Sarsour, Carmen Perez e Bob Bland, juntamente com outros, planejaram uma convenção em Detroit, e que mais de 4.000 pessoas participaram de paineis sobre candidatura de mulheres a cargos políticos, enfrentamento do racismo e puderam ouvir mulheres como Tarana Burke, criadora do movimento #MeToo e a congressista Maxine Waters.

O artigo da Vox ainda destaca que, um ano depois, as vozes das manifestantes ganharam espaço – elas estão desde as unidades de registro de eleitores, em conversas sobre assédio sexual e em campanhas para mobilizar mulheres para cargos políticos. “E essas vozes, em conjunto, são uma força potente na política que é feita na era Trump”, constata.

Este “movimento que se transformou em uma força de oposição política” planeja tomar as ruas novamente neste fim de semana. Segundo a organização Women’s March, dezenas de mulheres se preparam para marchar durante os dias 20 e 21, desta vez, com foco em Las Vegas (Nevada) e estimular protestos simultâneos em mais de 300 cidades do país. Até o momento, mais de 80 mil pessoas estão confirmadas no evento.

A escolha de Las Vegas é simbólica.

Entitulado “Women’s March Anniversary: Power to the Polls” (Poder para as pesquisas, em tradução livre), o evento quer mobilizar Nevada, já que, segundo o site oficial da marcha, “é um estado crucial para as eleições legislativas norte-americanas” que acontecem em 2018 e porque, recentemente, “foi atingida pelo maior ataque a tiros da História dos Estados Unidos”.

REUTERS/Lucy Nicholson

 

Em outubro do ano passado, pelo menos 59 pessoas morreram e mais de 500 ficaram feridas após um homem atirar do 32º andar do Mandalay Bay, um famoso cassino e resort da cidade, contra uma multidão em um festival de música.

“A manifestação do ano passado foi sobre mulheres dando suporte umas às outras e percebendo que não estão sozinhas”, disse ao The New York Times, Katherine Siemionko, fundadora da Women’s March Alliance, que organizou a marcha em Nova York no ano passado. “A mensagem deste ano é voltada para ação”.

O evento não é só uma marcha. Voltado para a ação concreta, as organizadoras têm a intenção de mobilizar o registro de eleitores em todo o país. “No Alabama, as mulheres negras registraram como sempre fazem”, disse Linda Sarsour, co-presidente da Women’s March, em comunicado oficial.

A ideia também é envolver mais mulheres na política norte-americana. No dia 21, o evento contará com a participação de Cecile Richards, presidente da Planned Parenthood, John Lewis, representante do governo e Alicia Garza, co-fundadora do movimento Black Lives Matter.

“Todos nós devemos nos comprometer a combater o sistema que impede a possibilidade do voto. Esta campanha mobilizará um novo grupo de ativistas para criar poder acessível para pesquisas de intenção de voto no país”, disse Sarsour. Nos Estados Unidos, diferente do Brasil, o voto não é obrigatório.

JONATHAN ERNST / REUTERS

Ano passado, a marcha saiu do Lincoln Memorial, monumento próximo ao Capitólio, prédio que abriga o Congresso norte-americano, com destino à Casa Branca. Pelo mundo, as mulheres se reuniram na Inglaterra, Espanha, Itália, França, República Checa, Alemanha, Irlanda, Grécia, Suécia, Dinamarca, Finlândia, Kosovo, Sérvia, Gana, Quênia Índia, Chile, Brasil e outros países. Os atos foram organizados por mais de 150 organizações independentes.

Ao lado de celebridades como Madonna e Alicia Keys, que fizeram shows durante a marcha, as manifestantes pediram respeito às mulheres americanas, recursos para planejamento familiar e fazem a defesa de que as mulheres decidam sobre questões como o aborto como. “Meu corpo, minha escolha. Meu voto minha voz”, dizia um dos cartazes.

Além das celebridades, grandes nomes do ativismo pelos direitos das mulheres como Angela Davis, 72 anos, e Gloria Steinem, 83, fizeram discursos durante o protesto. Davis fez um apelo apaixonado pela resistência e pediu ao público que se tornem militantes em suas demandas de justiça social, especialmente nos próximos quatro anos.

“Esta é uma Marcha das Mulheres e ela representa a promessa de um feminismo contra o pernicioso poder da violência do Estado. E um feminismo inclusivo e interseccional que convoca todos nós a resistência contra o racismo, a islamofobia, ao anti-semitismo, a misoginia e a exploração capitalista”.

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Durante a marcha, a ativista Gloria Steinem fez um discurso que, assim como o de Angela Davis, lembrou os participantes da marcha da importância de não ignorar a história dos Estados Unidos e em como ignorar este contexto histórico pode ser preocupante para o futuro dos direitos civis:

“Tudo o que aconteceu antes dele foi um desastre. E tudo o que ele faria seria fantástico, o melhor de sempre, milagres e todos os superlativos. Ele também disse que estava com o povo. Na verdade, ele era o povo. Parafraseando uma citação famosa, eu apenas tenho que dizer, “eu conheci as pessoas, e você não são eles.” Nós somos as pessoas.”

E Gloria também criticou o discurso de posse de Donald Trump, em que o presidente falou em união nacional:

“Não tente nos dividir. Se forçar os muçulmanos a se registrar, todos nós nos registaremos como muçulmanos. […] E há mulheres aqui, eu sei, que sobreviveram a uma indústria sexista nacional e global. Estamos unidos aqui pela integridade corporal. Você não pode controlar suas vidas, nossas vidas. E isso significa que o direito de decidir se e quando dar à luz sem interferência do governo.”

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