Mulheres negras felizes e sorrindo: é esse o Brasil que eu quero

Quem acompanha os textos que escrevo aqui na coluna já percebeu que a pauta da representatividade é dos temas que mais abordo. Especialmente porque é dos temas que me é mais caro e, como já mencionei outras vezes, precisamos nos ver nos espaços de prestígio e poder justamente para que saibamos que esses espaços também são nossos e também nos pertencem. 

Também costumo escrever com frequência [vocês podem até pesquisar ou reler outros artigos já publicados] sobre a importância de valorizarmos as nossas conquistas, sobre a importância de não sermos tão duras conosco, sobre a importância de buscarmos os nossos sonhos.

Devemos combater o racismo? Lógico, sempre, continuamente. Mas devemos, também, cuidar de nós, cuidar das nossas e dos nossos, fazer aquilo que nos faz bem. Enquanto lutamos, e a luta é árdua e permanente, não devemos esquecer da gente. Cuidar da saúde, a do corpo e a da mente, também deve estar entre as nossas prioridades.

Conceição Evaristo já nos ensinou, como também já repeti em outros textos, que “para a mulher negra, escrever é um ato político”.  No mesmo sentido, também sabemos que o autocuidado da mulher negra também é um ato político, um ato revolucionário.

Vivemos em uma sociedade que de tudo fez para nos diminuir, uma estrutura erguida para não permitir a nossa ascensão. E estamos aqui, dia após dia, quebrando barreiras e honrando as que vieram antes de nós.

Hoje, eu quero dizer a cada mulher negra que vier a ler esse texto, que sua felicidade importa e que você merece, sim, ser feliz. Você merece uma vida próspera, nos mais diferentes sentidos da palavra prosperidade. Uma vida próspera de amor, de afeto, de bem-viver.

A foto que abre este artigo, inclusive, é de um momento extremamente feliz. No centro dela está Chiara Ramos, procuradora federal, idealizadora da Abayomi Juristas Negras, organização que busca enfrentar o racismo estrutural por meio do protagonismo de mulheres negras, enegrecendo os órgãos que compõem o sistema de justiça brasileiro. Como comentei nas minhas redes sociais, a professora Chiara é referência, inspiração e generosidade. 

Na imagem também estamos minha irmã, Joseane, e eu. Juntas, aliás, nós três também estamos evidenciando, ali, o livro Negra Sou, de minha autoria, e todas as histórias que ele representa. Histórias das mulheres que retrato no livro, histórias da minha mãe, Neide, da minha irmã Jacilene, histórias de cada mulher negra que se reconhece nas páginas deste livro.

Esse nosso encontro, que resultou nesta fotografia tão feliz, ocorreu durante um dos eventos idealizados pelo Futuro Black, organização que tenho orgulho em também ser parceira e sobre a qual falarei mais em um futuro artigo.   

Quando compartilhei esse registro no Instagram, lembrei as palavras de Chiara sobre o livro Negra Sou, palavras essas que me emocionam até hoje e replico abaixo:

“As nossas histórias curam. Cada dia eu tenho mais certeza disso. E você faz isso. Você conta as nossas histórias. E isso cura e inspira. Obrigada.”

Toda essa rede de afeto, de cura, é o que desejo que se multiplique e alcance cada vez mais de nós. Acredito que esse seja um bom momento para verbalizar ainda mais esses anseios, esses sentimentos, afinal, estamos celebrando o Julho das Pretas e o  Dia Internacional da Mulher Negra Latino Americana e Caribenha e também o Dia Nacional de Teresa de Benguela.

Para finalizar, vou deixar aqui registrados os versos da canção “Sobre Nós”, de Drik Barbosa com participação de Rashid, e que muito me encanta e emociona. Mas, antes, vale a pena frisar e reforçar: Mulheres negras felizes e sorrindo: é esse o Brasil que eu quero.

(…)
É sobre o toque não mais machucar
E a dor do banzo virar cicatriz
Sobre a urgência do auto cuidar
Também ser luta
É sobre abraço, sobre pertencer
Nos dar afeto pra fortificar
Sobre se ouvir e se fortalecer
Ser chave pra resistir
Se somos, sou
Resiste
Se somos, sou
Persiste
Herdamos laços que nos fazem nós
Nosso sonhar, resiste
Se somos, sou
Resiste
Se somos, sou
Persiste
Desatar nós, ouvir a nossa voz
Se somos, sou


Sobre a autora

Jaqueline Fraga é escritora, jornalista formada pela Universidade Federal de

Pernambuco e administradora pela Universidade de Pernambuco, com MBA em Comunicação e Jornalismo Digital pela Universidade Cândido Mendes. Apaixonada pela escrita e pelo poder de transformação que o jornalismo carrega consigo, é autora

do livro-reportagem “Negra Sou: a ascensão da mulher negra no mercado de

trabalho”, finalista do Prêmio Jabuti, e do “Big Gatilho: um livro de poemas inspirado no BBB 21”. Também é coautora do livro “Cartas para Esperança”. Escreve por profissão, prazer e terapia. Escreve porque respira, respira porque escreve. Pode ser encontrada nas redes sociais nos perfis @jaquefraga_ (Instagram e Twitter) e @livronegrasou (Instagram).

** ESTE ARTIGO É DE AUTORIA DE COLABORADORES OU ARTICULISTAS DO PORTAL GELEDÉS E NÃO REPRESENTA IDEIAS OU OPINIÕES DO VEÍCULO. PORTAL GELEDÉS OFERECE ESPAÇO PARA VOZES DIVERSAS DA ESFERA PÚBLICA, GARANTINDO ASSIM A PLURALIDADE DO DEBATE NA SOCIEDADE.

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