O projeto Arte Solidária Michelin Ouro Verde, parceria da designer amazonense Maria Oiticica e da fabricante de pneus, desenvolve o empreendedorismo de mulheres em três comunidades quilombolas no sul da Bahia. A primeira fase consistiu em oficinas e diálogos online, nos quais Maria e 20 mulheres trocaram conhecimentos e elaboraram a coleção Origens. Com mais de R$ 4 mil em vendas destinados às comunidades locais, o projeto implementa sua segunda fase.
Agora, os grupos têm sido instruídos a vender online as peças – não apenas da coleção – e a manter a geração de renda com autonomia, independente da iniciativa. “A mulher quando parte para o empreendedorismo, ela comumente tem mais garra, pois é historicamente desvalorizada. Ela leva renda para casa e, no caso do projeto, mantém a floresta em pé com uma rede afetiva de outras mulheres”, explica Maria. Ela pontua que as integrantes ainda serão acompanhadas quando o Arte Solidária chegar ao fim.

“Com o projeto tivemos oportunidade de trabalhar com outro modelo a partir da semente da seringueira, que por ser uma planta abundante na região, fortaleceu ainda mais o laço de parceria”, revela Danila de Jesus dos Santos, artesã da Associação de Biojoias, Pesca e Agricultura em Ituberá (ABPAGI), uma das comunidades atendidas.
Já para Maria Rosângela Nascimento de Jesus, outra artesã da ABPAGI, a iniciativa lhe ajudou a reconhecer e valorizar seu próprio talento e trabalho. “Em cada peça vemos também a autoestima e visual único de cada mulher na sua expressão natural, na segurança da sua etnia.”

Dois perfis no Instagram foram criados para comercializar os produtos. São eles: @biojoiasjatimane e @arteabpagi. Além destes, a coleção Origens também está disponível no site de Maria Oiticica.
Raízes
A região do sul da Bahia na qual as comunidades quilombolas estão presentes é a Reserva Ecológica Michelin, onde a marca de pneus investe em reflorestamento, pesquisa ecológica e programas de educação ambiental. A designer foi convidada a visitar o local em 2017 e lá, diz, teve estimulada a sua própria conexão familiar no Amazonas. A seringueira despertou as lembranças.
“Começou a me levar de volta à infância e fiquei muito mexida com isso. Sangrei a seringueira e lembrei do meu pai. Desde que comecei a minha marca, há 20 anos, nunca consegui trabalhar com a semente da seringueira, pois é muito leve e frágil. Quando terminei a visita, ganhei uma caixinha com ela e outras sementes”, relembra Maria.

A designer diz que chegou ao seu atelier e pensou em desenvolver uma coleção, que se chamaria Origens. Entrou em contato com o pessoal da Michelin e pediu algumas outras sementes. Ao explicar sua ideia, a marca de pneus lhe propôs não apenas uma coleção, mas um projeto. Daí surgiu a parceria com as mulheres quilombolas.
“Houve uma conexão muito grande e naquele momento fui conhecer quem trabalhava com o artesanato local, com as mulheres quilombolas. Fiquei apaixonada pelo trabalho delas”, explica.
Após desenhar o projeto e prestes a iniciá-lo no começo de 2020, a pandemia deu as caras. Impossibilitada de viajar, Maria e o time da Michelin reconceitualizaram a iniciativa e optaram pelo modelo digital. “A troca que tivemos foi a coisa mais impressionante da história da minha marca”, complementa.

Jéssica Oliveira do Rosário, artesã do quilombo Jatimane, no município de Nilo Peçanha, ressalta que deseja levar a comunidade para o mundo sem precisar sair dela. “Nossa expectativa é que a gente seja reconhecido pelo nosso trabalho de base e sustentável.” O aprimoramento do manuseio das sementes e o desenvolvimento da loja virtual já geraram, segundo a artesã, “resultados excepcionais.”
“Aproveitamos todos os benefícios que a natureza oferece e a comunidade tem um olhar diferenciado sobre a preservação e o cultivo”, finaliza.