Mesmo livre, Mandela continuou com a luta contra o Apartheid.
Em mais um discurso da série em homenagem a Nelson Mandela, discurso feito durante Assembleia da Organização da Unidade Africana, atual União Africana, em 9 de julho de 1990.
“O princípio de que a África do Sul pertence a todos que vivem nela, brancos e negros, significa que o acordo político que nós buscamos não é direcionado à expulsão da comunidade branca e à redução a cidadãos de segunda classe. Porém é direcionado a acabar com o status de segunda classe da maioria negra.
Isso significa a construção de uma nação, mesmo que diversas as línguas e as culturas de suas várias partes. Estamos convencidos de que sem aceitação dessas proposições tanto pela população negra de nosso país quanto à branca, assim como os representantes políticos dessas, nenhuma solução política é possível. Nós vemos isto então como uma de nossas tarefas centrais para continuar a espalhar essas ideias e ganhar o apoio para elas entre as pessoas de nosso país.
O princípio importante de que nenhum governo pode justificar a alegação de autoridade, a menos que se baseia na vontade de todo o povo é fundamental para qualquer solução. Nós, então, não queremos ver nenhum governo obtendo sua autoridade da vontade de só uma parte da população da África do Sul. Consideramos de fundamental importância que a prática de definir as pessoas do nosso país em termos de disparidade e competição racial e agrupamentos políticos étnicos deve chegar a um fim.
(…)
Da mesma forma que insistimos, então, que a rejeição do conceito de grupo do sistema apartheid deve instruir o processo de desenhar um novo sistema político, nós devemos considerar correto que o novo sistema deve assegurar os direitos políticos e outros do indivíduo. O objetivo das negociações deve produzir um verdadeiro sistema democrático onde o direito humano fundamental de todos os cidadãos deve ser garantido e inviolável.
Por estas razões, deve ser instituído um sistema de um voto por pessoa e uma lista de eleitores comuns, sem nenhuma tentativa de inserir nos direitos constitucionais o veto por grupos políticos definidos pela raça. Nós acreditamos também que, no nosso caso, todos devem ter o direito para formar e pertencer ao partido político que quiser desde que isso não seja pelo propósito de perpetuar o racismo.
Ao mesmo tempo, deve ser adotada uma declaração de direitos arraigada que deve ser aplicada por um poder judiciário independente e representativo. Neste contexto, devemos mencionar especificamente que tal declaração deve garantir os direitos a qualquer indivíduo a sua língua, cultura e religião.
(…)
O apartheid não somente nega à maioria da nossa população seus direitos políticos. O sistema também representa a privação econômica desta maioria. O resultado disso é, como é sabido, o enriquecimento da minoria branca em detrimento da maioria negra. Obviamente, esta situação não pode continuar.
A abordagem do processo de mudança política deve rodear, da parte de todas as forças políticas envolvidas no esforço de desenvolver um acordo, uma determinação comum para reparar o desequilíbrio econômico trazido pelo sistema apartheid. Deve ser instituído um sistema econômico que beneficie todas as pessoas de nosso país, garantido que cada um aproveite um padrão de vida decente e crescente. De fato, temos também que procurar esclarecer o ponto que o acordo político sozinho não pode sobreviver a não ser que se tenha uma melhora rápida e visível na qualidade de vida do povo como um todo.
(…)
Discussões vão começar em breve a abordar a questão de quem deve se reunir para decidir a composição do corpo que vai delinear uma nova constituição. Isto será um passo à frente importante da forma como deve atrair as formações políticas representativas no processo de negociação de forma que, juntos, nós possamos tomar as decisões sérias que vão determinar o futuro constitucional de nosso país.
Como dissemos no passado, nós aceitamos a honestidade e integridade do presidente De Klerk e seus colegas na liderança do partido governante. Assim como estamos convencidos de que os acordos serão mantidos quando chegarmos a eles. Porém, isto nem por uma extensão da imaginação significa que a luta acabou.
Na verdade, nosso país continua sendo governado pelo regime da minoria banca. Como eu disse anteriormente, eu não pude votar quando entrei na prisão há 27 anos. Eu continuo sem poder votar. O apartheid continua. Os principais pilares do sistema estão intactos. Então, a luta para acabar com o sistema apartheid deve continuar..)
Nós chegamos a um ponto onde falamos da vitória estar ao nosso alcance, como resultado da luta e de sacrifícios enormes que são feitos continuamente por nosso povo e pelos povos da África do Sul e do continente. Vitória também virá como resultado da luta, mesmo que seja uma luta em volta de uma mesa de negociação, pois é a vitória dos ideais que mais nos são caros.
(…)
O dia não está longe em que teremos a honra e o prazer de recebê-los em nosso próprio país como heróis e heroínas da luta comum para acabar com o sistema de apartheid, transformando a África do Sul em um país unido, democrático e não racial e atingindo o nobre objetivo da emancipação total de nosso continente do sistema de governo da minoria branca. Para que isso aconteça, sem demora injustificada, exige que nós continuemos em nossos postos de luta e fixemos os nossos olhos firmes no objetivo de assegurar a vitória da democracia contra a tirania racial, o mais rápido possível.
A luta continua!
Nossa vitória comum é certa!
Obrigada pela sua atenção.”