No Brasil, vítima do racismo recebe punição maior que agressor

24/10/25
Ecoa, por Tony Marlon

No começo de outubro, Diego, do Batel Guarapuava, chamou Paulo Vitor, do Nacional, de “macaco”, em jogo válido pela Taça FPF, no Paraná. Crime tipificado, existe lei para responsabilizar alguém por isso. O zagueiro PV, como é conhecido, foi expulso da partida por agressão ao se defender do crime que sofreu. Já o volante do Batel, demitido horas depois do caso, alegou em julgamento que na verdade usou a palavra “malaco”. Outro jeito de dizer maloqueiro, malandro e coisas assim.

O Brasil é uma república federativa cheia de pessoas que são mal interpretadas em casos como este, você já percebeu? Ninguém banca o racismo que sai da sua boca, o preconceito que sustenta os seus gestos. Como país, nos equilibramos entre ser a terra do “você sabe com quem está falando?” e a do “não foi isso que eu quis dizer, você entendeu errado”. No fim, se salvam os de sempre. É feito um jogo com todas cartas marcadas.

No começo dessa semana, o Tribunal de Justiça Desportiva do Paraná, o TJD-PR, conseguiu a proeza de punir mais a vítima do racismo do que o agressor. Diego está suspenso por sete jogos. PV, a vítima do ato racista, pegou dez partidas fora. Quem explica? Na verdade, muita gente até tenta. É só rodar um pouco pelas redes sociais para perceber. Uma das mais importantes intelectuais brasileiras do nosso tempo, Cida Bento, deu até um nome para este fenômeno que se manifesta semana sim, semana também: pacto da branquitude.

Este grande acordo nacional, muitas vezes com um Supremo e com tudo, não está escrito num pedaço de papel que você e eu possamos pegar nas mãos. Pode ser encontrado nas entrelinhas, se lermos as letras miúdas do contrato.

Esse pacto está aí flutuando sobre a imaginação coletiva, influenciando opinião e decisão. Das pequenas às grandes. Por exemplo, quantos jogadores da elite do futebol masculino nacional que vieram a público em defesa de PV? Que afirmaram que o racismo não pode nunca, em nenhuma hipótese, fazer parte do jogo: aquele do campo e este aqui fora, o da vida? Pois é, nenhum.

O pacto da branquitude é este combinado pelo silêncio que não me compromete entre quem se parece comigo. Que não me implica nem em algo que dói em um companheiro de profissão. Mas é também a negação do óbvio em favor sempre dos mesmos.

O ato racista foi registrado frontalmente por uma câmera e, mesmo assim, há quem defenda que o agressor não fez o que fez, foi tudo um grande mal-entendido. É a relativização da agressão racista: ah, mas ninguém diz isso do nada para outra pessoa, alguma coisa o PV fez antes de tudo aquilo. A desconfiança recai, sempre, sobre os mesmos ombros. Além da dor provocada por tudo que recebeu, tem a dor de ter que provar que recebeu mesmo.

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