Obama: Ele para tudo por um recital

Por: SHERYL GAY STOLBERG

 

WASHINGTON – Não é segredo que o presidente dos EUA, Barack Obama, deseja aprovar no Congresso a reforma do sistema de saúde do país. Mas, recentemente, quando Obama chamou à Casa Branca líderes da bancada democrata para uma maratona de negociações sobre o assunto, outra prioridade se impôs: a banda da sua filha Malia, 11, se apresentaria.

E, assim, o presidente dos EUA abandonou a negociação da sua reforma da saúde -ao menos temporariamente- e escapou durante algumas horas para a escola Sidwell Friends, onde ouviu Malia tocar flauta. Quando o concerto acabou, ele regressou à Casa Branca, e todos voltaram ao trabalho.

As discussões se prolongaram até 1h30, e se alguém -como a presidente da Câmara, Nancy Pelosi, ou o líder da maioria democrata no Senado, Harry Reid- tinha algo a dizer sobre o atraso, se calou.

“Há certas coisas sacrossantas na sua agenda -recitais das crianças, seus jogos de futebol, jogos de basquete, reuniões escolares”, disse o assessor presidencial David Axelrod em entrevista no dia seguinte ao show.

“Elas são circuladas em vermelho no seu calendário, e, independentemente do que estiver acontecendo, ele irá [aos eventos das filhas]. Acho que isso é parte de como ele se sustenta em meio a tudo isso.”

Quando Obama e a mulher, Michelle, chegaram à Casa Branca, há pouco mais de um ano, ela prontamente se declarou “mãe-chefe”, e mães de todos os EUA a viram equilibrar seus deveres como primeira-dama com suas responsabilidades maternas. Mas seu marido, o presidente, faz também um malabarismo descarado.

Ele para o trabalho todos os dias às 18h para jantar com a família e deu aos responsáveis por sua agenda rígidas instruções de que, se houver necessidade de atividades noturnas, que sejam depois das 20h.

Isso inclui questões bélicas: em novembro, discutindo o envio de mais tropas ao Afeganistão, ele convocou uma reunião da sua equipe de segurança nacional para as 20h, em deferência ao seu papel de “pai-chefe”.

Ele encaixa na agenda reuniões de pais e mestres e jogos de futebol e basquete, e interrompeu uma reunião econômica para dar os parabéns por telefone à filha mais nova, Sasha, que completava oito anos e estava em Londres com a mãe.

Quando a Casa Branca anunciou que Obama irá em março à Indonésia e à Austrália, o porta-voz Robert Gibbs confirmou que a viagem havia sido programada para coincidir com o recesso de primavera das meninas.

“Passamos muito tempo coordenando os feriados e as férias das meninas”, disse Valerie Jarrett, outra assessora presidencial. “Isso não guia só a agenda de Michelle, mas a do presidente também.”

Mas, mesmo no mundo de hoje, amigável com os pais, o equilíbrio buscado por Obama tem seus riscos.

Críticos podem acusá-lo de desacelerar o ritmo quando o país mais precisa. E Washington está cheia de políticos que já sacrificaram suas famílias por seus cargos, então Obama precisa ter o cuidado de não gerar ressentimento entre aqueles cujas agendas precisam girar em torno da dele próprio.

“As pessoas o elegem não para ser um bom homem de família, o elegem para que você resolva seus problemas, e essa é a fria realidade”, disse o estrategista político republicano John Feehery. “E todo aquele pessoal no Congresso -eles deixaram a família toda em casa; eles não têm o luxo de dar um pulo em casa no meio da reunião para pegar o recital da filha deles.”

 

De certa forma, o presidente de 48 anos reflete mudanças de atitude acerca da paternidade que são típicas de homens da sua geração, disse Ellen Galinsky, presidente da ONG Instituto Famílias e Trabalho. Pesquisas dela mostram que 59% dos homens relatam pelo menos algum conflito trabalho/vida pessoal. Em 1977, 35% tinham essa queixa.

Obama, na verdade, tem mais flexibilidade que a maioria -ele é, afinal de contas, o chefe. Ainda assim, argumenta Galinsky, isso não diminui o significado das escolhas do presidente. “Você poderia argumentar, por um lado, que ele tem muito mais autonomia que a maioria, e isso é 100% verdade.

Mas, por outro lado, ele tem muito mais responsabilidade sobre seus ombros do que a maioria dos homens.”

 

Fonte: Folha Onlie

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