Para Funai, decisão de indígenas de não deixar suas terras é legítima

A Fundação Nacional do Índio (Funai) reconheceu nesta quinta-feira (25), em nota à imprensa, “a luta dos povos guarani e caiowá, no Mato Grosso do Sul, por suas terras tradicionais”. A Funai disse ainda que “a determinação da comunidade de Pyelito Kue de não sair do local que considera seu território ancestral é uma decisão legítima.”

É a primeira vez que o órgão se manifesta sobre o mais recente episódio que envolve o conflito por terras na região. Há 15 dias, um grupo de 170 índios guaranis e kaiowás tornou pública uma carta, onde dizem que vão acabar morrendo por reivindicarem as terras.

“Nós avaliamos a nossa situação atual e concluímos que vamos morrer todos mesmo em pouco tempo”, escreveram os índios.

“Sabemos que seremos expulsos daqui pela Justiça, porém não vamos sair da margem do rio. Como um povo nativo e indígena histórico, decidimos meramente em sermos mortos coletivamente aqui. Não temos outra opção”, diz trecho da carta, que ganhou ampla repercussão nas mídias sociais.

A carta é uma reação à decisão do juiz federal Henrique Bonachela, de Naviraí, que determinou a saída dos índios da mata às margens do rio Hovy, na fazenda Cambará, no município de Iguatemi, no Mato Grosso do Sul. Os índios foram para a mata ciliar depois de terem sofrido um ataque em agosto de 2011. Naquela ocasião estavam acampados na beira da estrada, próximos à fazenda. Dizem que, desde que estão ali, ocorreram quatro mortes “duas por suicídio e duas em decorrência de espancamento e tortura de pistoleiros das fazendas.”

O Ministério Público Federal (MPF) em Dourados entrou com um recurso pedindo a reversão da reintegração de posse da fazenda Cambará. O MPF pede a reforma da decisão ou, pelo menos, a permanência da comunidade indígena na área ocupada até que sejam concluídos os estudos que irão indicar se trata-se de uma área indígena ou não – ou seja, estudar a “tradicionalidade da ocupação.”

Trata-se do início do processo administrativo de delimitação de terras indígenas. O MPF atua em 141 processos que envolvem guaranis e kaiowás. São ações relativas à demarcação de terras, danos morais coletivos, crimes e racismo.

O episódio jogou holofotes na trajetória dos guaranis e kaiowás no Mato Grosso do Sul. Eles são a segunda maior população indígena brasileira, com cerca de 45 mil pessoas, a maioria no Mato Grosso do Sul. Vivem em algumas reservas muito pequenas e populosas, onde não têm espaço nem para plantar, o que configura uma situação de confinamento. Existem 15 terras dos guaranis e kaiowás regularizadas, somando 20.172 hectares. Outras cinco estão homologadas, três declaradas e só uma delimitada, segundo a Funai.

Algumas dessas terras sofrem processos de judicialização geralmente de fazendeiros, o que impede a continuidade do processo de demarcação das terras indígenas. A regularização demora e acelera o processo de degradação da vida que os índios vêm levando. É comum ver acampamentos indígenas precários à beira das estradas.
“É uma questão que não se resolve há décadas, vai passando de um governo para o outro”, diz Levi Marques Pereira, professor de antropologia da Universidade Federal da Grande Dourados, com mais de 30 anos de experiência entre os guaranis e kaiowás.
“É uma situação tensa, que envolve muitos interesses. A terra no Mato Grosso do Sul é cara e toda ocupada com atividade produtiva”, afirma. “E isso em um momento em que o agronegócio tem uma explosão em uma economia crescente. As comunidades indígenas cada vez mais em situação de mais vulnerabilidade e promovem tentativas desesperadas de ocupação das terras que reivindicam.”

Fonte: Correio do Brasil

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