O Grêmio Recreativo Escola de Samba Paraíso do Tuiuti Paraíso do Tuiuti entrou para a história e a prova disso foi a reação dos apresentadores da Globo durante o desfile.
Por Joaquim de Carvalho, do DCM
“Desfile recheado de críticas à política constrange narradores da Globo”, escreveu o crítico de TV Maurício Stycer, do UOL.
“Na parte final do desfile, um carro trazia, no alto, um homem com a faixa presidencial, intitulado ‘vampiro neoliberalista’ – uma alusão crítica ao presidente Michel Temer. Uma ala, chamada “Manifestoches”, com passistas fantasiados de patos sugeria que manifestantes foram fantoches em protestos políticos. Outra ala lembrava do trabalho informal, numa referência explícita à reforma trabalhista”, descreveu.
“Do camarote da Globo, onde narravam o desfile, Fátima Bernardes, Alex Escobar e Mílton Cunha reagiram com comedimento ao surpreendente protesto, como se estivessem constrangidos.”
“As desigualdades vêm vindo até os dias de hoje”, disse Fátima. “Muitas confecções usam trabalho escravo”, observou. “Os manifestoches”, leu ela, ao ver passar a ala com os patos, sem dizer mais nada. “Manipulados”, acrescentou Mílton.
“O constrangimento se repetiu diante da crítica ao presidente. “O Vampirão”, disse Mílton. Alex Escobar apenas riu. E Fátima observou: “É o regime de exploração nos mais diversos níveis”. Um pouco depois, Alex Escolar disse o que todos viam: “Tá com a faixa de presidente esse vampiro”. E Fátima: “Vampiro neoliberalista”.
“Depois do desfile, diversos integrantes da escola foram ao camarote da Globo, como previa o roteiro da transmissão, mas vampiro e fantoches não foram assuntos das entrevistas.”
A última coisa que Fátima e Alex Escobar podem argumentar é que foram surpreendidos pela escola de samba. Eles já sabiam o tamanho do desafio — falar de uma trama política que tem a Globo, empregadora dos dois, no papel central.
Estiveram duas semanas atrás com o carnavalesco da Paraíso do Tuiuti, Jack Vasconcelos, conforme este contou na rede social, para uma entrevista que faz parte da rotina da apresentação. Os apresentadores visitam a escola para saber detalhes do desfile, e eliminar qualquer dúvida.
Uma amiga de Jack Vasconcelos perguntou: “Soletrou tudo direitinho, meu bom?”
Jack Vasconcelos tem 43 anos e é formado em Belas Artes pela UFRJ.
Atua no Carnaval carioca há cerca de vinte anos. Não tinha terminado a faculdade quando começou a estagiar nas escolas de samba. Em 2004, assumiu o desfile da Império da Tijuca, na condição de carnavalesco, o maestro da apresentação. Em 2012, foi a Paraíso do Tuiuti, de onde saiu em 2013 para voltar em 2015.
Tuiuti é um dos berços do samba carioca e do próprio Carnaval. Era um morro desabitado no início do século XX, quando uma reforma urbanística acabou com cortiços da cidade e os moradores, muitos deles ex-escravos e imigrantes pobres, foram para lá.
Na década de 30, surgiu a primeira escola de samba, a Unidos do Tuiuti, extinta em 1954, quando nasceu a Paraíso do Tuiuti. Em seus quase 70 anos de história, esta é a primeira vez que desfila pelo segundo ano consecutivo do Grupo Especial.
Em 2017, já tinha escolhido um tema ousado — a Tropicália — e só não foi rebaixada por conta de problemas na organização que a prejudicaram — o que resultou em um acidente na avenida, quando um carro alegórico feriu algumas pessoas.
Este ano voltou para a avenida para fazer história. E Jack Vasconcelos nunca escondeu que era esse mesmo o seu propósito. No dia 6 de fevereiro, ele postou um recorte de jornal, com a nota:
“O Carnaval da Tuiuti atravessou fronteiras. A agência americana Associated Press distribuiu a seus assinantes espalhados pelo mundo matéria sobre o enredo “Meu Deus, meu Deus, está extinta a escravidão?” O Brasil foi o último país das Américas a abolir a escravatura e, 130 anos depois, o impacto ainda é muito sentido nesta nação do tamanho do continente”, diz o texto, em tom crítico, que fala ainda da reforma trabalhista e da reforma da Previdência.
Jack escreveu acima da nota:
“Quando você percebe que a missão está sendo cumprida.”
Sua página no Facebook amanheceu hoje com muitos cumprimentos, a maioria dizendo que chorou ao ver a escola na avenida.
No que diz respeito à Tuiuti, o Carnaval está de volta às origens, quando o samba era arte genuína e, como tal, a manifestação da realidade do povo brasileiro.
Era a oportunidade para denunciar, com beleza, como vivem os brasileiros que moram longe – no caso do Rio, não tão longe, mas no morro.
Agora é prestar atenção no resultado do desfile, porque os golpistas não veem limite para tratorar os adversários, e é bom não esquecer que, organização do Carnaval, a Globo mantém um de seus muitos tentáculos.