Pluralidade dos meios de comunicação: urgência para a consolidação da jovem democracia brasileira

Por Marilza de Melo Foucher

 

A evolução da imprensa escrita, como vetor de informação para o grande público, será muito lenta, ela vai surgir num ambiente de censura e de controle de informação. Esta incrível fabrica de informação terá como marca registrada a liberação da palavra pública, por esta razão, ela será sempre associada aos principio democráticos.

A democracia surge para colocar o cidadão no centro do sistema político. Nesse sentido, a imprensa joga um papel fundamental na difusão das correntes de pensamentos e opinião, contribuindo, assim, para a livre confrontação de idéias. O aumento geral do nível de conhecimento nas democracias modernas foi vetor da promoção do pensamento crítico. O pluralismo contribui também para suscitar interrogações e ceticismo.

O avanço das tecnologias tem acrescentar na diversificação dos meios de comunicação. Tanto a imprensa escrita como a evolução de outros meios de comunicação representam a grande utopia de que podemos ser livre para pensar e opinar sobre a realidade. Ao dispor também do pluralismo, os indivíduos passam a usufruir de uma real liberdade na escolha dos meios de comunicação.

A consolidação da democracia
brasileira exige pluralidade dos
meios de comunicação

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No Brasil ainda estamos longe desta realidade. A história da imprensa se confunde com a história das oligarquias regionais, que apenas foram se modernizando. Todavia, pensava-se que com o avanço da democracia brasileira e a chegada de governantes progressistas, os meios de comunicação seriam democratizados e regulamentados, no sentido de garantir sua pluralidade.

Logicamente, para os que açambarcaram os veículos e o mercado dos meios de comunicação a tentativa de regulamentação é associada como uma ameaça à liberdade de expressão. Em nenhuma ocasião, eles vão pensar no interesse público e coletivo, do qual usufruir do pluralismo é também uma conquista da democracia. O que é normal num país que viveu mais de duas décadas sob a ditadura. É normal que até hoje muitos brasileiros lutem pela democratização dos meios de comunicação.

Como aceitar que a democracia brasileira se consolide e que continue a conviver com uma espécie de coronelismo mediático, que usa e abusa do poder de concentração? Esta é uma questão que poderíamos fazer aos dirigentes e políticos brasileiros.

Entretanto, na Constituição Brasileira de 1988, ela define no capitulo § 5 que “os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio”. Todavia, basta consultar os estudos realizados recentemente sobre este assunto para verificar que a própria constituição é por vezes usurpada.

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A concentração dos meios de comunicação os colocam nas mãos de poucos. O Grupo Abril e o Grupo Globo se sentem intocáveis e assumem sem complexo o controle absoluto de quase todos os veículos de comunicação. Abril controla 74 veículos, entre revistas, o canal MTV, internet e a TVA, a cabo, em parceria estratégica com a Telefônica. O Grupo Globo lidera o Sistema Central de Mídia Nacional e, desde 1965, mantém seus associados regionais, são 35 grupos ligados à rede. No total eles controlam 340 veículos de comunicação.

O poder mediático de que a Globo dispõe é enorme, graças às 3.305 redes de transmissão de TV (RTVs). O grupo Globo mantém parceria em todos os Estados brasileiros o que permite um enorme controle do conteúdo das informações. Além da televisão, são 33 jornais, 52 rádios (AM) 76 (FM), 27 revistas, 105 emissoras de TV, 17 canais e nove operadoras. Além disso, a Rede Brasil Sul de Comunicação, é afiliada da Globo, é a terceira maior organização de mídia privada do país, com 57 veículos, entre jornais, rádios (21 emissoras), TV (18 emissoras) e 259 retransmissoras.

Estes mesmos grupos compactuaram com a ditadura e aproveitaram do apoio de seus governos para instalar o império do Quarto Poder. Estes grupos do Quarto Poder, até hoje, têm dificuldades de aceitar a conquista da cidadania política brasileira. Muitos dos cidadãos e cidadãs brasileiros conseguiram entender alguns processos de manipulações da opinião publica, hoje estão emancipados das estratégias de comunicação posta em pratica pelos dois grandes grupos e seus aliados.

A grande mídia brasileira na realidade se diz autônoma, imparcial com relação os poderes. Muitos jornais fazem uso de uma prática deliberada de induzir os leitores, ocultar e fragmentar os fatos, de maneira a desfazer e recriar o mundo à sua maneira, criam os famosos “buzzs” com o objetivo de criar um ruído entre os leitores para deformar a realidade ou oculta-la.

A prova do avanço da cidadania política no Brasil é que a grande mídia foi derrotada por três vezes consecutivas, apesar de dispor de um vasto domínio mediático espalhado em todos os rincões do Brasil. O padrão Globo pensava ser imbatível. Assim como a revista Veja da Rede Abril, seus jornais e afiliados funcionam como verdadeiros aparelhos de propaganda contra os governos legitimamente eleitos.

Além da concentração do poder midiático, existem certas aberrações não dignas da República brasileira. Alguns deputados, senadores, governadores, prefeitos, vereadores detêm participação, ou são proprietários de meios de comunicação, ferindo os princípios republicanos. Até hoje, pouco se faz para impedir que estes políticos sejam enquadrados na Lei por violação constitucional.

Como garantir a pluralidade dentro deste contexto?

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Numa República democrática, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário não são infalíveis, daí o exercício da cidadania política nos dar o direito do controle social. Os jornalistas são, acima de tudo cidadãos. Ao atuar profissionalmente nos meios de comunicação, eles exercem um papel importante na vigilância contra as derivas e abuso de poder. Não devemos nos esquecer que cada cidadão tem sua parte de responsabilidade em certos desvios republicanos.

Na jovem democracia brasileira, os jornalistas deveriam estar atentos sobre qualquer forma de violação de direitos e abusos de poder. Eles deveriam ser os primeiros a defender a pluralidade. Certamente, estariam dando uma excelente contribuição na consolidação da democracia no Brasil. Além disso, teriam um leque maior de opções profissionais e poderiam exigir melhores salários e melhores condições para exercer, de modo independente, um verdadeiro jornalismo. Aquele jornalismo imparcial que provoca o verdadeiro debate, que analisa, contextualiza e coloca a nu certas contradições, cujo conteúdo leva o leitor a refletir sobre sua realidade.

Infelizmente, nesses últimos anos, o debate político no Brasil perdeu o brilho da racionalidade que exige a boa análise. As cenas de desrespeito republicano passaram a ser marcantes. As duas últimas campanhas presidenciais disputadas pelo presidente Lula foram de grande violência verbal, nunca se viu tanto racismo, tanta discriminação, tanto ódio na boca e nos escritos de certos políticos e jornalistas. Este tipo de politicagem é perverso para a democracia e nada acrescenta à educação do povo brasileiro. A grande Nação Brasileira merece que o jornalismo seja praticado dentro do rigor intelectual necessário.

O comportamento dos donos dos meios de comunicação nas últimas décadas de democratização, deixa muito a desejar. Chega a dar impressão de querer forjar uma democracia de opinião capaz de influenciar no processo eleitoral. Essa grande mídia esquece que o exercício do poder supremo é originado da vontade popular. É interessante observar o modo como ela agiu, durante as campanhas presidenciais de Lula e de Dilma. A posição do presidente da Associação Nacional dos jornais (ANJ) foi esclarecedora ao admitir, publicamente em março de 2010 que, tendo em vista a fragilidade dos partidos de oposição, a imprensa estava fazendo, de fato, a oposição ao governo.

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Este papel de oposição era notório. Todavia, a partir desta declaração, a ANJ oficializou os governos de Lula e Dilma como adversários. Com este tipo de comportamento, a grande mídia sai fragilizada, pois não é o papel da imprensa de liderar as massas, exceto se ela quer ser governo e eliminar os partidos políticos.

Nem tampouco é papel do governo entrar no jogo da provocação, afinal, ele deve garantir a livre expressão de todos. O interesse público, no entanto, assim como as boas regras do comportamento republicano, deve predominar dos dois lados. O governo não deve ceder à pressão dos donos da mídia e, urgentemente, organizar o funcionamento do espaço nacional de Comunicação Social para obter um melhor equilíbrio, a fim de garantir a pluralidade que determina a Constituição brasileira.

Este espaço deve ser mais representativo de diversos grupos sociais. Talvez esta seja uma das últimas conquistas para consolidar a jovem democracia brasileira.

Somente a democratização dos meios de comunicação permite a livre confrontação de idéias.
Marilza de Melo Foucher é economista, jornalista e correspondente do Correio do Brasil em Paris.

 

 

 

Fonte: Correio do Brasil

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