Polícia investigará homens que transmitem HIV de propósito

Envolvidos ficaram conhecidos na web como ‘clube do carimbo’, por divulgar fotos, vídeos e dicas com ‘passo a passo’ da contaminação

Por EDGAR MACIEL – O ESTADO DE S. PAULO

A Polícia Civil vai abrir inquérito e fará investigações online de grupos de homossexuais que transmitem o vírus da aids para parceiros sexuais propositalmente. A prática foi revelada pelo jornal O Estado de S. Paulo no domingo. O secretário da Segurança Pública, Alexandre de Moraes, mobilizou a área de inteligência em internet da polícia para tentar identificar donos dos blogs que compartilham dicas de como contaminar outras pessoas sem serem percebidos.

O pedido foi feito pelo secretário da Justiça e da Defesa e Cidadania, Aloísio de Toledo César. Em conversa com Moraes, ele pediu rigor nas investigações do que classifica como um “ato horrorizante”. “Entendo que a homossexualidade é uma opção pessoal que deve ser respeitada, mas não se pode admitir, em hipótese nenhuma, que pessoas de baixo nível moral se esforcem para transmitir o HIV a outras”, afirmou.

Polícia Civil vai abrir inquérito e fará investigações online de grupos de homossexuais que transmitem o vírus HIV para parceiros sexuais propositalmente Foto: Márcio Fernandes/Estadão

Disfarce

Segundo Toledo, Alexandre de Moraes orientou as equipes do Departamento de Inteligência da Polícia Civil (Dipol) para agirem disfarçadamente na identificação dos grupos. Serão analisados salas de bate-papo, páginas na internet, blogs e até clubes e saunas de sexo.

“Combinamos de estimular todas as ações que possam evitar que essas pessoas continuem a retransmitir o vírus de forma criminal”, disse Toledo. “Quando a transmissão se aperfeiçoa dessa forma dolosa, o entendimento da Justiça é de que a figura jurídica configura como uma tentativa de homicídio, com pena mais grave”, complementou.

Segundo o artigo 130 do Código Penal, a pena para quem transmite o vírus sem o consentimento do parceiro é de até 4 anos de prisão.

Dicas

A investigação da polícia começa depois que o Estado divulgou que adeptos da modalidade bareback, na qual homens gays transam com parceiros sem camisinha, têm compartilhado técnicas para fazer sexo sem proteção ou furar o preservativo. Conhecidos como o “clube do carimbo”, divulgam fotos, vídeos e dicas com o “passo a passo” da contaminação.

Em uma das páginas, as frequentes postagens alertavam que o carnaval e as férias escolares são momentos propícios para “carimbar” (quando o soropositivo retransmite o vírus), principalmente os jovens. Para os secretários, os criminosos só serão identificados se as vítimas denunciarem. “São casos complicados e muitas vezes são escondidos pelas próprias famílias. Para facilitar o processo de investigação, é necessária a denúncia dos casos à Polícia Civil”, avaliou Toledo.

J.S., de 67 anos, é moradora de São José dos Campos. O sobrinho, de 46, é soropositivo há mais de duas décadas. Segundo ela, a família inteira sabe que ele retransmite o vírus aos parceiros sexuais sem consentimento. “Ele falsifica todos os exames e mantém sites de encontro na internet. A nossa família sabe, e é totalmente negligente nesse assunto”, afirma. “Meu desejo é denunciá-lo, porque não queria que um filho meu fosse infectado desse jeito.”

Criminalização

Para as entidades que trabalham na prevenção da aids, a criminalização não é a melhor solução.

Para Salvador Pereira Correa Junior, coordenador executivo da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia), criminalizar o ato da transmissão pode afastar as pessoas do teste e prejudicar a prevenção da doença. “Seria quase impossível você conseguir provar que a pessoa transmitiu o HIV intencionalmente. Poderia, por exemplo, um ex-companheiro se vingar e dizer que foi intencional”, explicou.

“Prender esse grupo causa muito mais pânico moral do que medida efetiva. O que não significa que nós somos a favor de qualquer tipo de transmissão intencional. Mas essa não é a saída”, afirmou Correa.

+ sobre o tema

Quilombo Kalunga é reconhecido pela ONU como primeiro território no Brasil conservado pela comunidade

O território Quilombo Kalunga foi reconhecido por um programa...

Cerca de 3 mil entidades repudiam Bolsonaro por falar sobre fim do ativismo no Brasil

Por meio de nota, organizações não-governamentais, coletivos e movimentos...

“Os homens avançam mais rápido na carreira porque não têm o trabalho doméstico nas costas”

Hildete Pereira de Melo é economista da Universidade Federal...

Pressão dos movimentos derruba flexibilização do trabalho escravo

Após audiência, relator suspende texto que afrouxava conceito de...

para lembrar

Alemanha recomenda extração de todos os implantes mamários da empresa PIP

As autoridades sanitárias da Alemanha recomendaram nesta sexta-feira extrair...

Polícia estoura clínica de aborto e prende 10 no Rio

Policiais civis da Delegacia de Repressão aos Crimes Contra...

A violência eufemismada de jornalismo: ‘Paulo Sérgio, estuprador’

Em vídeo postado recentemente no YouTube, a repórter Mirella...

Ministério da Saúde e ANS publicam regras para estimular parto normal na saúde suplementar

Operadoras terão que disponibilizar informações para a gestante e...
spot_imgspot_img

ONU acolhe propostas de Geledés em registro oficial da 69ª CSW

Nesta segunda-feira, 10 de março, ocorreu a abertura da 69ª Sessão da Comissão sobre a Situação da Mulher, na sede da Organização das Nações...

Carta da presidência da COP30 não cita racismo ambiental e afrodescendentes

A Carta da presidência da COP30 enviada à comunidade internacional nesta segunda-feira, 10 de março, pelo presidente da COP30, o brasileiro André Corrêa do...

Mais de 2 mil mulheres foram libertadas do trabalho escravo desde 2003

AOS 62 ANOS, Cida* trabalhava como cozinheira em uma frente de desmatamento de floresta nativa em uma fazenda em Pimenta Bueno (RO). Durante seis meses,...
-+=