Fonte: Terra Notícias –
No próximo ano, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) deverá realizar um estudo sobre a entrada no mercado de trabalho de alunos que foram cotistas em universidades públicas. A informação é do diretor de Estudos, Cooperação Técnica e Políticas Internacionais, Mário Lisboa Theodoro o único diretor negro do principal órgão formulador de políticas públicas e de planejamento do Estado brasileiro.
Economista com doutorado na Sorbonne
Université Paris I) e consultor legislativo, o currículo de Theodoro destoa da trajetória da maioria das pessoas negras no Brasil. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, Pnad 2006), das pessoas com 25 anos ou mais de idade e com 15 anos ou mais de estudo apenas 3,3% se declara “preta”, enquanto 78,1% são “brancos”.
Por causa dessa desigualdade, encontrar um negro com alta escolaridade e bem empregado chega a surpreender. O diretor do Ipea lembra que já foi confundido como segurança pelo guardador de carros do estacionamento do Senado Federal, do qual é funcionário de carreira. “
A única possibilidade de trabalho que esse guardador de carro enxergava para um homem negro vestido de terno como eu era a de segurança. É isso que ele vê: os negros quando põem terno são seguranças”.
Na avaliação de Mário Theodoro, as políticas de cotas nas universidades públicas têm o mérito de “colorir um pouco nossa elite”. “O programa de cotas quebra um determinado ciclo vicioso em que as mesmas famílias colocam seus membros na universidade enquanto outros grupos não conseguem o mesmo. Assim se reproduz dois circuitos o dos que conseguem ir para a universidade e o dos que não conseguem ascensão”, defende.
O economista assinala que a política de cotas não tem o objetivo de acabar com a pobreza. “Pobreza se acaba com distribuição de renda e proteção social”, explica. “Ter uma elite negra vai fazer diferença porque a população brasileira vai passar a ver coisas inusitadas como médicos negros, engenheiros negros, pessoas negras em cargos de direção. Aí a gente vai ver a competição de negros e brancos por cargos que hoje são predominantemente destinados à população branca”.
O ministro Edson Santos, da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, concorda com o diretor do Ipea e defende que “é preciso ter em áreas estratégicas da administração pública e do setor privado a diversidade étnica e cultural desse país”.
No entanto, a ideia da “elite colorida” não é unânime. Para o professor de sociologia da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Jesse Souza “não precisamos mudar a cor da elite, precisamos, sim, de uma sociedade menos elitista e desigual”, defende. “Para isso, compreender o processo de produção das desigualdades sociais em toda a sua complexidade é fundamental”, disse o intelectual que está publicando um livro sobre “quem é e como vive a ralé brasileira”.
Outro crítico da política de cotas, o geógrafo Demétrio Martinelli Magnoli contesta “a legitimidade de se ter uma elite que se define em termos raciais”. Para ele, “a criação de elite de raça se baseia no conceito que os verdadeiros protagonistas da história são as raças. Conceito desenvolvido por muitos e até por Hitler. Quem acredita nisso deve acreditar que de fato cada raça tenha sua elite”.