Por que fui citada por Jair Bolsonaro?

Enviado por / FontePor Bianca Santana, do ECOA

“Tem uma tal de Bianca Santana aqui, uma blogueira, né? ‘PT tem propaganda barrada pelo TSE, fake news’, dizendo que era mentira. Na verdade é que foi proibido, né, pelo TSE, uma campanha do Haddad, dizendo que Bolsonaro votou contra lei brasileira de inclusão de pessoas com deficiência. A minha esposa tem um trabalho nesse sentido. Qual o objetivo? Na teoria é uma coisa, na prática é outra. Fake news.”

Jair Bolsonaro, na Live da Semana com Presidente Jair Bolsonaro 28/05/2020, na última quinta-feira

Sou Bianca Santana, blogueira aqui no UOL dentre outras atividades e títulos, mas nunca escrevi sobre propaganda do PT barrada pelo TSE, nem sobre a lei brasileira de inclusão de pessoas com deficiência. E, cá entre nós, já escrevi muitas vezes sobre o envolvimento da família de Bolsonaro com a milícia que assassinou Marielle Franco. Na terça-feira passada, publiquei aqui contra a federalização do caso Marielle. Estava participando, pela Coalizão Negra por Direitos, do suporte à família de Marielle e Anderson e ao Instituto Marielle Franco na coleta de assinaturas da campanha #FederalizacaoNao, apoiada por 200 entidades e mais de 150 mil pessoas. Na quarta, o Superior Tribunal de Justiça votou por unanimidade contra a federalização do caso, e um dos Ministros chegou a citar nominalmente a posição da Coalizão Negra Por Direitos.

E então, quinta-feira, na live semanal do presidente, ele cita meu nome, com a acusação de escrever “fake news”, dando como exemplo uma manchete que jamais escrevi. Sou jornalista. Essa é uma acusação especialmente grave para quem tem a palavra e a busca pela verdade como ferramenta de trabalho. Ninguém pode, nem mesmo o presidente da República, dizer meu nome e sobrenome com a afirmação de que escrevi uma notícia falsa.

Mas não é curioso que Bolsonaro tenha mencionado meu nome, mesmo que em uma acusação infundada, bem na semana passada? Quando ficou na home do UOL um texto assinado por mim reafirmando a hipótese de que a federalização interessava a Bolsonaro por ele querer se aproveitar do cargo para proteger os mandantes do crime? Tive o cuidado de fundamentar a hipótese com um fluxograma, bem desenhadinho, das relações de Bolsonaro e seu filho Flávio com o Escritório do Crime, acusado da execução do assassinato de Marielle e Anderson, e com manchetes da imprensa.

Já repararam como Bolsonaro e seus seguidores reagem à pergunta de qual o envolvimento da família Bolsonaro no assassinato de Marielle e Anderson? Eles retrucam com Adélio e a facada, com citações a Celso Daniel, tentam desqualificar Marielle. Insistem em versões comprovadamente falsas sobre a vida dela. Como se qualquer acusação, ainda que verdadeira, pudesse justificar seu assassinato.

Vamos aos fatos. Adriano da Nóbrega, cúpula do Escritório do Crime, cuja mãe e esposa eram funcionárias do gabinete do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos – RJ), homenageado por Flávio mais de uma vez, envolvido nas rachadinhas, foi assassinado em fevereiro deste ano. Seu advogado diz que ele temia ser morto, como queima de arquivo.

O deputado federal Chiquinho Brazão (Avante-RJ), irmão de Domingos Inácio Brazão, ex-vereador e conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, acusado de mandante do assassinato, recebeu passaporte diplomático da Presidência da República. Ele representaria o Brasil no exterior?

Ronnie Lessa, um dos acusados do assassinato, era vizinho de Bolsonaro e tinha relações com a família.

O próprio Presidente da República afirmou mais de uma vez que queria trocar a chefia da Polícia Federal no Rio de Janeiro para proteger seus familiares e amigos.

São muitos fatos para explicar como coincidência. No último 20 de novembro, dia de Zumbi, eu e Anielle Franco publicamos um artigo na Folha de S. Paulo com a pergunta: “Afinal, o que liga a família Bolsonaro ao caso Marielle?“. Ainda queremos saber. E continuaremos perguntando.

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