Por que Ocupe Wall Street não é o Tea Party da esquerda

Há uma diferença entre um protesto emocional e um movimento, disse recentemente Andrew Young, ex-embaixador dos Estados Unidos para as Nações Unidas, sobre as manifestações do Ocupe Wall Street. “Isto é um protesto emocional”, ele continuou. “As diferenças são organização e articulação”. Young entende um pouco de movimentos sociais: quando era um jovem pastor no sul, ele aderiou à Conferência de Liderança Cristã do Sul e foi preso por participar de manifestações no Alabama e na Flórida. Mas a sua impressão de que o que está acontecendo hoje no baixo Manhattan carece de uma dinâmica real soa falsa – o movimento pelos direito civis não é um precedente que pode ser usado para entender o Ocupe Wall Street. Este movimento também não é um Tea Party da esquerda, como alguns observadores sugeriram. Ocupe Wall Street é um movimento de tipo completamente novo.

Ambos os movimentos pelos direitos civis e o Tea Party foram criados para servir a círculos eleitorais específicos – no primeiro caso, afro-americanos sofrendo sob o fardo de Jim Crow no sul; no segundo, americanos brancos, mais velhos, de classe média, que se viram como vítimas de um governo federal presunçoso. “Trata-se de gente que trabalha duro para levar o leite para casa e quer mantê-lo, declarou um grupo do Tea Party. Por outro lado, Ocupe Wall Street formula poucas propostas políticas e tem uma configuração móvel de apoiadores à medida que se espelha pelo país. O mais perto que seus ativistas chegaram de emitir uma clara declaração de objetivos foi na “Declaração da Ocupação da Cidade de Nova Iorque”, postado no dia 30 de setembro. “Como uma pessoa, unidos”, a declaração proclamou, “nós reconhecemos a realidade: que o futuro da raça humana requer a colaboração de seus membros; que o sistema precisa proteger os nossos direitos; e por causa da corrupção deste sistema, cabe aos indivíduos proteger seus próprios direitos, e os direitos de seus vizinhos”. Mas plataformas políticas não são o ponto deste novo tipo de movimento.

Charles Tilly, o falecido sociólogo de Columbia, dividiu os movimentos em três tipos, baseados nas políticas que eles demandam, nos círculos eleitorais que eles almejam representar e nas identidades que eles estão tentando construir. Ambos o movimento pelos direitos civis e o Tea Party têm em comum o primeiro e o segundo elementos. Ocupe Wall Street é o que nós podemos chamar de um movimento “nós estamos aqui”. Perguntar para seus ativistas o que eles querem, como alguns especialistas reivindicam, está fora de questão. Os participantes não são nem apoiadores desiludidos de Obama, nem um tropel, como descreveu-os unicamente Eric Canton, o líder da maioria na Câmara. Através da sua atitude, eles estão dizendo apenas “nos reconheçam!”

Se Ocupe Wall Street se parece com algum movimento na história americana recente, seria, na verdade, o novo movimento feminista dos anos 1970. Quando aquela luta emergiu no despertar do movimento pelos direitos civis, ele chocou os conservadores e confundiu os liberais. Os primeiros viram as ativistas como um bando de anarquistas queimadoras de sutiãs, os segundos as consideravam anti-femininas ou, melhor dizendo, liberais que extrapolaram os limites. Embora as líderes do novo movimento feminista tivessem políticas que queriam na agenda, sua principal revindicação era o reconhecimento da realidade do gênero na vida cotidiana, e créditos por ela. De forma semelhante, quando os ativistas do Ocupe Wall Street atacam Wall Street, não é tanto o capitalismo em si, mas um sistema de relações econômicas que perdeu seu sentido e falhou em servir ao público.

Periodicamente, milhares de americanos que não são de nenhuma classe social ou região particular, e que não tem nenhum objetivo explícito, se juntam no que Jason Frank, cientista político de Cornell, chama de “movimento constituinte”. O mais recente foi durante a Grande Depressão, quando miséria e indignação se uniram em uma onda de confrontos e manifestações, alguns deles muito mais parecidos com um tropel específica do que Ocupe Wall Street. Eles não tinham nenhuma carta específica de reivindicações, mas eles queriam reconhecimento e uma mudança radical nas relações entre o governo, o povo e as corporações.

Os paralelos entre os anos 1930 e hoje são surpreendentes. A economia atingiu níveis históricos de desemprego e miséria. A crise econômica é, de novo, global, forças do obscurantismo e da reação estão em movimento (pense na legislação anti-imigrantes que passou recentemente no Arizona e no Alabama), e formadores de opinião estão exigindo severas reduções de gastos. A Suprema Corte, que nos 30 não estava ciente de que as doutrinas judiciais do século XIX eram definitivamente inadequadas para os problemas econômicos do começo do século XX, hoje volta para uma doutrina de originalidade, que busca ir ainda mais no passado – agora para o século XVIII.

Mas a energia que se acumula por trás do Ocupe Wall Street pode muito bem não resultar em outro New Deal. Talvez nenhum “movimento constituinte” resulte dele – durante a Depressão, o desemprego atingiu 25%, hoje ele é de 9,1%. Nessa época, os EUA tinham um presidente, Franklin Roosevelt, que disse sobre os plutocratas que se opuseram às suas políticas e o odiavam politicamente: “Congratulo-me com seu ódio!”. Como os manifestantes do Ocupe Wall Street hoje, ele falou de “governo por dinheiro organizado” e das “forças do egoísmo desejo por poder”. A resposta foi elétrica, e Roosevelt foi reeleito por uma maioria mais significante do que nas eleições anteriores. A diferença desta vez é que a Casa Branca e o Partido Democrata não oferecem nenhuma liderança para a raiva incipiente que Ocupe Wall Street reflete. Na sua coletiva de imprensa na semana passada, depois de deixar claro que ele entende a raiva dos manifestantes, o presidente Barack Obama foi rápido ao assegurar ao setor financeiro o seu suporte contínuo.

 

 

 

Fonte: Democracia Justa

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