Um grupo se reúne em torno de um casal que faz sexo à vista de todos. As pessoas observam e de vez em quando fazem comentários.
Um homem veste um uniforme nazista.
Isso não está acontecendo no mundo real – ocorre em uma plataforma de games onde crianças são maioria.
O Roblox é um extenso mundo virtual para os gamers descrito muitas vezes como uma espécie de metaverso primitivo.
É um dos jogos infantis mais populares do mundo. Os números exatos são um pouco nebulosos, mas em 2020 a empresa Roblox disse ao site Bloomberg que dois terços de todas as crianças americanas com idades entre nove e 12 anos usam o jogo.
Em agosto de 2021, um relatório interno apontava que 48 milhões de jogadores acessavam Roblox diariamente.
Levantamento publicado em 2021 pela Pesquisa Game Brasil diz que 43,7% dos gamers brasileiros conhecem Roblox. Já o site PlayerCounter coloca o Brasil como o segundo em número de usuários na plataforma, atrás apenas dos Estados Unidos.
O Roblox permite que os usuários criem e joguem juntos. É uma forma de se conectar, em tempo real, com outras pessoas em um mundo digital.
A plataforma oferece as ferramentas para que os usuários desenvolvam seus jogos, o que é uma diferença marcante em relação a títulos tradicionais do mundo dos games. É um modelo de negócios extremamente bem-sucedido, mas também traz problemas.
Os jogos sexuais do Roblox são comumente referidos na plataforma como “condos” [condomínios, em inglês]. São espaços, gerados por usuários, onde as pessoas podem falar sobre sexo – e onde seus avatares podem fazer sexo virtual. Nesses jogos, as regras de Roblox são jogadas pela janela.
A empresa admite o problema: “Sabemos que há um subconjunto extremamente pequeno de usuários que deliberadamente tentam quebrar as regras”, disse um porta-voz à BBC.
Os jogos nos “condos” geralmente ficam ao vivo por um curto período de tempo – geralmente menos de uma hora – antes de serem descobertos e retirados. A companhia diz que está constantemente tentando tirar esses jogos do ar – usando sistemas manuais e automatizados.
“Realizamos uma revisão de segurança de cada imagem, vídeo e arquivo de áudio carregados no Roblox, usando uma combinação de detecção humana e por máquina”, afirmou.
Mas alguns conteúdos explícitos escapam pela rede. É um jogo de “gato e rato”, disse Larry Magid, presidente da ConnectSafely, uma organização sem fins lucrativos que visa a conscientização sobre a segurança online das crianças.
“Há pessoas que estão fazendo de tudo para enganar o sistema”, disse.
Os “condos” não são jogos encontrados facilmente. É preciso uma procura ativa. Mas sua própria existência incomoda pessoas como Magid: “O Roblox é uma plataforma muito popular entre as crianças e permite crianças menores de 13 anos. Por isso há uma responsabilidade especial na proteção de seus usuários”.
Particularmente preocupante é a potencial convivência de crianças e adultos nesses espaços. Uma parte do jogo tem uma ferramenta de trocas de mensagens onde os usuários podem conversar entre si – e com todos os outros jogadores participantes.
Muito do que é dito nos bate-papos dos “condos” não poderia aparecer em um site de notícias para adultos, muito menos em uma plataforma voltada para crianças.
A empresa Roblox disse à BBC que foram desenvolvidas ferramentas para controle dos pais com o objetivo de “restringir com quem as crianças interagem e quais experiências elas podem acessar”.
Mas isso pressupõe que os pais tenham um conhecimento razoável de tecnologia para definir essas configurações.
O porta-voz enfatizou que os “condos” geralmente são difíceis de serem localizados. Mas a BBC também encontrou linguagem sexual em jogos regulares e aceitos dentro da plataforma.
De acordo com Liraz Margalit, uma psicóloga digital que estuda o comportamento online, as pessoas se comportam de forma diferente no metaverso – basicamente o espírito do comportamento online. “Você tem o anonimato e tem o efeito de desinibição. Esta plataforma oferece a você um parque de diversões para fazer o que quiser”, diz ela.
Na semana passada, a empresa-mãe do Facebook, a Meta, introduziu um novo recurso, chamado de “limites pessoais”, no jogo de realidade virtual “Horizon Venues”.
A plataforma permite que as pessoas se encontrem em diferentes espaços – onde seus avatares podem assistir juntos a jogos, shows ou fazer aulas de ginástica.
As mudanças foram adotadas depois que uma mulher relatou ter sofrido uma agressão sexual virtual na plataforma.
A Roblox disse à BBC: “Temos tolerância zero para conteúdo ou comportamento sexual de qualquer tipo, e tomamos medidas rápidas contra qualquer um que esteja agindo em violação aos nossos padrões da comunidade”.
E alguns dias depois que a BBC apresentou suas descobertas à empresa, a Roblox publicou um post no blog resumindo o que está fazendo para proteger os jovens.
Empresas como Microsoft, Meta e Roblox estão atualmente na corrida para construir metaversos. Mas já há sinais de que têm dificuldade de policiar esses mundos virtuais.