Rolezinhos migram do shopping para as praças em SP

 

Longe dos shoppings, as reuniões perderam o caráter fortemente consumista, afirma o coordenador da Juventude da prefeitura.

 

Assunto da moda no começo deste ano, quando levaram milhares de adolescentes a se concentrar nos estacionamentos e praças de alimentação dos shoppings centers da cidade – foram 6 mil só no Shopping Metrô Itaquera – os rolezinhos mudaram de endereço. Mesmo sem a mesma atenção nos noticiários, seguem mobilizando a juventude, principalmente das periferias de São Paulo, em busca de diversão, cultura, consumo e ostentação.

Desde que o movimento virou uma questão de segurança pública, e mobilizou autoridades e frequentadores de shoppings a clamarem a presença da polícia para banir os “delinquentes”, a Prefeitura de São Paulo, junto com o Ministério Público do estado, articulou em janeiro com os “rolezeiros” um plano para transferir os eventos para os parques da cidade.

A medida foi tomada em meio a uma sociedade dividida entre os que defendiam a permanência dos funkeiros nos shoppings e os que assumiam os eventos como ilegítimos e até perigosos.

As administrações dos estabelecimentos buscaram na Justiça a proibição da entrada desses jovens, o que ocorreu, por exemplo, em 9 de janeiro no shopping JK Iguatemi, que estampou na sua entrada uma mensagem ameaçando com multa de 10 mil reais -respaldada por uma liminar emitida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo – cada pessoa que fosse identificada como “rolezeiro”.

Na outra mão, estimulados pelas críticas e proibições ao público dos rolezinhos, movimentos sociais organizaram eventos similares nos quais expressaram, além das suas demandas específicas, a indignação com a forma com que os jovens estavam sendo tratados pelos lojistas e pela polícia.

Nos parques, os rolezinhos perderam público. Ao mesmo tempo, deram forma a uma nova forma de ocupação dos espaço públicos, segundo o coordenador da Juventude da prefeitura de São Paulo, Gabriel Medina. Longe dos shoppings, afirma o coordenador, os novos rolezinhos também se afastaram da imagem do consumo exacerbado. “Eu acho que o shopping é uma opção, deve continuar a ser usado para encontro, mas a prefeitura também deve oferecer seus espaços para que os jovens possam ter espaço de convivência e de cultura”, diz. “Se nós tivermos os espaços públicos, onde os jovens possam começar a se encontrar e não sejam estimulados ao consumo, eu vejo isso como positivo.”

Acompanhe abaixo a entrevista:

CartaCapital: Como a prefeitura articulou os acordos para que os rolezinhos mudassem dos shoppings para os parques?

Gabriel Medina: Fizemos um trabalho de levantamento pela internet. Acho que hoje é simples, até porque você consegue mapear pelas redes sociais quais participantes eram as lideranças, quais tinham mais seguidores e, assim, os convidamos para um diálogo e começamos a conversar sobre a possibilidade de construir esses rolezinhos em outros espaços. Eu acho que o shopping é uma opção, deve continuar a ser usado para encontro, mas a prefeitura também deve oferecer seus espaços para que os jovens possam ter espaço de convivência e de cultura.

CC: A prefeitura intermediou um conflito que se armava entre lojistas e “rolezeiros”?

GM: O Ministério Público foi o interlocutor, junto com a prefeitura, que tem a responsabilidade de discutir as questões da cidade. Os donos de shopping não têm contato com os jovens. Nós (prefeitura), que temos contato com o pessoal do funk, tivemos mais facilidade para fazer essas interlocuções.

CC: Quando foi feito o acordo?

GM: Tivemos várias reuniões, primeiro reuniões conjuntas com os jovens e depois com o Ministério Público e em janeiro conseguimos definir alguns locais para esses encontros e a estrutura mínima para que eles acontecessem. É importante dizer que a gente intermediou com uma parte dos jovens, o fenômeno é muito distribuído e descentralizado. Uma parte tenta dialogar, mas eu entendo que há um fenômeno que também não é tão fácil de ser organizado, porque são grupos sociais, mas não grupos institucionalizados.

CC: Na visão da prefeitura, por que o acordo foi necessário?

GM: A prefeitura acha positivo que os equipamentos municipais sejam utilizados pela juventude, que a juventude ocupe. A gente tem uma dimensão de que os shoppings não podem ser o único lugar de encontros dos jovens, porque tem a vocação do consumo. Se nós tivermos os espaços públicos, onde eles possam começar a se encontrar e não sejam estimulados ao consumo, eu vejo isso como positivo. E acho também que é uma forma de a gente combater a cultura do medo e a ideia de que as ruas não devem ser ocupadas, de que é perigoso ficar na rua. O que eu acho é o contrário: nós temos que ocupar a cidade porque, quanto mais ocupada ela estiver, mais segura ela vai ser. Na verdade, a prefeitura teve de se colocar à disposição pra receber esses jovens, acho que é um dever nosso abrir os equipamentos, os parques pra juventude se encontrar.

CC: Aumentou o número de jovens nesses novos rolezinhos?

GM: Os rolezinhos que estão acontecendo nos parques são menores do que aquele primeiro boom do shopping Tatuapé. Tem uma tendência a ter diminuição porque o fenômeno que aconteceu no shopping Tatuapé aconteceu no período de férias escolares, então os jovens estavam com mais tempo na internet. Além disso, as portas de escola não são mais o ponto de encontro e existe a demanda por atividades. Essa combinação fez com que tivéssemos um número maior de jovens no começo. Vão continuar os encontros, inclusive nos shoppings, não com aquela quantidade, mas com um número menor do que visto antes. Continuam também os pancadões nas ruas, que reúnem milhares de jovens e tem uma presença forte da juventude.

CC: Nos dias 8 e 9 de março, dois rolezinhos na cidade tiveram tumulto e confusão, um deles realizado no Parque do Ibirapuera e outro no Parque Villa-Lobos. Alguns reclamaram do baixo efetivo de policiais civis. A prefeitura vai fazer algo em relação a isso?

GM: O Parque Villa-Lobos é de administração estadual e, mesmo antes da entrada dos jovens, já houve uma reação para proibi-los de entrar. Isso resultou em uma reação violenta dos dois lados. Os jovens foram impedidos de entrar em um espaço público. No Ibirapuera, eles foram autorizados a entrar e houve uma briga entre eles. Não concordo com a afirmação “Houve uma briga porque tinha pouca polícia”, na verdade, podemos aumentar a presença de policiais civis, mas o ideal é não precisar deles. Cada rolezinho que tiver vamos colocar um monte de policial em volta? Eu não defendo essas intervenções violentas. O que eu tenho que buscar com os jovens é construir uma cultura de paz, de defesa, de convivência harmoniosa entre os bairros e os bondes de funk. Agora, claro, em situações de violência tem que ter alguém ali para prestar um apoio e ajudar na mediação.

 

 

 

 

Fonte: Carta Capital

 

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